Em reunião nesta segunda, 16, com os ministros da Justiça, Defesa e GSI, mais o interventor do DF e o diretor da PF, o presidente Lula estava bravo, irritado com “omissões” e “conivências”, inclusive de militares, no golpe de domingo, 8, e avisou: “Nunca mais vai acontecer!”.
Entre tantas heranças malditas deixadas por Jair Bolsonaro, não só para Lula, mas para o Brasil, a mais complexa e difícil de consertar é o estrago nas Forças Armadas. Não depende só de recursos e dança de cadeiras, é preciso muito mais, sobretudo tempo, habilidade e bom senso.
Grande parte dos militares não votou em Lula, mas, assim como há golpistas histéricos, a maioria – espera-se! – é de oficiais legalistas, que prezam a Constituição, as instituições e a democracia. E batem continência para a autoridade constituída, dentro dos princípios de ordem, disciplina e hierarquia.
Exemplos: o comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, e seus antecessores Eduardo Leal Ferreira e Ilques Barbosa, que saíram dos grupos de WhatsApp de suas turmas da Escola Naval em defesa de Olsen e da democracia, e os ex-comandantes do Exército, general Fernando Azevedo e Silva, e da FAB, brigadeiro Juniti Saito, adeptos da pacificação que o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, tenta a duras penas.
A questão é como tratar o racha e os radicais, em particular no Exército, que expeliu Bolsonaro como capitão, mas foi tragado por ele à custa de cargos, salários e privilégios. É inaceitável ter golpistas se refestelando 60 dias no Quartel-General, com churrascos e banheiros químicos, no que Flávio Dino (Justiça) chamou de “incubadora de terroristas”. E se fossem o MST, indígenas, moradores de rua?
O Exército foi leniente, ou conivente, e o problema é calibrar a reação, punindo os culpados sem confrontar a instituição e sem jogar mais lenha na fogueira. Lula não pode fingir que não aconteceu nada, nem testar força com as FA, botar a faca no pescoço de brigadeiros, almirantes e generais. Ele já disse que não quer saber quem votou em quem, mas tem de separar o joio do trigo, isolar o inimigo – bolsonaristas irrecuperáveis, que aplaudem golpes e conspiram – e ampliar os canais com os legalistas – que querem paz e diálogo, mas sem abrir guerra contra seus pares.
O melhor para Lula e o Brasil é ele manter o processo de pacificação, atraindo os legalistas e impedindo que eles, por corporativismo, se unam aos hostis. Não é com um ministro petista, ou esquerdista, que vai conseguir. Para Múcio, é muito fácil retomar a vida boa no Recife. Para Lula, ruim com Múcio, pior sem ele.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.