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Opinião|Indignação mixuruca de opositores faz a felicidade de Lula com ministro encrencado

O indiciamento do ministro pela PF não é uma confirmação de culpa, mas o episódio tinha potencial para chacoalhá-lo para fora do cargo

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Foto do author Diogo Schelp
Atualização:

Lula está feliz com Juscelino Filho, ministro das Comunicações, indiciado no último dia 12 pela Polícia Federal por suspeita de corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Foi o que ele disse na sexta-feira (21) em uma entrevista a uma rádio do Maranhão, estado do ministro encrencado. O presidente acredita também que existe “muito preconceito” contra pessoas que ele convidou para o seu governo.

Vale a pena refletir sobre essa declaração: será mesmo justificável que os brasileiros tenham esse tipo de atitude em relação a um político só por causa dos indícios de que ele direcionou recursos públicos para asfaltar uma estrada que passa em frente a uma propriedade de sua família? Isso foi o que o Estadão revelou em janeiro do ano passado, ainda no comecinho do governo Lula. A partir dali, uma série de revelações desairosas foram engrossando o “preconceito” contra o ministro.

O presidente Lula ao lado do ministro Juscelino Filho (Comunicações) durante a cerimônia de lançamento no Palácio do Planalto em Brasília. Foto: Wilton Junior / Estadão Foto: WILTON JUNIOR

Lula, muito zeloso em evitar injustiças e prejulgamentos, até para reforçar a sua própria narrativa de inocência, manteve-se firme no apoio ao integrante do seu gabinete. Juscelino, além do mais, é do União Brasil, o mais infiel dos partidos da coalizão governista no Congresso — ou seja, um dos elementos instáveis que dificultam a fusão de forças do governo com o Centrão. O ministro é apadrinhado por Davi Alcolumbre, principal nome para a disputa da presidência do Senado no início do ano que vem. Não é simples tirá-lo da equação.

O indiciamento pela PF obviamente não é uma confirmação de culpa, como o próprio indiciado vem afirmando. Mas o episódio tinha potencial para chacoalhá-lo para fora do cargo, como ocorreria em qualquer país sério do mundo. Quando as suspeitas sobre um agente público chegam a esse ponto, não deveria restar outra opção além de afastá-lo até o arquivamento do caso pela Procuradoria-Geral da República ou até uma absolvição ou condenação na Justiça.

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Mas a defesa da ética na política tornou-se uma veleidade no Brasil. Esquerda, direita e Centrão no Congresso unem-se com gosto e sem ruborizar em torno de projetos de lei para desmantelar ferramentas úteis no combate à corrupção, como o que proíbe a delação premiada para pessoas presas, ou para proteger autoridades de críticas, como o que procura criminalizar a “discriminação” contra pessoas politicamente expostas. Afinal, tem “muito preconceito” nesse meio, conforme identificou Lula.

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No dia do indiciamento de Juscelino, alguns deputados e senadores de oposição fizeram manifestações protocolares contra o ministro, pedindo sua demissão. Nos dias seguintes, deixaram o assunto esfriar. Aparentemente ninguém está muito interessado que vire moda investigar a destinação de recursos do orçamento secreto. Mas a indignação mixuruca dos opositores tem mais a ver com a falta de disposição de comprar briga com Alcolumbre, que promete encampar algumas das prioridades do bolsonarismo caso volte à presidência do Senado, como aprovar projetos para reduzir o poder do STF e para anistiar golpistas. É mais negócio para a oposição tentar desgastar o governo em outras frentes. E assim Lula pode seguir feliz e contente com seu ministro encrencado.

Opinião por Diogo Schelp

Jornalista e comentarista político, foi editor executivo da Veja entre 2012 e 2018. Posteriormente, foi redator-chefe da Istoé, colunista de política do UOL e comentarista da Jovem Pan News. É mestre em Relações Internacionais pela USP.

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