BRASÍLIA - O governo dos Estados Unidos capitaneou uma campanha silenciosa junto a líderes políticos e militares brasileiros para frear a tentativa de um golpe de Estado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A missão envolveu membros da CIA, do Departamento de Estado, do Pentágono, da Casa Branca e das Forças Armadas norte-americanas, segundo reportagem publicada nesta quarta-feira, 21, pelo jornal britânico Financial Times.
Na prática, tratou-se de uma campanha de mensagens “bastante incomum”, segundo descreveu um ex-integrante da alta cúpula do Departamento de Estado ao jornal. A ação foi endossada por pessoas próximas a Bolsonaro, como o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o então ministro da Infraestrutura e atual governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), e o então vice-presidente e atual senador, Hamilton Mourão (Republicanos-RS).
De acordo com a publicação, os esforços começaram a partir da visita ao Brasil de Jake Sullivan, conselheiro de segurança nacional do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, em agosto de 2021. A autoridade ouviu do então presidente Jair Bolsonaro contestações de fraudes às eleições norte-americanas de 2020, em que Donald Trump saiu derrotado. A missão ganhou força após a reunião de Bolsonaro com embaixadores, em julho de 2022, vésperas do pleito eleitoral no País. Na ocasião, o presidente voltou a desacreditar as urnas eletrônicas aos diplomatas e reiterou a necessidade de eleições “limpas” e “transparentes”.
Em nota após o encontro com os embaixadores, que hoje está na mira do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), os EUA afirmaram estar confiante que o sistema eleitoral brasileiro vai refletir a vontade do povo. “As eleições brasileiras servem como modelo para as nações do hemisfério e do mundo”, disseram.
Outros reforços foram feitos, de acordo com o Financial Times, pelo secretário de defesa Lloyd Austin, que disse em visita ao Brasil que as forças militares e de segurança precisam estar sob “forte controle civil”; pelo chefe da CIA, William Burns, que disse ao governo Bolsonaro para não mexer com as eleições; e pelo general Laura Richardson, chefe do Comando Sul dos EUA.
Havia muita preocupação, por exemplo, com o então comandante da Marinha, o almirante Almir Garnier Santos, um dos militares mais aliados a Bolsonaro. Os Estados Unidos ameaçaram romper todos os acordos militares com o Brasil caso as Forças Armadas embarcassem na tentativa de golpe.
Com o resultado das eleições favorável ao presidente Lula, o silêncio de Bolsonaro e a sua viagem aos Estados Unidos, no fim de dezembro, os ânimos se arrefeceram. Em 8 de janeiro, quando apoiadores bolsonaristas invadiram a Praça dos Três Poderes e depredaram prédios públicos clamando por um golpe de Estado, foi dada a última cartada: o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, ligou para Lula e, em seguida, intermediou uma nota conjunta com o México e o Canadá a favor do Brasil.
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