Consulta pública do projeto do Mourão para anistia vira embate nas redes, mas briga não adianta nada

PL 5064, de autoria do senador Hamilton Mourão, quer anistiar condenados pelo 8 de janeiro; domínio de consulta pública no site do Senado divide apoiadores de Lula e de Bolsonaro

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Foto do author Isabella Alonso Panho
Atualização:

Apoiadores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) brigam nas redes sociais pelo domínio da consulta pública de um projeto de lei, apresentado pelo senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), que anistia condenados de depredar as sedes dos Três Poderes em Brasília no dia 8 de janeiro deste ano. A consulta pública no site do Senado, no entanto, é simbólica e não interfere na tramitação do projeto de lei.

Na prática, a consulta pública não tem o poder de aprovar ou arquivar um projeto, e tampouco exerce qualquer influência sobre os votos dos parlamentares. A consulta pública é uma ferramenta do Senado disponível para todos os projetos apresentados por parlamentares – projeto de lei, proposta de emenda à Constituição, projeto de lei complementar, ordinária, etc. Ela fica aberta enquanto o projeto estiver tramitando na Casa. Por isso, não tem prazo para acabar.

Senador general Hamilton Mourão (Republicanos-RS) é autor da proposta que motiva o embate nas redes sociais Foto: VALÉRIA GONCALVEZ/ESTADÃO

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Para votar, basta fazer cadastro no site do Senado. Cada pessoa cadastrada só pode votar uma vez e o voto não pode ser alterado. A consulta permite que os parlamentares “meçam a febre” e vejam como uma proposição está sendo aceita pelas pessoas. Mas isso nem sempre faz diferença na tomada de decisão deles.

No entanto, para uma proposta ser aprovada, ela precisa dos votos dos deputados e dos senadores no trâmite legislativo. Por isso, mesmo que uma normativa tenha apoio massivo dos votantes da consulta pública, ela pode parar no arquivo do Congresso na hora em que for votada nas Casas. Não existe possibilidade legal de um projeto ser aprovado apenas pelo apoio dos cidadãos.

Apesar de ser um bom termômetro do que a sociedade está pensando, as consultas públicas não são um retrato fiel da realidade, segundo o cientista político, professor e pesquisador da FGV Marco Antonio Carvalho Teixeira.

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Extremistas depredaram Palácio do Planalto no dia 8 de janeiro  Foto: ESTADAO

“Elas referem-se apenas àquelas pessoas que se motivaram em acessar a ferramenta e colocar sua opinião. Boa parte das consultas públicas acaba se transformando em um instrumento de mobilização dos dois lados. Vira um argumento para defensores e detratores acerca do projeto em questão”, disse.

Rodrigo Prando, cientista político e pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie, avalia que essa disputa pela consulta do Senado pode “resvalar em algum tipo de populismo”, por reiterar um discurso de que o povo protagoniza o processo legislativo – o que não é verdade.

O movimento nas redes sociais ficou mais intenso entre terça, 24, e quarta-feira, 25. No começo da articulação, o “não” para o PL 5064/2023 estava na frente. No final desta manhã, os favoráveis à proposta estavam ganhando com uma diferença de mais de 40 mil votos. Ao todo, mais de meio milhão de pessoas opinou por meio da consulta pública.

Consulta pública PL Mourão Anistia Foto: Reprodução/Senado Federal

Veja quem são os parlamentares que puxam o ‘sim’ e o ‘não’ à proposta

O perfil oficial do Partido dos Trabalhadores (PT) no X (antigo Twitter) pediu aos filiados da sigla para que votassem “não” na consulta pública. A publicação chama os extremistas do 8 de janeiro de “vândalos golpistas de 08/01″.

O deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), relator do PL das Fake News, chamou de “cretina” a proposta de Mourão e acusou o ex-vice-presidente de ter “bandido de estimação”. “Em qualquer país decente, quem tenta dar um golpe de Estado, paga pelo crime”, disse o deputado.

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Ele foi às redes pedir votos aos seus seguidores na manhã de terça-feira, 24, quando o “não” estava vencendo a consulta.

O deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) chamou o projeto de lei de “vergonhoso”. “Incentivar o crime é próprio dessa extrema direita fascista. Votem não na consulta do Senado.” Além dele, pastor Henrique Vieira (SP) e Erika Hilton (SP), parlamentares da mesma sigla, pediram o “não” dos seus seguidores na consulta pública.

Já do lado dos favoráveis à anistia dos manifestantes do 8 de janeiro estão os deputados federais Carla Zambelli (PL-SP) e Gustavo Gayer (PL-GO). O goiano gravou um vídeo dizendo que o Brasil está “de coração partido” por causa da “condenação de pessoas humildes e simples que estavam no 8 de janeiro, mas não quebraram nada”.

A publicação de Zambelli com o vídeo de Gayer foi compartilhada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente.

Nikolas Ferreira (MG), também deputado federal do PL, pediu o “sim” dos seus seguidores “para que a justiça seja feita e essas pessoas não paguem por uma perseguição desproporcional da esquerda”.

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Consultas sobre voto impresso, auxílio moradia e número de deputados têm milhões de votos

Hoje, as consultas públicas que mais têm votos computados são sobre o estabelecimento do voto impresso no País, o fim do auxílio-moradia para juízes, deputados e senadores e a redução do número de cadeiras do Legislativo federal. O projeto de lei de Mourão está no 11° lugar da lista.

A consulta que mais tem votos registrados é uma sugestão protocolada no portal e-Cidadania em 2018, direcionada à Mesa do Senado, pedindo que os parlamentares apresentem um projeto de lei estabelecendo o voto impresso no Brasil. A consulta ultrapassou 3,4 milhões de votos – 1,7 milhões a favor da proposta.

Consulta pública que mais tem votos registrados no site do Senado trata do voto impresso. Apesar de ter muitos apoiadores na votação, a medida já foi considerada inconstitucional pelo Supremo, em 2020 Foto: Dida Samapaio/ESTADÃO

Se um dia o Congresso aprovar uma lei estabelecendo o voto impresso, ela já nasce inconstitucional. Isso porque, em 2020, o Supremo já decidiu sobre o tema e entendeu que a medida violaria o sigilo e a liberdade de voto. O sistema de voto eletrônico no País é auditável.

O segundo lugar das consultas públicas com mais voto trata do fim do auxílio-moradia e também foi apresentada por meio de uma sugestão do e-Cidadania, em 2017. A maioria dos 1,9 milhões de votos é pelo fim do benefício. Pouco mais de 10 mil pessoas votaram para mantê-lo.

Uma proposta de emenda à Constituição de 2015 do ex-senador Jorge Viana (PT-AC), hoje presidente da Apex-Brasil, é o terceiro lugar. Ele propõe a redução do número de deputados e senadores. Apesar de ter a maioria dos mais de 1,8 milhão de votos na consulta pública, para sair do papel a medida teria que ser votada pelos parlamentares, que teriam que concordar em reduzir os próprios cargos.

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