Especialistas apontam que cadeirada em Marçal não deve gerar cassação de candidatura de Datena

Advogados afirmam que legislação eleitoral não prevê exclusão do pleito diante de agressões e caso deve ser resolvido apenas na esfera criminal

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Especialistas em direito eleitoral ouvidos pelo Estadão nesta segunda-feira, 16, apontam que dificilmente José Luiz Datena (PSDB) terá a candidatura cassada pela Justiça por ter dado uma cadeirada no adversário Pablo Marçal (PRTB) durante debate entre postulantes à Prefeitura de São Paulo. O caso, de acordo com eles, deve ficar na esfera criminal e o tucano poderá responder por lesão corporal.

Alexandre Rollo, mestre e doutor em direito das relações sociais pela PUC-SP, disse que as hipóteses para cassação estão previstas em lei, o que não envolve agressão. “São questões como compra de votos, abuso dos poderes político, econômico e dos meios de comunicação social, uso da máquina administrativa, entre outras. Mas agressão em debate eleitoral não figura entre elas”, disse Rollo, que também é professor de pós-graduação em direito eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP). O especialista afirmou também que o candidato poderá responder pelo ato na esfera criminal.

Datena acerta cadeirada em Marçal durante debate para Prefeitura de São Paulo  Foto: REPRODUCAO TV CULTURA

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Na manhã desta segunda, ao deixar o Hospital Sírio-libanês, Marçal afirmou que pedirá a cassação de Datena depois de ser agredido no debate da TV Cultura, na noite de domingo, 15. Ele afirmou ainda se tratar de caso de “tentativa de homicídio”. No entanto, o boletim de ocorrência foi registrado como lesão corporal e injúria real. O B.O está no 78.º Distrito Policial (Jardins). Datena diz que não se arrepende e que faria o mesmo novamente.

A defesa de Datena afirmou, por meio de nota, que o tucano continuará sendo candidato, apesar do pedido de cassação prometido por Marçal. “Na legislação eleitoral não há previsão de cassação por agressão física”, disse Guilherme Ruiz, advogado do PSDB de São Paulo.

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Rubens Beçak, professor de graduação e pós-graduação da Universidade de São Paulo (USP), também avalia ser difícil um trâmite para culminar com a cassação da candidatura de Datena. “Direito e as decisões do direito são texto e contexto. Então, na verdade, eu não vejo de um ponto de vista formal, literal, a cassação por via fácil pedida pelo candidato Marçal ao candidato Datena pela agressão. Na verdade, não existe sequer uma apuração, que eu saiba, judicial ainda, um inquérito. Teria que ter um inquérito finalizado e talvez uma ação penal proposta, depois de ouvir o Ministério Público, daí sim. Mas, como é uma coisa muito recente e foi uma agressão violenta, algo realmente inadmissível, não vejo a literalidade”, afirmou Beçak.

O especialista diz, no entanto, que se a Justiça Eleitoral eventualmente decidir pela cassação, poderá ser a abertura de um precedente. “Mas, de um ponto de vista, e aí sim, a questão do contexto, eu acho que o comportamento dos dois, mas sobretudo do candidato da Datena, porque além da violência verbal, a violência física é um atentado, é inadmissível alguém fazer isso, ainda mais um candidato a prefeito. (Neste caso) eu acho que existe uma possibilidade, sim, da Justiça Eleitoral eventualmente vir a cassar a candidatura dele abrindo este precedente”, concluiu.

Marçal deixou hospital usando uma tipoia no braço e uma tala ortopédica em um dedo da mão direita Foto: Hugo Henud/Estadão

Professora de direito eleitoral e coordenadora acadêmica da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), Anna Paula Mendes também não vê possibilidade de cassação. “A Justiça prevê as hipóteses de cassação, como abuso de poder econômico, abuso de poder político, fraude e corrupção. Não há nenhuma hipótese em que o comportamento possa ensejar uma cassação”, afirmou.

Volgane Carvalho, coordenador acadêmico da Abradep, também destaca que a violência contra adversários é julgada na Justiça comum. “Só tem um crime eleitoral que prevê violência, que é usar violência ou grave ameaça para forçar um eleitor a votar ou não votar em alguém. Todas as outras coisas vão ser tratadas como crime comum”

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Ele ressalta, contudo, que o juiz eleitoral pode considerar que a cadeirada teve conexão com outra transgressão, como crimes contra a honra (injúria, calúnia e difamação). “A gente poderia, no limite, considerar que foi um crime contra a honra eleitoral e a violência foi conexa, então poderia ser julgado pela Justiça Eleitoral”, afirmou. Mas há outro obstáculo: a legislação associa os crimes contra a honra à propaganda eleitoral, e não a comportamentos em debates, onde há direito de resposta.

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