BRASÍLIA - Artistas e empresas de comunicação entraram em acordo nesta quarta-feira, 9, após uma reunião que durou cerca de sete horas, sobre o pagamento de direitos autorais de obras antigas. A falta de consenso sobre o tema vinha dificultando a votação da nova versão do PL das Fake News na Câmara.
Como revelou o Estadão, o novo texto já tem aval de partidos políticos, mas a votação ainda estava sendo segurada pelo presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL). Lira teve encontro com artistas em sua residência oficial na noite de terça-feira, 8. Estiveram no encontro, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, e artistas como os cantores Marisa Monte, Frejat e Xande de Pilares, a empresária Paula Lavigne e a atriz Dira Paes.
O deputado Elmar Nascimento (União-BA), relator do projeto de lei 2370/2019, apelidado de “PL das Fake News fatiado”, deve incluir um prazo de três anos para as emissoras de TV brasileiras começarem a pagar uma “remuneração compensatória” aos artistas e, assim, destravar a proposta.
Atualmente, os detentores de filmes antigos não pagam direitos autorais pela reprodução das obras em plataformas digitais. Os artistas pressionavam pela inclusão da compensação para contratos de obras antigas no projeto. As empresas rejeitavam o dispositivo e desejavam que os pagamentos fossem feitos apenas para novos contratos de filmes.
Em 2016, o ator Fabrício Silveira fechou um contrato com uma produtora para viver o cantor Simonal em um filme. A empresa vendeu a cinebiografia a uma plataforma de streaming, que não tem obrigação de pagar direitos autorais aos artistas que participaram do filme. Se o projeto for aprovado, os artistas passarão a receber pela veiculação na internet.
Depois de rodadas de negociação, as emissoras de TV chegaram a acenar com uma proposta para que os pagamentos começassem em 12 anos. Sem acordo, os artistas propuseram um prazo de três anos, que foi aceito. O período valerá apenas para as empresas brasileiras. As plataformas de streaming e as big techs não serão contempladas com o período de transição e terão de pagar de forma imediata.
Esta é a terceira tentativa de votar o PL 2370/2019 de autoria da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ). A proposta inclui ainda uma remuneração a ser paga pelas plataformas digitais a veículos da imprensa. Esse ponto não tem a concordância das big techs, mas entre deputados de vários partidos já não é visto como um problema. Em maio, a Câmara tentou votar o projeto em duas oportunidades. A previsão era de que os deputados analisassem o regime de urgência e o mérito nesta quarta-feira, 9.
“Nós acolhemos o argumento da radiodifusão na diferenciação com as plataformas internacionais e fizemos uma proposta de acordo, que, a princípio, eles toparam em relação a essa diferenciação e a uma transição para cumprir a lei”, disse Feghali. “Estamos esperando o texto escrito para que a gente possa votar na semana que vem.”
O Estadão apurou que se houvesse acordo entre artistas e empresas de comunicação até as 14h, o projeto iria a plenário hoje. Como o acordo saiu próximo às 18h, o projeto de lei deverá ser votado na semana que vem. O PL tem sinal verde na Câmara e enfrentava resistência das empresas de TV.
Durante as negociações, Arthur Lira e Elmar Nascimento se reuniram com representantes das empresas e com artistas separadamente, antes da reunião de todas as partes que selou o acordo nesta quarta. Na terça-feira, 8, os cantores Marisa Monte, Frejat e Xande de Pilares, a empresária Paula Lavigne e a atriz Dira Paes jantaram com os deputados e com o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes.
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Os dois temas centrais do projeto fatiado - direitos autorais e remuneração a veículos jornalísticos - eram tratados no PL 2630 das Fake News, relatado pelo deputado Orlando Silva (PCdoB-SP). Diante da resistência de boa parte dos deputados em votar a versão integral da proposta, Lira e aliados decidiram pelo “fatiamento” do PL das Fake News para analisar separadamente a remuneração a artistas e à imprensa.
Nesta quarta, uma reunião entre Jandira Feghali e Orlando Silva selou a inclusão de mais um tema no projeto fatiado. O PL 2370/2019 vai abrigar também o trecho da proposta sobre fake news que tratava sobre os deveres da publicidade digital, como, por exemplo, obrigar as plataformas a identificar os anunciantes e guardar um repositório com as publicidades e conteúdos impulsionados.
A urgência do PL 2630 foi aprovada em abril, mas a votação do mérito foi adiada após a pressão das big techs. O texto mais atualizado do projeto prevê a criação de mecanismos para identificação dos criadores de perfis em redes sociais pelas empresas de tecnologia, sem indicar qual seria o método ideal. A dificuldade de rastrear quem está por trás das páginas é um tema que incomoda deputados e pode facilitar a tramitação do PL das Fake News.
Como mostrou o Estadão, as empresas Google e a Meta - controladora do Facebook, Whatsapp e Instagram – lideraram uma operação de pressão e lobby para derrubar o PL das Fake News, da pauta do Congresso brasileiro. Durante 14 dias, as big techs atuaram fortemente para deputados se posicionarem contra a proposta, com ameaças de retirar conteúdo das redes sociais e disseminação de uma campanha de ataques às contas deles na internet.
Na época, a Meta disse que mantém contatos frequentes com parlamentares e integrantes do governo. Já o Google afirmou que defende o debate sobre medidas que possam combater a desinformação e argumentou que “o exercício das relações governamentais está baseado na liberdade de expressão e de associação”.
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