A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro tem 180 dias, a partir desta quinta-feira, 25, para apurar os ataques às sedes dos três Poderes em Brasília e a tentativa de golpe do início deste ano. A instalação do colegiado foi marcada por tensão e bate-boca. Confira os principais fatos da largada da CPMI:
1. Eleição na balança: a Câmara na presidência
Na balança do Congresso, a força da Câmara pesou mais que a do Senado. O presidente Arthur Lira (PP-AL) emplacou seu candidato para comandar a CPMI, o também deputado Arthur Maia (União Brasil-BA). Não era o preferido da base governista, mas é considerado capaz de conduzir os trabalhos sem provocar maiores desgastes para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Em seu primeiro discurso, cobrou “mediação e respeito”, condenou eventuais tentativas de obstruir as apurações e prometeu empenho para esclarecer os “reais motivos” dos atos, destacando que há “narrativas” tanto de que foi orquestrado um golpe para interromper a democracia quanto de que houve omissão, em um esforço de demonstrar “neutralidade” entre os polos do governo petista e da oposição bolsonarista.
2. Pesos e contrapesos: Senado, governistas e opositores na relatoria e vices
No reequilíbrio da distribuição de forças da comissão composta por 16 deputados e 16 senadores, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA), aliada de Lula e próxima do ministro da Justiça, Flávio Dino, ficou com a estratégica função da relatoria. Caberá a ela, por exemplo, conduzir depoimentos, solicitar documentos e elaborar o relatório final da investigação.
O Senado também ficou com as duas vice-presidências, compartilhadas por aliado de Lula e outro do ex-presidente Jair Bolsonaro, respectivamente Cid Gomes (PDT-CE) e Magno Malta (PL-ES).
3. Gênero e diversidade
Eliziane se cacifou para o posto de relatora em razão da atuação na CPI da Covid, além de ser aliada de Dino e Lula. Embora não fosse integrante de fato do colegiado que apurou a condução da pandemia na gestão Bolsonaro – não havia nenhuma mulher no colegiado –, ao lado de Simone Tebet (MDB-MS), Leila Barros (então no Cidadania-DF) e Soraya Thronicke (União Brasil-MS), ela ajudou a impor a participação feminina nas investigações.
O atual colegiado tem composição mais diversa. Entre os 16 representantes titulares de cada Casa, do Senado quatro são mulheres, assim como da Câmara. Duas são deputadas transgênero: Erika Hilton (PSOL-SP) e Duda Salabert (PDT-MG). A ex-ministra da Família, da Mulher e dos Direitos Humanos de Bolsonaro Damares Alves (Republicanos-DF) também compõe o time.
Apesar do avanço, a própria sessão da CPI, no primeiro pronunciamento da relatora, já demonstrou como é difícil quebrar a prevalência masculina no ambiente político. Colegas tiveram de cobrar silêncio para que Eliziane pudesse falar.
4. Quem é quem nas tropas de choque de Lula e Bolsonaro
Um bate-boca entre governistas e oposicionistas marcou o início dos trabalhos, com o senador Marcos do Val (Podemos-ES) tentando vetar Eliziane como relatora por causa de sua proximidade com Dino. Ambos os lados se exaltaram, sinalizando sessões carregadas de tensão. Como mostrou o Estadão, ao menos 15 integrantes da CPMI, entre titulares e suplentes, espalharam fake news sobre “infiltrados” nos ataques do 8 de janeiro.
Entre os apoiadores mais aguerridos de Bolsonaro, além de Do Val, estão o autor do requerimento de criação da CPMI, deputado André Fernandes (PL-CE), apontado pela PF como incentivador e apoiador da ação dos radicais, e o segundo-vice-presidente, Magno Malta, que causou polêmica ao opinar sobre os episódios de racismo envolvendo o jogador Vini Jr.
Eduardo Girão (Novo-CE) – veterano da CPI da Covid – e Damares, além dos deputados Delegado Ramagem (PL-RJ), que comandou a Abin no governo passado, e Filipe Barros (PL-PR), integram a tropa. O time de suplentes também têm nomes de peso, a começar pelos filhos do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), além do ex-juiz da Lava Jato e senador Sérgio Moro e do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG).
Na base aliada a Lula, também se destacam ex-integrantes da CPI da Covid como os senadores Otto Alencar (PSD-BA), Omar Aziz (PSD-AM) e Fabiano Contarato (PT-ES), além da própria relatora e de Rogério Carvalho (PT-SE). Na suplência, há ainda o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (ex-Rede-AP). Entre os deputados, despontam Rogério Correia (PT-MG), que, como mostrou o Estadão, já pediu a quebra de sigilos de Bolsonaro, Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Erika Hilton (PSOL-SP), que, na reunião de abertura, já pediu a expulsão do colega Abílio Marques (PL-MT) da sessão por tentar atrapalhar as discussões. Veja todos os integrantes aqui.
5. ‘Siga o dinheiro’
Em entrevista após a reunião da CPMI, Eliziane afirmou que pretende priorizar as investigações com foco nos mentores e financiadores dos atos golpistas. “Eu, como relatora, vou buscar a informação no sentido de saber quem estava por trás do financiamento e da autoria intelectual”, disse.
Uma nova reunião está marcada para a próxima quinta-feira, 1.º, quando Eliziane deve apresentar seu plano de trabalho. A princípio, o colegiado se reunirá sempre às quintas, mas essa agenda pode mudar. Veja na Coluna do Estadão quem os governistas querem convocar primeiro para depor.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.