A natureza da relação entre Lula e os militares é de desconfiança mútua e a barbárie bolsonarista em Brasília serviu para aprofundá-la. É essa desconfiança que fez Lula eliminar de saída a opção de uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) quando informado da gravidade dos fatos.
Lula não queria correr o risco de ver os comandantes militares se recusando a cumprir ordens. Eles têm reiterado ser impensável uma conduta desse tipo, mas houve um momento no domingo que teria sugerido exatamente isso.
Foi quando o governo federal quis desmontar já na noite do domingo o acampamento no QG do Exército, e no qual haviam se refugiado participantes dos ataques aos três Poderes. Ali os ministros da Defesa e da Justiça depararam-se com delicada situação: a presença no acampamento de familiares de oficiais, entre eles a esposa do general Villas Boas, ex-comandante do Exército e uma das figuras mais veneradas por colegas de farda na ativa e na reserva.
Pairava no ar entendimento não explicitado formalmente de que, se uma ordem de desocupação imediata fosse dada, não seria cumprida. Optou-se por uma solução de compromisso. O desmonte do acampamento ocorreu no dia seguinte, já sem os parentes de oficiais.
Contornou-se um agravamento da crise, mas ficou um gosto ruim. Lula tinha engolido a contragosto a conduta do ministro da Defesa, para o qual a “pacificação” implicava evitar um episódio de confronto aberto com os militares.
José Múcio foi escolhido exatamente por isso para o cargo e, nesse sentido, vem cumprindo a missão. Ganhou como recompensa escancarada campanha dentro e fora do PT para demiti-lo. Que produziu até aqui resultado irônico: quanto mais apanha do PT, mais os comandantes o aprovam – os militares gostaram de Múcio pelas razões que o PT não gosta.
Convencido da “contaminação” bolsonarista entre militares, Lula praticamente eliminou na primeira semana de governo o GSI sem colocar nada no lugar. Os fatos do domingo demonstraram, porém, ter sido erro primário a inexistência de aparato próprio de inteligência.
A politização de contingentes militares, e de hierarquias, é um dos piores legados de Bolsonaro. Não é pequeno o número de oficiais-generais convencidos de que Lula só disputou a eleição por manobra do STF. E só venceu pela atuação do TSE.
Importantes generais da ativa e da reserva não veem danos de imagem à instituição trazidos pela politização bolsonarista. Portanto, não julgam necessário nem adequado qualquer “mea-culpa”. Vão bater continência a instituições, mas sem a intenção de “sentar para conversar”.
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