As sessões legislativas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal serão retomadas a partir desta semana, na volta do recesso parlamentar – período em que as atividades regimentais dos parlamentares ficam suspensas. No retorno das atividades, projetos que interferem na atuação dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) devem entrar na pauta em mais uma etapa do embate do Congresso com a Corte.
Pouco antes do recesso, em novembro de 2023, o Senado aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 8/2021, que restringe as decisões monocráticas dos magistrados. A PEC foi encaminhada à Câmara e aguarda apreciação dos deputados. Além dela, em 2024, mais normas que reformulam o escopo de trabalho do STF podem ganhar tração no Poder Legislativo.
Entre os projetos previstos para a pauta das Casas neste ano, há uma proposta que, aprovada, exigiria um aval do Legislativo para medidas judiciais do Supremo contra parlamentares em exercício, como ordens de busca e apreensão. A discussão vem na esteira de operações da Polícia Federal (PF) em endereços ligados aos deputados federais Carlos Jordy e Alexandre Ramagem, ambos do PL do Rio de Janeiro. Os mandados de busca e apreensão contra Jordy e Ramagem foram autorizados pelo STF.
Além dos limites para decisões monocráticas e do aval para investigações, uma longeva discussão entre parlamentares pode ganhar espaço nas Casas do Legislativo em 2024: a delimitação de mandatos para ministros do STF. Pela legislação atual, não há um período fixo para que os ministros permaneçam na Corte, apenas uma idade limite para a aposentadoria compulsória, 75 anos. Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado, é entusiasta da ideia; Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, porém, não adere à proposta.
Limite para decisões monocráticas
Prestes a entrar em recesso, o Senado aprovou em novembro uma PEC que limita o poder de decisões monocráticas de ministros do STF. A proposta obteve apenas três votos a mais do que o mínimo exigido para emendas à Constituição Federal e estará na pauta da Câmara neste ano. O texto estabelece que os magistrados ficam impedidos de suspender, por decisão individual, as chamadas liminares, leis aprovadas pelo Legislativo. Aprovada no Senado, o texto deve passar por todo o trâmite da Câmara antes de ir ao plenário.
O próprio Supremo vinha se movimentando para limitar o poder de decisões monocráticas. Em dezembro de 2022, o STF reformou seu regimento para que todas as liminares fossem confirmadas pelo plenário, obtendo maioria entre todos os membros da Corte.
Aval para investigações
Diante de operações da Polícia Federal contra deputados ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), como Carlos Jordy e Alexandre Ramagem, a oposição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está coletando assinaturas para uma PEC que dificulta a execução de investigações contra parlamentares em exercício.
De autoria do deputado Rodrigo Valadares (União-SE), o texto determina que “quaisquer ações judiciais” contra membros do Congresso, como investigações da PF ou mandados de busca e apreensão, somente poderão ser cumpridos após aval da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal. A proposta diz ainda que só poderão ser deflagradas operações sem a permissão da respectiva Mesa Diretora em crimes de “flagrante delito”.
Ao Estadão, o autor da proposta afirmou que o texto busca “proteger” o mandato dos parlamentares contra “repetidos abusos cometidos pelo Poder Judiciário”. “Temos que frear esse desrespeito com o Parlamento Brasileiro, que, por vezes, evidencia perseguição a alguns parlamentares e seus espectros políticos”, disse.
A medida retomaria um status quo que vigorava até o início do século 21. Apesar de possuir prerrogativa criminal em seu regimento, o STF não a exercia até 2001. Até então, o Supremo era impedido de processar e julgar deputados e senadores se as Casas não concedessem uma autorização. Naquele ano, foi aprovada a Emenda à Constituição 35, por meio da qual se facultou ao STF o julgamento de parlamentares sem autorização prévia. Em contrapartida, as Casas legislativas poderiam, posteriormente, suspender o processo.
Mandato para ministros
Em dezembro de 2023, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, afirmou que pretende pautar uma PEC que cria mandato fixo para os ministros do STF ainda no início de 2024. Segundo Pacheco, o tema é “apropriado” para entrar em discussão. Pela norma atual, o ministro do STF permanece no cargo até 75 anos, quando a aposentadoria é compulsória.
No Congresso Nacional, há mais de uma iniciativa para a criação de mandatos fixos no Supremo. Até Flávio Dino, nomeado para assumir uma cadeira no STF, já foi entusiasta da ideia: em 2009, quando era deputado federal, Dino propôs uma PEC que delimitava o mandato dos ministros do Supremo em 11 anos.
Além disso, a proposta de Dino previa uma “quarentena” de cargos públicos após a aposentadoria dos ministros. Se a medida tivesse sido aprovada, os magistrados que se aposentassem do cargo deveriam permanecer três anos sem serem nomeados para “cargos em comissão ou de mandatos eletivos em quaisquer dos Poderes e entes da federação”. É exatamente o que ocorre com Ricardo Lewandowski, que se aposentou da Corte em abril de 2023 e, nesta quinta-feira, 1º, tomou posse no Ministério da Justiça.
Entusiasta dos mandatos fixos para o STF, Rodrigo Pacheco deverá decidir, num primeiro momento, qual será a proposta escolhida para pautar o tema. É possível que as sugestões que versem sobre o assunto sejam apensadas em um só texto, para que a apreciação seja mais célere.
Porém, Arthur Lira, presidente da Câmara, não adere à proposta. Segundo o deputado, a fixação de um mandato poderia comprometer a isenção do Supremo. “Imagine uma pessoa que vá ao STF com 44, 45 anos, e sabe que vai sair com 55. O que é que vai se esperar de isenção de julgamento de alguém que sabe que em dez anos vai sair com 55 anos, em plena atividade?”, afirmou Lira em entrevista à GloboNews, em dezembro de 2023.
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