BRASÍLIA – Candidato à reeleição em Porto Alegre, o prefeito Sebastião Melo chega ao segundo turno neste domingo, 27, à frente nas pesquisas, apesar da tentativa de sua adversária, a deputada federal Maria do Rosário (PT), de responsabilizá-lo pela enchente de abril, que deixou a cidade debaixo d’água e 13 mil moradores desabrigados.
Na avaliação do cientista político da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Rodrigo Stumpf, a resiliência do prefeito é resultado do caráter localista do debate eleitoral. “O debate ficou muito centrado em questões da cidade, como as enchentes, os postos de saúde e a manutenção urbana. E Melo tinha o que mostrar, enquanto a Maria do Rosário teve uma atuação política muito mais voltada para o Legislativo.”
Desde a década de 1970, a cidade tem um Sistema de Proteção contra Inundações, que dispõe de 60 km de diques para dar vazão à água das chuvas. Melo diz que essa infraestrutura é obsoleta e defende adaptações. A petista, por outro lado, acusa a gestão municipal de negligenciar a manutenção de casas de bomba e o aparato de drenagem.
Em que pese a disputa na capital gaúcha reflita a polarização protagonizada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e por Jair Bolsonaro, ambos os candidatos buscaram fazer gestos ao centro para evitar a rejeição de seus cabos eleitorais.
Melo é formalmente apoiado por Bolsonaro, mas anda em corda bamba ao buscar o voto de eleitores avessos ao ex-presidente sem perder seus apoiadores mais fiéis. A estratégia segue a receita utilizada por ele, em 2020, quando se elegeu pela primeira vez ao cargo. Hoje, assim como naquele ano, modula seu discurso sob justificativa de que precisa manter uma ampla coligação partidária, com oito legendas.
Seu discurso passa ao largo do debate de costumes, caro aos bolsonaristas. Em vez disso, foca em marcas do primeiro mandato. Stumpf lembra que Melo pertenceu a uma ala mais à esquerda do MDB na década de 1980, foi um líder comunitário e mais tarde se consolidou como um político centrista com trânsito em diferentes segmentos.
A aliança com Bolsonaro é recente e não teve reflexos na gestão. “O PT tentou emplacar uma campanha centrista e menos nacionalizada. Isso favoreceu o Melo, que não precisou responder sobre sua relação com o PL e o Bolsonaro. A gestão dele não teve uma identidade ideológica clara”, avalia Stumpf.
Leia também
Rosário, segunda colocada nas pesquisas, evitou vinculação com Lula. Ela está em seu sexto mandato na Câmara pelo PT e foi ministra dos Direitos Humanos no governo de Dilma Rousseff. Contudo, o principal esforço de sua campanha foi o de fazer gestos ao centro.
Incorporou, por exemplo, o discurso de responsabilidade fiscal, ao prometer respeitar os limites orçamentários da cidade. Admitiu ter votado a favor do projeto que acabou com as “saidinhas” de detentos para evitar críticas de opositores. A matéria teve amplo apoio de parlamentares bolsonaristas e enfrentou oposição da esquerda, inclusive de Lula, que vetou o texto.
O presidente não fez nenhuma agenda com a candidata no Estado e apareceu apenas em vídeos gravados para peças de campanha. Ela chegou, inclusive, a dar declarações de que sua vinculação com os direitos humanos poderia prejudicá-la junto ao eleitorado.
Para Stumpf, as tentativas de se desvincular da polarização, atrapalhou a deputada a apresentar sua experiência. “A Maria do Rosário quis se apresentar como centrista e acabou não ressaltando sua principal experiência no Executivo, que foi como ministra dos Direitos Humanos.”
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.