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Um olhar crítico no poder e nos poderosos

Opinião|Novo temor: o almirante Almir Garnier desmentir e incriminar Freire Gomes e Baptista Jr.

A torcida na Defesa e nos quartéis generais é que a Polícia Federal não aceite a oferta de um novo depoimento do ex-comandante da Marinha

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Foto do author Eliane Cantanhêde
Atualização:

Há um alívio nas Forças Armadas com a separação entre o joio golpista e o trigo legalista, depois que o general Freire Gomes e o brigadeiro Baptista Jr., ex-comandantes do Exército e da FAB, confirmaram a tentativa de golpe e que o então presidente Jair Bolsonaro a liderava pessoalmente. A nova preocupação, agora, é com um novo depoimento do almirante Almir Garnier, o único dos três comandantes que apoiou e disse a Bolsonaro que poria “as tropas da Marinha” na aventura.

Na primeira reunião ministerial do ano, nesta segunda-feira, o presidente Lula disse que o Brasil correu o “sério risco” de um golpe e chamou o antecessor de “covardão”. Já o ministro da Defesa, José Múcio, entrou mudo e saiu calado da reunião, mas depois não escondeu que ele próprio está aliviado com os depoimentos do general e do brigadeiro à PF: “Agora a suspeição tem nome, saiu do CNPJ (Forças Armadas) para os CPFs (os militares golpistas)”. Traduzindo: não se generaliza mais, não se fala mais em “golpe militar”, nem que “os militares” são golpistas, mas sim que havia militares envolvidos e os comandantes do Exército e da FAB agiram para evitar o golpe.

O presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva durante reunião ministerial realizada na manhã desta segunda-feira 18 de março de 2024 no Palácio do Planalto em Brasília-DF  Foto: WILTON JUNIOR/ ESTADÃO

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A torcida na Defesa e nos quartéis generais é que a Polícia Federal não aceite a oferta de um novo depoimento de Garnier, que é investigado, enquanto Freire Gomes e Baptista Jr. são apenas testemunhas, e decidiu ficar calado quando chamado a depor da primeira vez. Perdeu o “timing”, dizem no meio militar, onde o temor é que, ressentido, com raiva, Garnier tente desmentir e incriminar o general e o brigadeiro, que deram versões semelhantes à PF e se sentirem liberados para contar tudo depois de saber que o general Braga Neto “quebrou o espírito de corpo militar”, ao xingá-los aos palavrões e atiçar as redes sociais até contra suas famílias.

Nas Forças também já foi assimilado que mais um general está para sofrer operação de busca e apreensão, o agora deputado Eduardo Pazzuelo, ex-ministro da Saúde e adepto de que “um (Bolsonaro) manda, e outro (ele próprio) obedece”. E ainda há suspense sobre haver ou não novos oficiais envolvidos, já que a PF tem uma espécie de força-tarefa para fazer a perícia de celulares e computadores apreendidos com os investigados.

E estamos às vésperas do 31 de março, dia do golpe de 1964, que durou vinte anos e entrou para a história como o regime das torturas, mortes, desaparecimentos e fechamento das instituições. Dessa vez, o problema do ministro Múcio e dos atuais comandantes não está “do lado de cá”, dos quarteis, mas “de lá”, dos civis, principalmente petistas e até o ministro dos Direitos Humanos, Sílvio Almeida, que criticam a posição de Lula, ponderada e adequada, de desautorizar qualquer tipo de comemoração ou de condenação.

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Há “previsão zero” de bolsões militares da ativa se manifestando pró golpe de 64, só o de sempre: os clubes da reserva, ou “do pijama”, que sempre fazem uma espuma daqui ou dali e não dá em nada. Se há risco, parece vir de bolsonaristas a favor de 64 e da própria esquerda e de setores mais radicais do PT, que não abrem mão de gritar contra a ditadura militar. Lula, Múcio e os comandantes sabem que não é hora de jogar lenha na fogueira. E o “lado de lá”?

Há também a intenção de tocar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que proíbe a militares disputarem mandatos políticos e depois voltarem à caserna caso derrotados. O líder do governo no Senado, Jacques Wagner (PT), que já foi ministro da Defesa, terá reuniões hoje exatamente para discutir ajustes no texto original e traçar um cronograma de votação.

Uma voz contrária à PEC é do senador Hamilton Mourão, general da reserva e ex-vice presidente de Bolsonaro, mas, nas Forças Armadas, o veto parece ser bastante consensual. Ou bem o camarada é militar, ou bem é político. O que não dá é para atravessar a rua, de lá para cá, voltar cheio de minhocas na cabeça e contaminar os quartéis com a política. Principalmente agora, depois do “sério risco”, como diz Lula, de um real golpe contra a democracia.

Opinião por Eliane Cantanhêde

Comentarista da Rádio Eldorado, Rádio Jornal (PE) e do telejornal GloboNews em Pauta

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