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Opinião|Israel esquenta, Rússia esfria

Brasil e China atendem a “chamado” de Putin e voltam a articular acordo de paz entre Rússia e Ucrânia

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Foto do author Eliane Cantanhêde
Atualização:

Depois do excesso de ambição e sucessivos fracassos na tentativa de recuperar o protagonismo do Brasil e o prestígio internacional de Lula, o governo agora trabalha com a China, em silêncio e comedidamente, na busca de algum acordo de cessar-fogo entre Rússia e Ucrânia. O momento é propício, já que os dois lados dão sinais de exaustão diante de uma guerra que se prolonga sem perspectiva de vitória para um ou para o outro.

O primeiro sinal de abertura da Rússia ao diálogo foi dado por Vladimir Putin, quando citou Brasil, China e Índia, publicamente, como potenciais mediadores. A partir daí, a diplomacia voltou a agir. Na semana passada, o chanceler russo Sergei Lavrov conversou com o brasileiro Mauro Vieira em Riad, na Arábia Saudita, e depois com o assessor internacional Celso Amorim, em Moscou. E Amorim já engatou contatos com seu correspondente chinês, que integra o Politburo do seu país.

Os chanceleres do Brasil, Mauro Vieira (esq.), e da Rússia, Sergei Lavrov, no Itamaraty em abril de 2023 Foto: Eraldo Peres/AP Photo

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Essa sinalização, ou convocação, de Putin ocorreu após a reação considerada “branda” de Moscou aos ataques ucranianos ao território russo, também entendida como sinal de inflexão de Putin e de esgotamento da própria guerra. O grande temor, no primeiro momento, era que Putin contra-atacasse de forma avassaladora, o que não ocorreu. Juntando as pontas, Brasil e China puseram-se a postos, mas a Índia, nem tanto, ao menos até onde a vista alcança e os ouvidos captam.

O pano de fundo para as conversas tem sido a ampliação dos Brics (Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul) com quatro novos parceiros já integrados (Emirados Árabes, Etiópia, Egito e Irã) e outros tantos ainda em negociação. Essa também foi a pauta oficial do telefonema de Putin para Lula na quarta-feira, mas mal disfarça os avanços nas conversas sobre a guerra Rússia-Ucrânia, que têm até cronograma e um rascunho com quatro condições para os dois países.

O próximo passo será na semana que vem, com mais uma rodada de conversas entre Brasil e China, em paralelo à abertura da Assembleia-Geral da ONU, em Nova York. E a proposta rabiscada prevê redução das hostilidades, preservação de alvos e cidadãos civis e troca de prisioneiros, compromisso de não uso de armas atômicas em nenhuma circunstância e, por fim, uma conferência internacional de paz que inclua tanto a Ucrânia quanto a Rússia. Essa conferência poderá ser lançada já na semana que vem, em Nova York, envolvendo um conjunto de países e um pré-acerto: todas as propostas de cessar-fogo deverão ser consideradas.

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Ainda embrionária, essa construção exige paciência e tempo, mas uma coisa é certa: é uma faca de dois gumes para Lula. O envolvimento direto joga holofotes e confere status a ele e ao Brasil, reduzindo as legítimas críticas de muita ambição, pouco resultado; muito falatório, pouca ação. Mas, além do alto risco de virar mais um tiro n’agua, a articulação tende a aumentar as suspeitas sobre os rumos dos Brics, da política externa brasileira e de suas alianças com China e Rússia, que de democracias não têm nada.

Isso se torna ainda mais provável porque essa união de Brasil e China pode ser vista como contraponto ao Acordo de Copenhagen, lançado em julho por iniciativa de países considerados “independentes” na guerra. O Brasil chegou a participar da reunião na Dinamarca, mas discordando da inclusão só da Ucrânia, sem a Rússia.

Bem, o fato é que não só a Rússia e a Ucrânia dão sinais de exaustão com a guerra, mas também o mundo todo, agora muito mais focado no potencial devastador da escalada de Israel contra o Líbano. Assim, é melhor haver articulações de paz do que não haver nada em relação a Putin e Zelenski.

Opinião por Eliane Cantanhêde

Comentarista da Rádio Eldorado, Rádio Jornal (PE) e do telejornal GloboNews em Pauta

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