Entenda a disputa entre Jair Bolsonaro e Valdemar Costa Neto para as eleições municipais de 2024

Ex-presidente quer priorizar aliados nas eleições, enquanto presidente do PL pretende apostar no crescimento do partido pelo País, avaliam especialistas ouvidos pelo ‘Estadão’

PUBLICIDADE

Foto do author Gabriel de Sousa
Atualização:

BRASÍLIA – O elogio do presidente do Partido Liberal (PL), Valdemar Costa Neto, para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi apenas um dos atritos entre o dirigente partidário e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Os desentendimentos entre Valdemar e Bolsonaro são antigos e muitos deles giram em torno dos candidatos que devem representar o PL nas eleições municipais de outubro.

Valdemar Costa Neto ao lado de Jair Bolsonaro na filiação ao PL em 2021 Foto: Divulgação/PL

PUBLICIDADE

Movimentos recentes do partido indicam que Bolsonaro quer priorizar aliados próximos na corrida pelo comando das capitais e mostrar que ainda é forte politicamente, após se tornar inelegível até 2030 por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Valdemar, por sua vez, defende apostar em políticos com mais chances de vitória, com a meta de o PL eleger mais de mil prefeitos no País.

“Valdemar fica como um equilibrista em cima de uma corda. De um lado, pragmatismo e necessidade de ter candidatos viáveis visando um partido grande para ter mais recursos e poder de barganha e, de outro lado, tentando manter Bolsonaro próximo a fim de alcançar esse objetivo. (Bolsonaro) quer ter como candidatos figuras que divulguem e sejam defensores da visão dele”, afirmou o cientista político Alberto Carlos Almeida, diretor do instituto de pesquisa Brasilis.

Em maio do ano passado, a Coluna do Estadão mostrou que Bolsonaro baterá o martelo sobre os candidatos a prefeito em cidades estratégicas, onde bolsonaristas tiveram um bom desempenho em 2022. A carta branca do partido a Bolsonaro não se estende a locais onde políticos mais alinhados ao ex-chefe do Executivo não conseguiram ser eleitos.

Publicidade

No fim de novembro, Bolsonaro tornou pública a crise com o presidente do PL na escolha das pré-candidaturas municipais. No lançamento do PL+60, movimento da sigla destinado a incentivar o desenvolvimento de políticas públicas para idosos, o ex-presidente afirmou que precisa, às vezes, “engolir” os postulantes propostos por Valdemar.

“Na medida do possível, eu me coloco no lugar dele (Valdemar) e ele se coloca no meu lugar. Para podermos crescer, temos que abrir mão. Então, por vezes, eu engulo o candidato do Valdemar, depois ele engole um candidato meu”, afirmou Bolsonaro sobre a divergência entre os dois.

Para o cientista político Márcio Coimbra, presidente do Instituto Monitor da Democracia, as intenções políticas de Bolsonaro são evidentes desde que ele se filiou ao partido em 2021. Segundo o especialista, o ex-presidente não se vinculou à legenda por afinidade com o programa de Valdemar, e sim porque a sigla permitiu que ele e os seus aliados pudessem migrar e transformar a sigla na representação do bolsonarismo.

“Bolsonaro está no PL por conveniência. Não é um partido que represente algo e que, por isso, ele foi para lá. O partido se tornou um farol dessa direita bolsonarista porque o Bolsonaro foi para lá”, afirmou.

Publicidade

Bolsonaro tentou emplacar Ricardo Salles à Prefeitura

Os atritos entre Valdemar e Bolsonaro sobre os candidatos que o PL deve apoiar em outubro se tornaram mais evidentes na capital paulista. O ex-presidente tentou emplacar o nome do ex-ministro do Meio Ambiente, deputado federal Ricardo Salles (PL-SP), mas o dirigente partidário costurou aliança com o prefeito Ricardo Nunes (MDB), que vai tentar a reeleição.

Ao mesmo tempo em que Nunes e Valdemar fechavam o acordo para enfrentar o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP), pré-candidato à Prefeitura apoiado por Lula, Bolsonaro chegou a pedir publicamente “Salles prefeito” na saída de um evento do PL em Brasília. “São Paulo merece realmente um nome que vá fazer pelo município e não fazer por partido”, disse o ex-mandatário.

No último dia 4, o prefeito afirmou que Valdemar havia definido que o PL apoiaria a sua campanha à reeleição com o aval de Bolsonaro e que a possibilidade de uma candidatura do ex-ministro do Meio Ambiente pela sigla havia sido “descartada”.

“Ele (Valdemar) me confirmou que o assunto estava superado, martelo batido. Estaria caminhando junto com a gente e, portanto, a outra opção de candidatura estava descartada”, disse Ricardo Nunes.

Publicidade

Valdemar Costa Neto, Jair Bolsonaro e Ricardo Nunes Foto: Beto Barata/PL

Na cidade de São Paulo, Lula venceu o ex-presidente no segundo turno das eleições de 2022 por 3.677.921 votos (53,5% dos votos válidos) a 3.191.484 votos (46,5% dos votos válidos).

Valdemar foi acusado por bolsonaristas de tentar ‘destruir’ ex-presidente

Em Guarulhos, na região metropolitana de São Paulo, Valdemar foi alvo de críticas de apoiadores de Bolsonaro após declarar apoio à pré-candidatura de Lucas Sanches (PL), ex-membro do Movimento Brasil Livre (MBL), para o comando da cidade. Nas redes sociais, o presidente da legenda foi acusado por influenciadores de tentar “destruir” o ex-presidente e de promover “politicagem suja e mercenária”.

Os apoiadores do ex-chefe do Executivo começaram a compartilhar um vídeo de Sanches com a camiseta do MBL de Guarulhos, dizendo a frase “primeiramente, fora Bolsonaro”. O conteúdo segue com a declaração recente de apoio de Valdemar Costa Neto e a inscrição “mais um surfista”. A assessoria de comunicação do político afirmou ao Estadão que o material foi “editado de forma maldosa” para prejudicá-lo.

Sanches publicou um trecho maior do vídeo nas suas redes sociais, onde é possível entender que ele critica manifestações políticas de professores em sala de aula. No trecho, o pré-candidato afirma que não seria adequado um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) abrir uma sessão dizendo a frase contrária ao ex-presidente.

Publicidade

Flávio contestou anúncio de candidato do PL no Rio feito por Valdemar

No Rio, quem protagonizou o confronto com Valdemar foi o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente. No início de novembro, Valdemar afirmou que a candidatura do deputado federal e ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem (PL-RJ) para a disputa da prefeitura da capital carioca já estava consolidada. Por uma nota, Flávio contestou o dirigente partidário e disse que “o martelo não está batido” para a indicação do representante da sigla no pleito.

Quando negociava a sua entrada no PL em 2021, Bolsonaro pediu que Valdemar entregasse o diretório do Rio para Flávio, o que não foi aceito por Valdemar. Para conseguir a filiação do então presidente, que também era disputado pelo PP, do presidente da Câmara, Arthur Lira (AL), o dirigente partidário concedeu ao senador o poder de decidir filiações e apoios eleitorais no Estado com o deputado Altineu Côrtes, que comanda o núcleo fluminense da legenda.

Em Goiânia, Bolsonaro prefere candidato derrotado em 2022

Outra discordância entre os dois gira em torno da Prefeitura de Goiânia. O ex-presidente deseja que o candidato da legenda seja o ex-deputado federal Major Vitor Hugo, que foi líder do governo na Câmara entre 2019 e 2020. Por outro lado, Valdemar prefere indicar o deputado federal Gustavo Gayer.

Apadrinhado por Bolsonaro, Vitor Hugo foi o candidato do PL ao governo de Goiás em 2022. Na capital goiana, foi o terceiro mais votado, com 117.222 votos (15,4% dos votos válidos), ficando atrás do ex-prefeito de Aparecida de Goiânia Gustavo Mendanha, então no Patriota, e do governador reeleito Ronaldo Caiado (União). Na apuração em todo o Estado, o ex-deputado também ficou em terceiro, perdendo para os dois concorrentes.

Publicidade

Gustavo Gayer, por sua vez, foi o segundo deputado federal mais votado na cidade, com 83.604 votos (11,18% dos votos válidos). A parlamentar com melhor desempenho na capital goiana foi Silvye Alves (União), com 117.297 votos (15,69% dos votos válidos).