BRASÍLIA – O deputado federal Adail Filho (Republicanos-AM) enviou, apenas em 2024, R$ 22,2 milhões em emendas parlamentares para a cidade de Coari (AM), terra em que ele mesmo já foi prefeito. O município elegeu o pai, Adail Pinheiro, em primeiro turno. O eleito chegou a ser condenado a 11 anos de prisão por submeter criança ou adolescente à prostituição ou à exploração sexual e favorecimento da prostituição.
Do valor repassado pelo deputado federal, R$ 18,4 milhões foram em emendas Pix, recurso que não tem transparência e dificulta a fiscalização. Adail Filho enviou as emendas Pix, sem rastreio, em junho. Ele já tinha enviado, anteriormente, R$ 3,7 milhões para o Fundo Municipal de Saúde de Coari. Desse valor empenhado, R$ 14,2 milhões já foram pagos pelo governo federal.
Procurado pelo Estadão, Adail Filho diz não acreditar que as emendas enviadas por ele influenciaram as eleições na cidade. “(O valor) ainda não foi creditado nas contas da prefeitura. E mesmo se tivesse sido, seria aplicado conforme os planos de trabalho”, afirma.
Ainda segundo o parlamentar, as emendas Pix serão enviadas para a conclusão de obras inacabadas e na infraestrutura do município, habitado por 70.616 pessoas, segundo dados do Censo de 2022, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Já o prefeito eleito Adail Pinheiro não respondeu.
A cidade é conhecida como a “terra do gás natural”. No município há uma plataforma da Petrobrás, em que são explorados gás natural e petróleo.
O deputado federal, participou intensamente da campanha do pai e esteve ao lado dele em várias publicações nas redes sociais. “Podem queimar carro e fazer chuva de dinheiro, mas no dia 6 de outubro, a peia vai ser nas urnas”, escreveu Adail Filho em uma das postagens, comentando sobre a disputa eleitoral em Coari.
A família Pinheiro impera no município amazonense. Adail Pinheiro já foi eleito para o mesmo cargo em 2012, perdeu o cargo após ser preso, em 2014, por exploração sexual infantil, por decreto de desembargador do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM). O filho já foi prefeito da cidade e teve o registro de candidatura cassado por determinação do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-AM) em 2020.
O atual prefeito, Keitton Wyllyson Pinheiro Batista (PP), é sobrinho de Adail Filho e assumiu o cargo após vencer eleições suplementares, em 2022. Agora Adail Pinheiro, o pai do deputado, volta à função. O prefeito eleito precisou lidar ao longo da campanha com as acusações de pedofilia.
Ele foi alvo de prisão preventiva pelo TJ-AM em fevereiro de 2014 após o Ministério Público do Estado do Amazonas (MPE-AM) receber denúncias de crianças entre nove e 11 anos que foram vítimas do prefeito eleito e teve a pena aplicada em novembro de 2014. Ele acabou sendo solto em 2017, beneficiado por um indulto presidencial de fim de ano.
Em 2016, o indulto do fim de ano concedido pela Presidência da República beneficiou presos condenados a até 12 anos de reclusão por crimes sem grave ameaça ou violência, desde que já tenham cumprido 1/4 da pena se primários ou 1/3, se reincidente.
O promotor Álvaro Granja Pereira de Souza, que assinou o parecer, apontou que os crimes pelos quais ele foi condenado não usaram de grave ameaça ou violência.
O prefeito eleito também foi alvo de investigação na Câmara dos Deputados, em 2014. “De acordo com informações obtidas, Adail Pinheiro, com auxílio de servidores públicos, estruturou essa rede de exploração sexual da qual se beneficiam ele próprio e pessoas do seu círculo de amizade”, aponta relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) instaurada em 2014 para apurar denúncia de turismo sexual e exploração sexual de crianças e adolescentes, publicado após a prisão.
O relatório da então deputada federal Liliam Sá (PROS-RJ) indiciou Pinheiro por estupro de vulnerável, favorecimento de prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável, associação criminosa e submeter criança ou adolescente à prostituição ou à exploração sexual.
Em 2018, já após o indulto, Adail Pinheiro foi condenado a pena de mais de 57 anos de prisão pela Justiça Federal no Amazonas após ação penal movida pelo Ministério Público Federal (MPF) no Estado.
Segundo a denúncia, ele participou de uma esquema de fraude em licitações na prefeitura de Coari e desvio de recursos públicos de convênios federais e pagos pela Petrobrás.
Ele teve a liberdade concedida pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região em dezembro desse mesmo ano. A decisão dizia que Pinheiro atende aos pré-requisitos legais para aguardar recursos em liberdade.
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