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Opinião|Por que Pablo Marçal tem medo de Alexandre de Moraes?

O candidato antissistema prefere agradar o eleitorado bolsonarista com ataques contra a classe política tradicional em vez de escolher a elite do Judiciário como alvo, como fez Bolsonaro

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Foto do author Diogo Schelp

A suspensão do X (ex-Twitter) no Brasil, por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), colocou lenha na fogueira dos ânimos para a manifestação de 7 de setembro, que está sendo organizada por aliados de Jair Bolsonaro em São Paulo. A agenda da mobilização é “Fora Alexandre de Moraes”, ainda que Bolsonaro, investigado em inquéritos sob relatoria do ministro, use eufemismos para se referir à motivação do ato. “De nada vale comemorarmos a independência se não temos liberdade”, disse na semana passada o ex-presidente em vídeo que também serviu para quebrar o gelo com Pablo Marçal (PRTB), o candidato a prefeito de São Paulo, com quem a família Bolsonaro esteve às turras nos dias anteriores. Bolsonaro deixou claro que Marçal, apesar das desavenças recentes, estava convidado para comparecer.

O aval para participar da manifestação, apesar de ser uma oportunidade para Marçal reforçar seu vínculo com Bolsonaro, que oficialmente apoia o prefeito Ricardo Nunes (MDB) na disputa eleitoral, representa também um constrangimento para o influenciador de autoajuda, que evita a qualquer custo fazer críticas ao todo-poderoso Alexandre de Moraes. Esse, aliás, foi um dos pontos de embate entre Marçal e filhos e aliados de Bolsonaro nas últimas semanas.

Pablo Marçal (PRTB), candidato à Prefeitura de São Paulo, mostrando medalha dos três I's de Jair Bolsonaro Foto: Reprodução/CNN Brasil

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Marçal chegou a se opor à ideia de buscar o impeachment de Moraes no Senado, uma das pautas mais caras da oposição bolsonarista, dizendo que isso daria a chance de Lula indicar um novo ministro ainda mais alinhado a ele no STF. Esse posicionamento lhe rendeu puxões de orelhas virtuais do vereador do Rio Carlos Bolsonaro, filho do ex-presidente, e do pastor Silas Malafaia, que deverá subir ao carro de som da Av. Paulista, no próximo sábado, para fazer os ataques mais duros contra Moraes.

Alguns dias atrás, Marçal cancelou uma entrevista que daria ao influenciador bolsonarista Paulo Figueiredo depois que este se recusou a atender à exigência da assessoria do candidato de não tocar em assuntos relacionados ao ministro do STF. A sinalização de que teme Moraes pegou muito mal nas hostes bolsonaristas e Marçal precisou inserir uma rápida crítica ao ministro do STF em uma de suas lives na internet, para se retratar: “Moraes, pelo que ele fez, precisa ser investigado urgente.” Ficou nisso.

A cautela de Marçal repetiu-se nos últimos dias, depois da suspensão do X. O candidato, normalmente tão desprovido de papas nas línguas, manteve um obsequioso silêncio em relação à medida que um em cada um bolsonarista-raiz considera ser uma evidência de que o Brasil vive sob uma ditadura do Judiciário.

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O que explica o medo que Pablo Marçal, o candidato antissistema, tem de Alexandre de Moraes? Há pelo menos duas explicações plausíveis. A primeira é o fato de que Marçal já sentiu na pele a ponta da caneta do ministro. Moraes foi o relator da decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que endossou a derrubada do registro da sua candidatura à presidência pelo Pros, em 2022. Agora, dois anos depois, a manutenção do nome do influenciador na urna também está em risco, dessa vez por causa de uma disputa interna do seu novo partido, o PRTB.

O processo está parado nas mãos da presidente do TSE, a ministra Cármen Lúcia, que pode colocá-lo para julgamento no plenário quando bem quiser. Moraes não está mais no TSE, mas dois dos ministros da atual composição da corte nomeados por Lula em maio do ano passado são próximos dele: Floriano de Azevedo Marques Neto e André Ramos Tavares. A preocupação pode ser infundada, mas, na dúvida, parece melhor não se indispor com alguém que, além de ser um implacável ministro do STF, possui amigos e indicados na cúpula da Justiça Eleitoral.

A hesitação de Marçal em confrontos com Moraes também reflete sua de aprender com erros estratégicos cometidos por Bolsonaro. Lideranças antissistema precisam, por definição, eleger inimigos vistosos da “elite” para angariar simpatia. Bolsonaro escolheu a elite do Poder Judiciário como adversária preferencial desde o início do seu governo, o que acabou sendo motivo para boa parte do seu desgaste político e também para a sua situação penal atual.

Já Marçal, ao longo da atual campanha, tem preferido concentrar seus ataques contra a classe política tradicional e contra o velho fantasma do comunismo. Mesmo quando critica decisões judiciais, como a que suspendeu suas contas principais nas redes sociais pela suspeita de que foram turbinadas com pagamentos indevidos a terceiros, ele evita personalizar os ataques, preferindo centrar fogo genericamente em um suposto complô do “sistema” ou em se apresentar como vítima de censura. Antissistema, sim, mas só até certo ponto.

Opinião por Diogo Schelp

Jornalista e comentarista político, foi editor executivo da Veja entre 2012 e 2018. Posteriormente, foi redator-chefe da Istoé, colunista de política do UOL e comentarista da Jovem Pan News. É mestre em Relações Internacionais pela USP.

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