O professor da Unicamp Marcio Pochmann defende uma Constituinte para discutir a reforma tributária e diz que, caso o PT volte à Presidência, a Previdência passará por “mudanças pontuais, não uma reformulação geral”. Ele é um dos responsáveis pelo programa de governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Líder nas pesquisas, mas preso em Curitiba, Lula pode ser substituído na cabeça de chapa pelo ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad.
O plano de governo, diz ele, começou com a análise crítica das gestões petistas. “Mas, quando o PT estava no governo, falavam que ele só teve sucesso por causa do Plano Real. Agora, dizem que as coisas ruins são por causa do PT.”
A seguir, trechos da sua sabatina, feita nesta quinta-feira, 23, na série Estadão FGV/Ibre Os Economistas das Eleições.
Como o PT vê a necessidade de reforma da Previdência? Acreditamos que o debate da Previdência tem sido mal feito. Os governos do PT não deixaram de fazer mudanças, como o estabelecimento de idade mínima, que passou a ser 65 anos para homens e 60 anos para mulheres, isso combinado ao tempo de contribuição. De 2003 para cá, o servidor federal, ao se aposentar, tem o limite máximo para pensão e aposentadoria igual ao do regime geral. O que temos hoje é adequado, mudanças pontuais precisam ser feitas, mas não uma reformulação geral.
Que ajustes pontuais? Há um problema intenso no tema de aposentadoria e pensão no que diz respeito aos regimes próprios de Estados e municípios. Promoveremos debates com governadores e prefeitos. A forma de fazer mudanças é fundamental. Quando se impõe uma mudança, você divide o País.
E a questão tributária? O programa já oferece algumas medidas, enquanto se espera as condições para uma reforma profunda. Nós imaginamos uma tributação com alíquota zero para determinado patamar de spread (a diferença entre o que o banco paga para captar recursos e o que cobra para emprestar), mas acima disso, taxas mais altas. Claro, depende do Congresso, mas a ideia é ter uma Assembleia Constituinte para tratar do tema tributário, fazer uma reformulação profunda para o enfrentamento da desigualdade.
O que explica o déficit fiscal? O déficit fiscal está associado à política econômica a partir de janeiro de 2015. A recessão aprofundou o problema fiscal. Não fizemos aventuras. O governo Lula foi comprometido com o problema fiscal sem subir imposto ou privatizar. Os governos podem gastar melhor e essa é uma preocupação, mas as decisões dos últimos dois anos desconstroem a ponte para o futuro. Foram quase 4 mil indústrias fechadas só em São Paulo, essa situação desorganiza o setor produtivo e a base da sociedade.
A chapa pretende rever a reforma das leis trabalhistas? Queremos propor um Estatuto do Trabalho coerente com a realidade do mundo do trabalho. Isso significa rever a reforma trabalhista e a terceirização generalizada. O que temos hoje é um problema sério para os trabalhadores. Há um esvaziamento dos sindicatos. Se o (fim da contribuição) for mantido, em três ou quatro anos não teremos mais sindicatos.
Erros das gestões petistas explicam o desemprego no País? Temos um quadro dramático, 22 mil doutores formados no ano passado estão desempregados. Nós fizemos expansão do ensino universitário. Isso tem a ver com o que aconteceu nos últimos dois anos. Quando o PT estava no governo, falavam que ele só teve sucesso por causa do Plano Real. Agora, dizem que as coisas ruins são por causa do governo do PT.
Que tipo de erros você identifica nas gestões petistas? Prefiro falar dos acertos. Até porque nossa preocupação é não cometermos erros antigos. É uma nova realidade a que estamos vivendo. 2019 será diferente de 2003, 2007, 2011 e 2015 (primeiros anos dos mandatos de Lula e Dilma).
Qual será o papel dos bancos públicos e das estatais? É fundamental termos uma reformulação da governança em relação às estatais e bancos públicos. Não há razão em colocar a lógica privada no Estado. O País tem mais de 5 mil municípios, todos precisam ter agências bancárias. Isso não é papel do banco privado.
E também haveria uma mudança no Banco Central? A proposta é a que o BC tenha um duplo mandato, balizando o comportamento da inflação e focado em preservar o emprego, como nos Estados Unidos.
O PT nega privatizações, mas faz concessões. Novas concessões podem acontecer? Não há preconceito com concessões, PPPs. As concessões de aeroportos, por exemplo, foram importantes. O governo pode fazer muito ao estabelecer garantias de que não vai haver recessão. Privatizações, não. Nas concessões, o patrimônio acaba voltando para o Estado.
Como aconteceu com as hidrelétricas? Deu confusão. Há confusão em vários setores. Privatizar em várias partes geraria confusão. O setor elétrico era privado e faltava luz. A estatização resolveu o problema nos anos 1950. Temos de nos perguntar: onde é fundamental que o Estado esteja?
E o papel da Petrobrás? Se tivesse sido mantido o programa para a Petrobrás do governo FHC, não teria pré-sal. Ela é uma empresa estatal, que tem compromisso com o País. A mudança com o conteúdo nacional fez com que se desenvolvesse a indústria naval do País, depois a orientação mudou. O que são as reformas dos meios de comunicação propostas? A população não acredita nos meios de comunicação, por serem enviesados. Queremos democratizar e promover a competição, uma lei de mídia. Não é possível uma família ser dona de um complexo midiático inteiro. Isso impede a competição. Com a reforma, teremos maior diversidade para o País.
Veja o calendário da série "Estadão-FGV IBRE: Os economistas das eleições"
Já participaram:
07/08 - Marco Antonio Rocha (campanha de Guilherme Boulos)
10/08 - André Lara Resende (campanha de Marina)
16/08 - Gustavo Franco (campanha de Amoêdo)
23/08 - Marcio Pochmann (campanha de Lula/Haddad)
Próximos (clique no nome de cada candidato para se inscrever).
11/09 - José Márcio Camargo (campanha de Meirelles)
18/09 - Mauro Benevides (campanha de Ciro)
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