Não é verdade que uma imagem publicada nas redes mostre congestionamento de centenas de navios impossibilitados de embarcar e desembarcar na costa brasileira devido a bloqueios bolsonaristas em estradas. Publicações nas mídias sociais têm feito interpretação enganosa da ferramenta Marine Traffic, que fornece informações em tempo real sobre a localização de embarcações marítimas. Um vídeo que mostra centenas de navios supostamente parados teve, até o dia 30 de novembro, 6,6 mil curtidas e 93 mil visualizações no Facebook.
O conteúdo é enganoso porque a imagem usada na publicação não mostra navios parados. Pelo contrário, ela indica diferentes tipos de embarcação em deslocamento pelo oceano Atlântico, sem qualquer anormalidade no tráfego marítimo, como mostrou checagem recente do Estadão Verifica.
"Navios vazios tentando carregar (pontinhos verdes da imagem) já se acumulam mundo à fora", alega o autor do vídeo alvo desta checagem, ao exibir uma captura de tela do Marine Traffic, do dia 22 de novembro. A afirmação está equivocada, de acordo com as instruções da própria plataforma.
A imagem abaixo é uma reprodução da tela do Mariene Traffic, capturada no dia 30 de novembro, próximo das 8h30 (horário de Brasília). Cada ícone corresponde a uma embarcação. Ao analisar o mapa, dois aspectos importantes a serem considerados são a cor e o formato do ícone.
A cor indica o tipo de embarcação O verde representa navios de carga e o vermelho os petroleiros. Ícones azuis são as embarcações de passageiros, como os Cruzeiros, e os roxos são os barcos de recreação e os usados para passeios turísticos. É possível conferir a legenda completa na plataforma do Marine Traffic, clicando em "Vessel Filters", no menu lateral esquerdo, e na opção "Ship Type". Abaixo está uma reprodução, capturada também na manhã do dia 30 de novembro, mas filtrando apenas os navios de carga:
O segundo aspecto a se observar nos mapas é o formato dos ícones. A maioria deles se assemelha a uma seta: isso indica que as embarcações estão em deslocamento. Mas há também ícones de formato redondo, que representam as embarcações paradas. Nas duas imagens anteriores, quase não se notam os ícones redondos. A imagem a seguir mostra que na tarde do dia 30 de novembro havia tanto embarcações paradas quanto em deslocamento nas redondezas do porto de Santos (SP).
O supervisor portuário Robson Andrade, que trabalhou 20 anos com operações nos portos de Recife e Suape, confirma que o autor do vídeo alvo desta checagem fez uma interpretação equivocada dos recursos do Marine Traffic. Ao longo de sua trajetória profissional, ele se recorda de apenas um episódio em que houve congestionamento de embarcações, decorrente de uma ação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), de prevenção a uma epidemia.
"Foi em 2002, em todos os navios vindo do exterior, a Anvisa fazia a visita com o navio fundeado e só após a liberação que o navio poderia atracar. Além disso, era exigido um tapete na escada do navio com produtos químicos para poder subir a bordo, isso causou um congestionamento em todos os portos brasileiros", relembra Andrade.
O Estadão Verifica procurou o autor da postagem, mas ele não respondeu até a publicação.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.