BRASÍLIA – A reunião da Executiva Nacional do PT, nesta segunda-feira, 28, foi marcada por críticas ao governo Lula, lavação de roupa suja em público e duras cobranças a respeito da necessidade de um “reposicionamento” do partido após derrotas sofridas nas eleições municipais.
A portas fechadas, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, avisou os dirigentes que estava respondendo nas redes sociais, em tom duro, ao ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, para quem o partido não conseguiu sair da zona de rebaixamento nas disputas pelas prefeituras.
“A fala dele foi desrespeitosa. Inclusive eu convidei Padilha para vir aqui, mas ele disse que não podia”, afirmou a deputada na reunião. Gleisi recebeu a solidariedade dos colegas e foi aplaudida.
Antes, o secretário de Comunicação do PT, Jilmar Tatto, havia definido como “completamente errada” a estratégia da campanha para a Prefeitura de São Paulo, onde o partido apoiou a candidatura de Guilherme Boulos (PSOL), e partiu para o ataque ao dizer que ministros do governo Lula jogaram “na várzea”.
“Parece que tem ministro jogando futebol de várzea, sem articulação nenhuma. É um barata-voa”, provocou Tatto. A frase também foi uma resposta ao comentário feito horas antes por Padilha, que recorreu a uma analogia com o futebol para se referir à situação do PT. Ao deixar um encontro com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na tarde desta segunda-feira, no Palácio da Alvorada, o ministro afirmou que “o PT foi o campeão nacional das eleições municipais, mas não saiu ainda do Z4 (zona de rebaixamento) que entrou em 2016, nas eleições municipais”.
A declaração de Padilha foi lida na reunião da Executiva Nacional e recebeu uma saraivada de críticas. Não foram poucos os que disseram ali ser preciso uma “blindagem” do partido em relação ao governo Lula. Na prática, isso significa que o PT quer dar as cartas na montagem do palanque de Lula para as eleições presidenciais de 2026, e não aceitar todas as exigências do Centrão.
“Fazemos parte de um governo de coalizão e o PT paga o preço por isso”, argumentou Gleisi, que também esteve com Lula nesta segunda-feira. Horas depois, no entanto, ela decidiu responder nas redes sociais ao ministro responsável pela interlocução do governo com o Congresso.
“Temos de refrescar a memória do ministro Padilha, (falar) o que aconteceu conosco desde 2016 e a base de centro e direita do Congresso que se reproduz nas eleições municipais, que ele bem conhece”, escreveu Gleisi. “Estamos numa ofensiva da extrema direita. Ofender o partido, fazendo graça, e diminuir nosso esforço nacional não contribui para alterar essa correlação de forças.”
Embora pertençam à mesma corrente de Lula, intitulada Construindo um Novo Brasil (CNB), Gleisi e Padilha disputam há tempos os rumos do PT. “Padilha devia focar nas articulações políticas do governo, de sua responsabilidade, que ajudaram a chegar a esses resultados. Mais respeito com o partido que lutou por Lula Livre e Lula Presidente, quando poucos acreditavam”, completou a deputada.
Mesmo dizendo que vê “pouca participação dos ministros na disputa política em defesa do governo”, a presidente do PT discordou do diagnóstico de Jilmar e do prefeito eleito de Maricá (RJ), Washington Quaquá, sobre os motivos das derrotas eleitorais.
Os dois assinalaram que o partido errou ao apoiar Boulos em São Paulo. Um dos vice-presidentes do PT, Quaquá repetiu na reunião da Executiva as críticas feitas nas redes sociais. Tanto ele como Jilmar avaliaram que a candidatura de Boulos era uma “morte anunciada” porque não ampliava a aliança para o centro.
“Eu me pergunto: ‘Quem do PT iria disputar? Que outra candidatura seria construída no campo do centro ou da centro-direita em São Paulo?’”, questionou Gleisi. “Boulos foi o melhor candidato que tivemos. Ele nunca deixou de fazer o combate e nos piores momentos esteve conosco.”
Houve, durante o encontro, muitas reclamações de dirigentes do PT sobre a falta de apoio de Lula a candidaturas do partido. “O governo não ajudou. Tem muita várzea no governo e isso é perigoso, pensando em 2026. Os partidos do Centrão tiveram emendas e souberam canalizar tudo para os candidatos deles. Nós, não”, insistiu Jilmar.
Na avaliação do secretário de Comunicação do PT, o Palácio do Planalto e o partido não perceberam que o eleitor está caminhando para a centro-direita.
“Lula ganhou a eleição numa frente ampla, em 2022. Quando decidiu que a candidatura na principal cidade do País ficaria com o PSOL, ninguém entendeu. O movimento sinalizou que a nossa aliança é para a esquerda, quando deveria ser para o centro”, observou Jilmar. “Depois a gente perde a eleição e ninguém sabe o porquê.”
Em 2020, porém, o próprio Jilmar foi candidato à Prefeitura de São Paulo e ficou em sexto lugar, apoiando Boulos no segundo turno.
O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) deixou a reunião pouco antes do seu término. Disse que não seria Polyana e nem faria o ‘‘jogo do contente” sobre o resultado do PT nas eleições municipais. O partido elegeu 252 prefeitos. Na lista está Evandro Leitão, que venceu em Fortaleza após um acirrado confronto com o bolsonarista André Fernandes (PL). Foi a única capital conquistada pelo PT.
“Ainda que de forma capenga, o PT conseguiu disputar em muitas cidades. Mas a liga da direita é a questão ideológica, onde estamos falhando. Temos de fazer, urgentemente, um reposicionamento”, insistiu Chinaglia.
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