PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Um olhar crítico no poder e nos poderosos

Opinião|Quanto custa a busca de Lula por liderança regional e protagonismo mundial?

O Brasil tem de reocupar um espaço naturalmente seu na região, para alçar voos maiores mundo afora, mas, ‘amigos, amigos, negócios à parte’

PUBLICIDADE

Foto do author Eliane Cantanhêde

Ao desembarcar em Brasília nesta terça-feira, o presidente da Argentina, Alberto Fernández, vai ajudar bastante a responder a uma pergunta que não quer calar: quanto vai custar a recuperação da liderança do Brasil e de Lula na América do Sul, fundamental para a ambição de algum protagonismo global?

PUBLICIDADE

Fernández desistiu de concorrer à reeleição e chega num momento de desespero na Argentina, com o dólar valendo mais de 400 pesos e uma inflação de mais de 100%, a maior em 30 anos. É uma viagem de emergência, não vai sair barata para o Brasil e depois tem mais.

As reuniões desta terça-feira terão Lula, Fernández e a equipe econômica. As orelhas do BNDES vão arder. Ele vai ser chamado a financiar empresas brasileiras que exportam para a Argentina, que já raspou o fundo do tacho de suas reservas e terá de fazer contorcionismos para dizer como, e se, vai pagar a dívida.

Cantanhêde: '(Nas reuniões de Lula com Fernández) um estará de pires na mão e o outro, com os cofres abertos'.  Foto: Adriano Machado/Reuters

Lula volta a se reunir com Fernández duas vezes, uma no fim do mês, num “retiro” dos presidentes da América do Sul em Brasília, e outra em 4 de julho, na cúpula do Mercosul em Porto Iguaçu, na Argentina. Nas três ocasiões, um estará de pires na mão e o outro, com os cofres abertos.

Outro vizinho do Mercosul, o Paraguai, também só pensa naquilo: tirar uma casquinha da ambição brasileira por liderança e protagonismo. Eleito com 47% dos votos no último domingo, o economista Santiago Peña, de 44 anos e do eterno Partido Colorado, só assume em agosto, mas já quer renegociar o acordo binacional de Itaipu, que completa 50 anos.

Publicidade

O Brasil construiu a usina sozinho, com uma contrapartida: o uso de energia é meio a meio e quem não consome os seus 50% é obrigado a vender o excedente para o parceiro. O Paraguai não usa nem um quarto da sua cota e, desde os dois primeiros mandatos de Lula, tenta: ou ficar livre para vender o excedente para outros países, ou renegociar os valores que o Brasil lhe paga. Lula vai ceder? Se ceder, o que o Brasil lucra com isso?

Na fila também está a Venezuela, que vive crise sem fim e terá eleições em 2024, a primeira após a reaproximação com a Colômbia, que sedia reuniões internacionais para uma saída que inclua votos livres e fim das sanções ao país. O Brasil está dentro, mas quer ficar por cima.

O custo da liderança é medido em cifrões, mas há uma outra moeda: o silêncio leniente. Ok, a Nicarágua não fica na América do Sul, mas isso não justifica a falta de uma recriminação enérgica a um regime sanguinário, aqui nas nossas barbas. O Brasil tem de reocupar um espaço naturalmente seu na região, para alçar voos maiores mundo afora, mas, “amigos, amigos, negócios à parte”.

Opinião por Eliane Cantanhêde

Comentarista da Rádio Eldorado, Rádio Jornal (PE) e do telejornal GloboNews em Pauta

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.