Debate Estadão/Record: o que muda na disputa após o penúltimo embate entre Nunes e Boulos?

Pesquisa qualitativa do Instituto Travessia revela que, apesar do bom desempenho, candidato do PSOL não consegue tirar votos do prefeito Ricardo Nunes; ataques pessoais e falta de propostas concretas frustram eleitores

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Atualização:

O tom bélico adotado por Guilherme Boulos (PSOL) no debate promovido pelo Estadão e a TV Record neste sábado, 19, não se mostrou suficiente para indicar uma mudança de rumo na reta final da corrida pelo comando da maior cidade da América Latina. Na pesquisa qualitativa promovida pelo Instituto Travessia, o confronto entre o psolista e o prefeito Ricardo Nunes (MDB) terminou em empate: eles mantiveram seus eleitores e conquistaram dois indecisos cada ao final da dinâmica.

Nunes e Boulos se enfrentam no segundo turno em São Paulo Foto: Werther Santana/Estadão

A reportagem acompanhou ao longo da noite de sábado as discussões promovidas pelo Travessia em uma “sala de espelho”, espaço com espelho unidirecional que permitiu à equipe de reportagem observar, sem ser notada, as reações de um grupo de eleitores ao debate entre Boulos e Nunes.

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Formado por quatro eleitores que declararam voto em Nunes, quatro em Boulos e quatro indecisos, o grupo foi selecionado pelo cientista político e CEO do Instituto Travessia, Renato Dorgan. Durante o debate, os eleitores reagiram em tempo real com comentários e usando três cartões para avaliar o desempenho dos candidatos: verde para aprovação, amarelo para neutralidade e vermelho para reprovação.

Na votação final, o grupo escolheu Boulos como o candidato com a melhor performance, atribuindo ao psolista 7 cartões verdes, 3 amarelos e 2 vermelhos. O atual prefeito ficou com 7 cartões amarelos, 1 verde e 4 vermelhos.

Dorgan avalia que, mesmo com um bom desempenho no debate, “Boulos continua com sua dificuldade inicial de desconstruir votos do outro lado, sendo evidente que sem tirar votos de Nunes, dificilmente vencerá”. Para ele, o candidato do PSOL é limitado por um “teto de concreto que a esquerda construiu ao longo dos tempos”, que prejudica seu crescimento.

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“Nunes mostra que possivelmente vencerá uma eleição por não significar muito. Marçal e Boulos, ao esticarem a corda ideológica demais na cabeça do eleitor, propiciaram um espaço a Nunes de equilíbrio e baixo risco, o que fideliza seus eleitores. Porém, Nunes, além de não encantar seu eleitor, aumenta um conformismo de que a política não é mais um espaço de mudanças”, avalia.

Ataques pessoais geram descontentamento

Apesar da vantagem de Boulos, o grupo expressou grande descontentamento com o comportamento dos dois candidatos, apontando que ambos deixaram de responder a importantes questionamentos e preferiram focar em ataques pessoais, passando a discussão sobre propostas ao segundo plano.

“Nenhum dos dois estava preocupado em mostrar algo de melhor para a população. Queriam atacar um ao outro. Foi um desrespeito”, criticou uma eleitora de Nunes. Outra participante, que se declarou indecisa no início da dinâmica, concordou: “Não tem que ficar criticando o outro. É preciso conquistar os eleitores com propostas, e não ficar falando o que o outro fez em 1900 e tanto”. Uma apoiadora de Boulos acrescentou que os postulantes “fugiram” das perguntas.

Sobraram críticas para os dois lados

No final, sobraram mais críticas do que elogios aos dois candidatos. A retórica afiada de Boulos foi considerada artificial por alguns, com uma eleitora indecisa chegando a chamá-lo de “marqueteiro”. Nunes, por outro lado, foi tachado de “fantasioso” ao falar sobre a cidade e irritou até seus próprios eleitores pela falta de energia no debate e pela dificuldade em rebater os ataques de Boulos. Uma eleitora brincou que o prefeito parecia ter tomado “Diazepam”, em referência ao efeito calmante do medicamento.

A estratégia de Boulos de insistir para que o prefeito abra o seu sigilo bancário não se mostrou bem-sucedida. O tema acabou virando motivo de piada entre o grupo, que no final do debate demonstrou cansaço com a repetição do tema. “Que saco”, disse uma eleitora em uma das vezes em que Boulos reforçou o pedido. “Se você virar prefeito você não vai abrir o seu também”, completou ela.

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Da mesma forma, virou chacota o episódio em que Nunes foi levado à delegacia por portar uma arma e disparar em via pública. A história era desconhecida pela maioria dos eleitores, que reagiu de maneira descontraída e com risos quando o deputado do PSOL trouxe o incidente à tona. “Essa do tiro eu nunca tinha escutado”, disse uma indecisa, rindo da situação.

“A insistência da abertura de contas desagradou e virou piada, como a questão dos tiros e a multa que o pai do Boulos pagou. Tudo isso acrescenta pouco na definição do voto”, avalia Dorgan. “O eleitor esperava mais soluções e propostas e saiu frustrado”, acrescenta.

Ao final do embate, sobraram críticas para os dois lados. A retórica afiada de Boulos foi considerada artificial por alguns. Nunes, por sua vez, foi tachado de “fantasioso” ao falar sobre a cidade.  Foto: Alex Silva/Estadão

Algumas das críticas do psolista à gestão Nunes encontraram respaldo no grupo, mas não a ponto de tirar votos do emedebista. O tema da privatização foi um deles e mostrou-se sensível para o prefeito. Quando Boulos falou que a privatização dos cemitérios resultou em aumento de preços e piora dos serviços, indecisos e até uma eleitora de Nunes concordaram com o psolista.

A maioria do grupo chancelou as críticas do deputado federal ao serviço 156 e à poda de árvores na cidade, recentemente alvo de polêmica após uma tempestade atingir a capital e deixar milhões sem energia elétrica. O psolista recebeu sete cartões verdes ao abordar o tema. Uma eleitora indecisa comentou que é um “inferno” remover uma árvore caída.

Boulos conseguiu furar a bolha e conquistar a aprovação de eleitores de Nunes e indecisos ao falar sobre os Centros Educacionais Unificados (CEUs), uma marca da gestão de sua vice, Marta Suplicy (PT). Mais da metade do grupo levantou o cartão verde quando o psolista mencionou os equipamentos. A proposta de ampliar os CEUs e criar o CEU Profissões agradou tanto eleitores de Nunes quanto indecisos.

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Dois eleitores indecisos ergueram o cartão verde quando o jornalista da Record questionou Boulos sobre como pretende convencer os paulistanos de que está preparado para governar São Paulo, apesar de não ter experiência no Executivo. A reação indicou que a falta de experiência de Boulos é uma preocupação para parte do eleitorado.

A postura de Nunes durante o debate gerou desconforto entre alguns presentes. No primeiro bloco, uma apoiadora do prefeito afirmou que ele “não tem nenhuma preparação para debate”. No segundo bloco, uma indecisa observou: “Nunes não reage, está parado”.

Um dos pontos altos de Nunes no debate foi quando ele falou sobre segurança pública, defendendo a permanência de criminosos na prisão e ressaltando que Boulos votou a favor da “saidinha” no Congresso, o que gerou uma reação positiva de três eleitores indecisos. Ao citar os avanços na saúde e destacar a entrega de Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), todos os indecisos levantaram o cartão verde. Um deles relatou que precisou usar o serviço público de saúde recentemente e se surpreendeu com a boa assistência.

O prefeito recebeu boas avaliações dos eleitores quando citou obras entregues durante a gestão e programas como Domingão Tarifa Zero, que oferece passagem gratuita nos ônibus aos domingos. Seis eleitores, incluindo apoiadores de Nunes, Boulos e indecisos, levantaram o cartão verde quando o prefeito citou o programa.

No entanto, o grupo concordou com Boulos quando ele criticou a frota reduzida no domingo, usando a expressão “tarifa zero, ônibus zero.” Sete eleitores levantaram o cartão verde em apoio à crítica. “Fiquei superfeliz com a tarifa zero, mas o ônibus não vem”, comentou uma eleitora de Nunes.

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A declaração de Nunes sobre ter visto crianças brincando na praça da Sé às 22h foi considerada absurda, provocando risos e indignação em todo o grupo, inclusive entre seus próprios eleitores.

Algumas propostas apresentadas no debate foram recebidas com ceticismo, como a de Nunes de expandir a tarifa zero para mães inscritas no CadÚnico que utilizam transporte público para levar os filhos para a creche, ou a de Boulos sobre acabar com o envolvimento do Primeiro Comando da Capital (PCC) no transporte público da capital.

Indecisos se dividem

Depois do debate, os eleitores foram questionados sobre seus votos. Aqueles que haviam declarado voto em Nunes e Boulos se mantiveram fiéis aos seus candidatos. Já os indecisos, se dividiram: dois escolheram o deputado do PSOL e dois optaram pelo prefeito.

Uma eleitora indecisa que acabou declarando voto no prefeito disse que sua decisão levou em conta o fato de Boulos ser “muito marqueteiro”. “Nunes me convenceu mais no final. Boulos é muito diplomático, fala bem, fica tentando coagir os outros. O Nunes com tudo, com tudo, vi um pouco mais de verdade nele”, afirmou ela.

Outro participante indeciso, que votou no candidato Pablo Marçal (PRTB) no primeiro turno, escolheu Nunes, mas ponderou que ainda pode anular o voto dependendo do posicionamento do emedebista nos próximos dias.

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Uma professora que decidiu votar em Boulos justificou sua escolha dizendo que o psolista respondeu a mais perguntas do que Nunes. Em seguida, ela completou dizendo que votaria no Boulos porque os eleitores “entendem o que ele fala e tiram as próprias conclusões”.

Dorgan considera que “parece que o voto está cristalizado, tanto o de Nunes quanto o de Boulos. Existe um cansaço do eleitor com a disputa, que parece ter queimado todos os cartuchos no 1º turno acirrado. Os indecisos ao final se dividiram”.

Na visão dele, Boulos recebeu eleitores reconquistados com “propostas e uma forma mais incisiva de se falar”. Já Nunes obteve “uma transferência de Marçal que nos parece natural e uma indecisa que optou dentro de uma certa margem de segurança que Nunes aparenta proporcionar para o eleitor.”

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