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‘Estava na mesa quando senti a mão dele’, diz professora que acusa Silvio Almeida de assédio em 2019

Pedagoga havia assistido a um curso de Almeida quando foram almoçar e se revoltou ao ver a reação do ex-ministro em relação às acusações de assédio feitas por outras mulheres; procurado, Silvio Almeida não comentou

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Foto do author Marcelo Godoy
Atualização:
Foto: Reprodução/Instagram via @professoraisabelrodrigues
Entrevista comIsabel Rodriguesprofessora

Quando surgiu a primeira notícia de que o movimento Me Too Brasil estava acusando de assédio contra mulheres o então ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, a professora Isabel Rodrigues resolveu contar o que sabia e guardava havia cinco anos sobre o comportamento do amigo. Antes, avisou a professora Maria Victoria Benevides, diretora da Escola de Governo da USP. “Professora, é tudo verdade. Aconteceu comigo.” Depois, ao ver a reação do agora ex-ministro, acusando o Me Too Brasil, resolveu tornar público o que lhe aconteceu.

Militante da igualdade entre homens e mulheres, Isabel foi filiada ao PT. Agora, está no PSB e é candidata a vereadora em Santo André, na Grande São Paulo. O ministro tem negado acusações de assédio e, procurado por meio da Pasta, primeiro para se manifestar sobre o vídeo publicado nas redes, mais cedo, e novamente para falar sobre a entrevista, não se posicionou até a publicação dessa entrevista.

Aqui o relato de Isabel Rodrigues ao Estadão sobre a acusação contra o ministro:

O vídeo que a senhora postou nas redes sociais tem um tom de desabafo. É correta a impressão?

O motivo pelo qual eu fiz essa declaração pública foi pela Justiça e pela verdade. Incomodou-me muito ver o Silvio dizer que essas mulheres são mentirosas e fazem parte de um grupo que é contra ele. Eu não posso somar a essa mentira, não tenho motivo por que me calar. A partir do momento que isso veio à tona, eu tenho obrigação como professora, como defensora dos direitos humanos e como mulher a me pronunciar publicamente.

Há quanto tempo essa violência aconteceu?

Em 3 agosto de 2019, Silvio, em parceria com outro professor, o Julio Cesar, eles deram um curso sobre (o filósofo) Achille Mbembe, sobre necropolítica. Como eu sempre fui uma professora antirracista e tinha interesse em conhecer mais o Achille Mbembe eu perguntei ao Silvio, porque éramos amigos, se eu poderia assistir à aula como aluna ouvinte. E ele concordou. ‘É só você chegar lá e dar o seu nome, pois eu vou deixa seu nome’. Eu falei que só ia poder participar do curso na parte da manhã. Como era um curso o dia inteiro, tinha um intervalo para o almoço. E como tinha umas pessoas amigas do Silvio e do Júlio Cesar fomos todos almoçar. No almoço – já havíamos terminado e esperávamos a sobremesa – ele colocou a mão, pressionou as minhas partes íntimas, que eu estava de saia. Eu senti a mão dele, estava próxima, ele subiu a saia e a minha situação foi de extremo estarrecimento. Eu tentei negar para mim mesma o que estava acontecendo. Na hora o que eu consegui foi tirar a mão dele, disfarçando muito e morrendo de medo e de vergonha de as pessoas perceberem a situação.

Meu primeiro sentimento foi de muita vergonha, de muita vergonha. E foram vários outros sentimentos que perpassam até hoje: revolta, raiva, ódio, tristeza. E eu conversei com ele, mas não foi no mesmo dia. Eu não fiz nada no dia. No dia eu neguei. Eu neguei durante um tempo. Eu liguei para o Silvio, mandei uma mensagem depois que eu fui entendendo o que era aquilo, a necessidade de minimamente conversar com o agressor para que ele saiba. Em uma posição de educadora, como se ele não soubesse em razão do mundo opressor e machista que a gente vive. Eu liguei e disse: ‘Silvio eu quero falar com você sobre aquele almoço, sobre o curso que você deu e quero lhe dizer que o que você fez foi violência sexual’. (Ele respondeu:) ‘Não, jamais, isso não aconteceu”.

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Ele ficou negando?

A princípio ele negou com o pressuposto de que éramos amigos há muito tempo e que isso não havia acontecido. Eu fiz duas perguntas: se eu havia consentido e se eu havia falado sim. ‘Eu consenti que você invadisse meu corpo? Você colocou sua mão nas minhas partes íntimas. Silvio, eu consenti, eu disse sim?’ Eu encurralei ele e não teve jeito. E ele disse então que sentia muito, que tinha magoado uma amiga querida. Ele disse que estava com viagem marcada, mas ia desmarcar o voo para ter uma sessão com a terapeuta, que ele ia ver se ela podia atendê-lo.

A história do ministro envolve atuação em causas importantes, no movimento negro e no combate ao racismo. A senhora dissocia a história e as causas dele desse comportamento pessoal?

É inadmissível o comportamento dele. É criminoso, violento, tem nome. Eu não posso negar que é um ministro muito inteligente, mas ele deixou as suas tentações estarem à frente do respeito ao outro, enfim, os seus desejos carnais estarem à frente de muita coisa necessária. É uma pena. Pois é importante para o País ter um ministro negro. É uma pena, faltou inteligência, pois acredito que uma pessoa que respeita o outro é inteligente, é uma inteligência que o Silvio não conseguiu bancar: a inteligência de respeitar o corpo do outro.

A senhora procurou acolhimento após esse episódio de violência. A senhora conseguiu dividir com alguém. Como a senhora conseguiu conviver com a lembrança além de ir procurar o agressor?

Eu falei com amigos, eu falei com a família e levei para as sessões de terapia. Foi bastante tratado. Procuro tratar das minhas questões na psicanálise, busquei ajuda e tive solidariedade das pessoas e estou tendo.

A senhora tem militância em Santo André?

Sou ativista pela igualdade entre homens e mulheres, sou antirracista, sou professora de políticas pública, sou doutora em políticas públicas pela USP, sou doutora em Educação pela USP. Eu escrevi para a Maria Victoria Benevides pra dizer que é verdade, ‘professora é verdade, aconteceu comigo’.

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