Praticamente todas as publicações feitas desde sexta-feira, 11, pelo atual prefeito Ricardo Nunes (MDB) e pelo deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), que disputam o segundo turno das eleições 2024, têm como tema as consequências da forte chuva que atingiu a Grande São Paulo na noite daquele dia, impactando mais de 2,1 milhões de imóveis e causando sete mortes – uma delas na capital. Enquanto o prefeito falou do assunto em 25 das 26 postagens em seu perfil no Instagram, o deputado trouxe o tema em 33 das 39 publicações.
No caso de Boulos, o número corresponde a quase 85% do conteúdo publicado por ele na rede social nos últimos dias. Na maioria das publicações, com exceção de duas, o deputado federal atribui nominalmente a culpa a Nunes ou à Prefeitura, afirmando que a cidade está “abandonada” e que a responsabilidade pela poda das árvores – que caíram atingindo rede elétrica, carros e imóveis – é da administração atual.
Já o prefeito cita as consequências das chuvas em 96% do conteúdo compartilhado por ele no mesmo período. Enquanto o prefeito é o alvo de Boulos sobre a responsabilidade dos danos, Nunes, que aparece nos vídeos usando um colete da Guarda Civil, culpa a concessionária de distribuição de energia Enel, a quem chama de “inimiga de São Paulo”.
Apesar de não fazer nenhum ataque a Boulos, em quatro publicações Nunes cita nominalmente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), padrinho político do adversário, ou o governo federal, responsável pela concessão da Enel, afirmando que o petista ou membros do governo querem que o acordo com a empresa seja renovado.
Em junho deste ano, Lula afirmou que o Brasil tem interesse em renovar o acordo com a Enel desde que a companhia assuma o compromisso de investir no País. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse na semana seguinte à declaração do presidente que não afirmava “que a Enel terá condições (para renovação)”, e que empresa teria “que se enquadrar”.
Em entrevista nesta segunda-feira, 14, Silveira disse que “o prefeito de SP aprendeu rápido com Pablo Marçal a fazer fake news”, afirmando que são falsas as informações publicadas por Nunes sobre o processo de renovação do contrato de concessão.
Nos comentários, internautas acusam o prefeito de estar “terceirizando” a culpa e cobram por soluções em vez de “jogos políticos”.
Como mostrou o Estadão, tanto Boulos quanto Nunes alteraram seus compromissos de campanha no final de semana. O candidato do PSOL visitou regiões afetadas pela falta de luz, enquanto o prefeito passou a manhã de sábado, 12, na central de monitoramento do programa Smart Sampa, de onde a crise é gerenciada, e à tarde foi às ruas para acompanhar o trabalho da Enel e dos funcionários da Prefeitura na retirada das árvores caídas e recuperação da rede elétrica da cidade.
Boulos, morador do Campo Limpo, na zona sul paulistana, também mostrou nas gravações que teve o fornecimento de eletricidade da própria casa interrompido por quase 48 horas, e que domingo a noite à iluminação pública da rua ainda estava cortada.
Em diversos vídeos, o deputado anda pelas ruas da cidade mostrando árvores caídas e fala com a população, que relata não ter recebido assessoria da Prefeitura até então. Em uma das publicações, Boulos chega a ligar para o SP156, canal da Prefeitura, solicitando o serviço de remoção de uma árvore, mas o atendente diz que estão “inoperantes” e não podem fazer nada no momento. “Esse é o resultado de uma cidade sem prefeito”, diz o candidato do PSOL, finalizando a gravação. Em 14 publicações, o rosto, nome ou cargo do prefeito ilustram a capa da postagem.
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Já nas postagens de Nunes, o nome da companhia, declarada “inimiga” da cidade, aparece 11 vezes no perfil dele. O prefeito reforça, em entrevistas coletivas e compartilhando reportagens jornalísticas, a responsabilidade da empresa, que, segundo ele, “mais uma vez traz problemas para a cidade”, afirmando que a Prefeitura não pôde fazer a remoção de árvores caídas até que a companhia desligasse a fiação atingida.
“Estamos cansados desses problemas em São Paulo causados pela falta de energia fornecida pela Enel, que tem prestado um desserviço à cidade. Minha luta contra a ineficiência da Enel é antiga, mas a fiscalização e concessão são responsabilidade do governo federal, não da Prefeitura. Mas não vamos deixar pra lá”, escreveu Nunes, em postagem com um vídeo em que explica “a verdade” sobre a relação dele com a companhia.
Além de dominar as publicações nas redes sociais dos dois candidatos, o assunto deve marcar o primeiro debate do segundo turno, que ocorre às 22h45 desta segunda, 14. Organizado pela TV Band, este será o primeiro confronto da dupla, já que Nunes faltou ao primeiro debate, que se transformou em uma sabatina com Boulos.
Até o fim da manhã desta segunda, 530 mil imóveis permaneciam sem energia elétrica na cidade de São Paulo e na região metropolitana. A Enel alega que está investindo cerca de R$ 6,2 bilhões em São Paulo de 2024 a 2026. “Dentro do plano de investimento estão: fortalecimento e modernização das redes, automação dos sistemas, ampliação da capacidade dos canais de comunicação com os clientes e a contratação de funcionários próprios para atuar em campo”, diz a empresa, em nota. A Enel afirma também que em São Paulo estão sendo contratados um total de 1,2 mil eletricistas próprios até março de 2025.
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