Fernando Haddad é uma espécie de guarda-costas da viúva que, além de enfrentar adversários e especuladores, acumula cicatrizes dos tiros que leva pelas costas do próprio governo, especialmente do presidente Lula. Quanto mais fraco Haddad fica, ou parece ficar aos olhos do mercado, dos políticos e da opinião pública, o governo fica mais vulnerável e Lula se torna alvo fácil do faroeste em que se transformou o Congresso.
Toda vez que o ministro da Fazenda viaja, vem um tiro pelas costas e, dessa vez, foi pior. Ele estava no Vaticano, onde discutiu inclusão e o bate à pobreza com o papa Francisco, quando o projeto alterando regras do PIS-Cofins chegou o Congresso e virou um deus-nos-acuda, unindo todos contra um - ele, Haddad. Assim como ele não estava por perto para presentear o projeto, também não estava para defendê-lo.
Quando tentou, era tarde demais e já estava cristalizada a certeza de que a maior “vítima” seriam as exportações. Ele jura que não e telefonou para Blairo Maggi, ex-ministro da Agricultura e um dos maiores líderes do setor, sem sucesso. Mesmo sua sugestão de criar um adendo à MP, especificando que as exportações estavam fora, foi descartada.
Lula chamou Haddad para comer pizza no Alvorada no domingo à noite e, na segunda, pediu ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, para esperar uma solução em 24 horas, antes de devolver a medida provisória do PIS-Cofins. Sem plano B, como admitiu, o ministro perdeu o prazo e o senador devolveu a MP sem sequer iniciar a tramitação e o debate. Não é trivial, nem ação entre amigos. É uma decisão grave do Legislativo contra o Executivo.
Derramou o leite, a compensação de mais de R$ 25 bilhões para as perdas com a desoneração da folha de pagamentos ficou no ar. Sob tiroteio do Planalto e desconfiança generalizada, Haddad lavou as mãos. Pacheco e o Senado que se entendam com os empresários e se virem para garantir a compensação, enquanto o Supremo está com a faca e o queijo na mão: sem cobrir a perda de receitas, a desoneração cai.
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Nada pior para um governo que já não está lá uma maravilha do que criar insegurança quanto à seriedade da política econômica. É exatamente isso que está acontecendo, quando há três sensações no ar interno e externo: de que o Brasil não vai cumprir o arcabouço fiscal, de que o governo perde uma atrás da outra no Congresso e que o ministro da Fazenda é fraco, sem apoio do presidente e do Planalto.
Não se trata de apenas mais uma crise, mas, sim, de uma crise que fragiliza o principal ministro de Lula, o avalista de uma política econômica sensata e o guarda-costas da viúva, que tem menos apoio de ministros petistas do que de não petistas. Compromete o presente e deixa o futuro no escuro para Lula e o PT. Se Haddad cair, quem sobra como herdeiro de Lula e candidato do PT?
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