Por que os novos comandantes militares, escolhidos pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, seriam nomeados e assumiriam os cargos ainda em dezembro, antes da posse dele e do seu ministro da Defesa? E por que o ainda presidente Jair Bolsonaro assinaria os atos de nomeação? Para ser bonzinho com Lula? A ideia não cheira bem.
Segundo o repórter Marcelo Godoy, já foi definida até a data da transmissão de cargo do comandante da Aeronáutica, dia 23 de dezembro, uma semana antes da posse de Lula. Assim, ele e os demais seriam nomeados oficialmente por Bolsonaro, capitão insubordinado do Exército.
Qual a intenção? Manter a Aeronáutica, em particular, e as Forças Armadas (FA), em geral, sob algum controle de Bolsonaro? Confrontar o presidente legal, constitucional e legitimamente eleito, futuro comandante em chefe? Tumultuar o País, com as hordas bolsonaristas em torno dos quartéis?
O Alto-Comando da FAB se reuniu nesta semana e o comandante Carlos Alberto Baptista Jr., considerado “o mais bolsonarista dos três”, fez um aceno para o futuro governo: as FA seriam institucionais, não criariam problema. Mas... Veio a ideia da nomeação antecipada e ontem Bolsonaro já convocava ministros e comandantes para atiçá-los contra o ministro Alexandre de Moraes, que rechaçou a palhaçada do PL contra o resultado da eleição.
Bolsonaro deixa um rastro de contaminação política e divisão interna nas FA, a instituição mais prestigiada do País, segundo as pesquisas. Enquanto o ministro da Defesa, os comandantes e o general Villas Bôas soltam notas condescendentes com os atos antidemocráticos em torno de quartéis, oficiais responsáveis de Exército, Marinha e Aeronáutica dialogam com o novo governo.
Em respeito à Constituição, à eleição e ao papel das FA, esses oficiais já põem na mesa o essencial, a manutenção de avanços e projetos justamente da era Lula: Sisfrom e novo blindado do Exército, caças Gripen NG da FAB e submarinos da Marinha, inclusive o de propulsão nuclear.
Também querem manter o artigo 142 da Constituição, que prevê a Garantia da Lei e da Ordem (GLO), as especificidades militares da reforma da Previdência, a paridade entre pessoal da ativa e da reserva e a autonomia da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) e das escolas militares que, vira e mexe, são alvo do PT.
A Defesa é área sensível, passa por seu pior momento desde a redemocratização e está gravemente dividida. Lula terá muito trabalho tanto para não ficar refém do Centrão como para tirar os militares desse nefasto transe bolsonarista.
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