O Brasil mudou. Fecha-se o capítulo da gestão indigna e criminosa na pandemia, ofensas estéreis entre os Poderes, confronto federativo sistemático, desastroso desmanche de políticas e órgãos públicos. Abre-se o capítulo da normalidade, com o que há de bom, ruim, incógnitas e a complexa busca de diálogo e consensos.
Ao sair do Alvorada pela porta dos fundos e abandonar o cargo, o País e seus próprios seguidores antes da posse do sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva, Jair Bolsonaro deixou no ar: valia a pena entrar com uma ação para impedir que você, leitor, leitora, pagasse avião, equipe e luxo na viagem pessoal de Bolsonaro a Orlando?
Melhor deixá-lo levar sua insignificância para bem longe, virar essa página e garantir uma festa alegre e colorida na posse. Passou, acabou, é recolher os escombros e reconstruir a administração pública, os princípios e relações republicanas. Com muita expectativa, mas condições adversas. Uma confluência perigosa.
O Lula de 2003, mais jovem, menos machucado, encontrou uma herança bendita, o País mais unido, um Executivo estruturado e ambiente econômico e internacional favorável. O Lula de 2023, calejado, tem faro para bombas e sabe como escapar delas para focar no bem-estar geral e nos milhões de brasileiros à margem da civilização.
Ele conhece essa realidade e espera-se que saiba que, além da diversidade, só consegue interferir nela sem preconceito contra o capital. Só com Estado saudável, empresa forte, investimentos e credibilidade internacional há desenvolvimento, emprego, inclusão.
Com seus erros e dores, Lula aprendeu também a sobreviver a guerras que não pode vencer. Não vai pegar em armas e, sim, desarmar os espíritos nas Forças Armadas. E não vai comprar nem bater de frente com o Centrão e, sim, manter canais com ele e reequilibrar a balança no Congresso junto com as forças políticas de centro.
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Hoje é dia de festa, mas os desafios estão só começando e um deles é conhecer a cara, o tamanho e os métodos de uma oposição feroz, em torno de quartéis, gestando atentados terroristas. Quem dará voz de comando a ela? Em que rumo? Na fuga de Bolsonaro, a sensação de página virada não foi só de Lula, mas também do general Hamilton Mourão. Sem combinar, convocou rede nacional e deixou evidente que, no Senado, disputará o espólio do capitão.
O jogo está montado: com milhões de brasileiros na oposição, em busca de um líder, rumos e limites, Lula resgata as estruturas e políticas públicas, as relações institucionais e os valores fundamentais de Pátria, humanidade, inclusão e... democracia. Sim, o Brasil mudou, ou voltou
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