Envolvido em tantas guerras, de Israel, Ucrânia, Rio, Centrão, déficit zero, o presidente Lula vai se meter em outra pós-feriado, mais próxima e mais delicada: a que corre solta entre Polícia Federal (PF) e Agência Brasileira de Inteligência (Abin), depois de uma operação de prisão, busca e apreensão na agência, acusada de usar um equipamento espião e ilegal para monitorar a localização de 33 mil políticos, adversários, advogados, ministros do STF e jornalistas no governo Bolsonaro.
Os dois órgãos têm funções sensíveis, de inteligência e informação, e Lula não pode descuidar. Por isso, segundo o Planalto, vem conversando com os dois lados e deve receber para uma conversa, logo, logo, o diretor-geral da Abin, Luiz Fernando Corrêa, uma escolha pessoal dele próprio, agora na linha de fogo da PF. Confirmado o encontro, Corrêa tem chance de fazer, além de uma contundente autodefesa da instituição que comanda, um longo resumo de sua trajetória profissional.
Ele, aliás, é justamente delegado federal de carreira, já foi Secretário Nacional de Segurança e diretor geral da Polícia Federal nos governos petistas e, nessas condições, chefiou o atual diretor da PF, Andrei Passos, bem mais jovem, mas igualmente delegado federal de carreira e escolha pessoal de Lula para o atual cargo. Logo, parece uma guerra fratricida... E vai longe.
PF x Abin
Quase que simultaneamente, em março deste ano, a PF abriu investigação e Abin iniciou sindicância interna sobre o uso de equipamento ilegal para espionagem até meados de 2021, no governo anterior, quando tudo era possível e as instituições de Estados foram usadas e abusadas politicamente. Se foi na era Bolsonaro, por que a guerra entre os dois diretores gerais da era Lula?
A versão da PF, que a Abin acusa de ter iniciado os bombardeios, é que a agência estava fazendo corpo mole para elucidar os fatos, apontar e punir os responsáveis e que, afinal, crime não é caso de sindicância, mas de polícia. A versão da Abin é política: Corrêa estaria sendo alvo porque, como autor de uma proposta de criação do Ministério da Segurança Pública, independente do da Justiça, tornou-se um candidato natural a ministro. E, como ministro, viraria chefe da PF e de Passos. Em documento interno, a Abin acusou indiretamente a PF de “politização e disputas mesquinhas de poder com a inteligência de Estado”.
O fato é que o software FirstMile, da empresa Cognyte, foi efetivamente usado ilegalmente e com fins políticos pela Abin, então dirigida por um terceiro delegado federal de carreira, Alexandre Ramagem – que o ministro Alexandre de Moraes, do STF, vetou para a PF e Bolsonaro, vejam só!, quer lançar à Prefeitura do Rio em 2024.
A “nova Abin”, comandada por Corrêa, diz que vinha apurando tudo e que enviou dez ofícios para a PF e três para o STF (que depois autorizou a operação policial), repassando “integralmente” os resultados da sindicância, além de dados e computadores. Já a PF nega. Diz que a Abin sonegava informações e a sindicância era tipicamente corporativa, “para inglês ver” e “dar em nada”. E pergunta: por que nada aconteceu em dez meses de governo? Por que os dois envolvidos só foram presos agora e um terceiro foi demitido só após a operação policial?
PF e Abin têm duas frentes. Uma é a comunicação, a outra é por apoio político. Ambos, Corrêa e Andrei Passos, têm acesso direto a Lula, mas Corrêa é próximo do chefe da Casa Civil, o petista Rui Costa, e Passos, subordinado direto do ministro da Justiça, Flávio Dino. E agora? Lula vai lavar as mãos e deixar o pau quebrar, ou vai interferir? Como? Ninguém sabe, mas guerra de inteligência e informação é problema na certa. E se uns forem investigar (e vazar...) eventuais podres dos outros?
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