Na semana em que o Supremo vai julgar se põe ou não no banco dos réus um ex-presidente da República e oficiais de quatro estrelas por tentativa de golpe, é importante refletir sobre “coincidências” entre fatos e movimentos no Brasil e nos Estados Unidos. Lá, como cá, a Justiça lidera a resistência e a defesa do Estado democrático de direito e é o alvo principal dos ataques dos tiranos.
Nem tudo o que é bom para os EUA é bom para o Brasil, mas, na atual conjuntura internacional e no momento político dos dois países, é ótimo para ambos que o Judiciário, apesar de suas mazelas, seja forte, independente e ativo para enfrentar tentativas de golpes de Estado e ataques grotescos à ordem, às leis e à própria Constituição, além da degradação da bandeira dos dois países pelo mundo. Nos EUA, a invasão inédita do Capitólio no 6/1, com voz de comando de Donald Trump. No Brasil, o vandalismo no Planalto, Congresso e Supremo no 8/1, resultado de quatro anos de Jair Bolsonaro.
Ao voltar ao poder, se autoconferindo poderes imperiais, Trump ultrapassa todos os limites da legalidade e da civilidade e nada poderia ser pior e mais grave do que dar acesso a Elon Musk – o sul-africano que se tornou o homem mais rico do mundo e agora é eminência parda do governo Trump – a informações sigilosas sensíveis do Pentágono sobre uma hipotética guerra com a China.

Raia à loucura e caracteriza não só o óbvio de conflito de interesses comerciais, já que Musk tem negócios estratosféricos com a China, mas principalmente um imensurável risco à segurança nacional na maior potência nuclear e ao próprio planeta. Tão absurdo que Trump foi obrigado a vir a público negar. Mas… quem anunciou que teria acesso foi o próprio Musk, que efetivamente foi ao Pentágono. Passear?
Com a sociedade e as Forças Armadas divididas, como no Brasil, o Judiciário assume a linha de frente do interesse nacional, derruba decisões ilegais e ilegítimas e põe Trump no seu devido lugar. Ele foi eleito presidente dos EUA, não tirano e imperador do mundo, com poderes para implodir a democracia, direitos humanos, comércio global, economia internacional e interna de cada país.
No Brasil, o Supremo conteve campanhas de rua e na internet de apologia a ditaduras, conduziu investigações sobre planos reais de golpe de Estado articulados no Planalto, Ministério da Justiça, órgãos de inteligência e forças policiais e militares. E tem sido implacável contra os criminosos do 8/1, como tende a ser agora com os líderes do golpe.
Nos EUA, também é a justiça que vai barrando, daqui e dali, audácias de Trump, como negar cidadania a nascidos em território norte americano, desmontar a estrutura administrativa do Estado, acabar com a ajuda humanitária da maior potência no mundo… e vai se preparando para intervir em favor da democracia.
É por isso que, como o Supremo e o ministro Alexandre de Moraes são os alvos número 1 do bolsonarismo nas redes e conchavos, a Suprema Corte dos EUA e seu presidente estão na mira do trumpismo e diretamente de Musk, capaz de brindar com US$ 100 quem assinar uma ação popular contra “juízes ativistas”, leia-se legalistas.
Lá, como cá, há todo um malabarismo verbal e um trabalho para inverter a realidade e acusar a Justiça de antidemocrática, golpista, antinacionalista e esquerdista. Seria cômico, não fosse trágico. Que o Supremo julgue Bolsonaro e seus asseclas e com base nas provas e evidências e deixe para a história, os EUA e o mundo um exemplo de como punir e barrar novas tentativas de golpe.