Primeira eleição direta após a ditadura militar, a elite apavorada com o “risco” de vitória de Luiz Inácio Lula da Silva ou de Leonel Brizola e a surpresa Fernando Collor de Melo disparando. Era 1989 e um passarinho me alertou para uma reunião sigilosa que aconteceria num resort às margens do Lago Paranoá, em Brasília, no dia seguinte. Foi nessa reunião que Silvio Santos disse sim à aventura de concorrer à Presidência da República.
A Academia de Tênis Resort tinha bangalôs, com os quartos em cima e garagens individuais embaixo. Pedi um copo d´água ao motorista e fui ficando por ali, o suficiente para ouvir fragmentos da conversa que ocorria logo acima. Corri para a redação do Estadão e escrevi o que imaginei ser a manchete do dia seguinte: Silvio Santos candidato! Mas o jornal achou tão absurdo que só publicou discretamente uns poucos parágrafos.
Essa história está relatada no livro “O Sonho Sequestrado”, do médico, ex-senador e ex-deputado Marcondes Gadelha (PB), um dos “autênticos do MDB”, grupo à esquerda do partido na ditadura, que depois migrou para o PFL, liberal, na redemocratização. Ele foi um dos mentores da candidatura Silvio Santos e vice na chapa. Foi assim que Gadelha e os também senadores do PFL Hugo Napoleão (PI) e Edison Lobão (MA) viraram “os três porquinhos”, numa alusão à “lambança” tentada em 1989. E Collor venceu, depois afastado e, enfim, alvo de impeachment.
Sílvio Santos, gênio dos negócios e da comunicação, não era político, nunca teve de fato um partido, nunca geriu recursos públicos, não entendia nada de Congresso, mas o trio pefelista sonhava derrotar tanto Collor quanto Lula e Brizola reproduzindo no Brasil o fenômeno Sílvio Berlusconi na Itália. Que, aliás, já era escandaloso por lá.
A Justiça Eleitoral deu um jeito, cassando a candidatura sob pretextos burocráticos contra o partido de Silvio Santos, o PMB. Na verdade – e isso é o que Gadelha conta no livro – a aventura desmoronou pela ação ativa e implacável de setores do Judiciário, do próprio Legislativo e da mídia. A ascensão e queda do voo de SS na política foi meteórica, mas houve uma segunda tentativa.
Em 2002, o nome de Silvio Santos foi jogado novamente no ar. Em abril, a seis meses das eleições presidenciais, com Lula já disparado na frente, contra José Serra, Ciro Gomes e Anthony Garotinho, SS já chegou na corrida com 17,8% na CNT-Sensus, em segundo lugar. Foi um novo voo de galinha e, assim, o Brasil seguiu com seus solavancos políticos, mas manteve o seu maior comunicador até o fim e livrou-se de uma aventura de consequências inimagináveis.
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