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Disputas de poder e o debate político-cultural brasileiro

Opinião | A cadeirada de Datena em Marçal joga a política como entretenimento em um impasse

Até mesmo a agressão que sofreu, após uma sequência de provocações, candidato do PRTB tenta transformar em um episódio de Big Brother

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Foto do author Fabiano Lana

Um prefeito de uma cidade é uma espécie de zelador geral do município. Precisa ser eficiente em questões como creches, asfaltamento, recolhimento do lixo, procedimentos simples de saúde da população, moradias, limpeza das ruas e praças, além da mobilidade urbana. Em um mundo ideal seriam temas como esses que deveriam ser tratados pelos candidatos em uma disputa eleitoral. Mas os novos tempos de redes e memes ofuscaram o que deveria ser o essencial.

José Luiz Datena (PSDB) agrediu Pablo Marçal (PRTB) durante um debate com os candidatos à Prefeitura de Sao Paulo, neste domingo Foto: Reprodução/TV Cultura

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Vieram à tona questões como engajamento, número de seguidores, quantidade de curtidas, figurinhas, grupos de Telegram, cliques nas reportagens, correntes de WhatsApp, cortes na rede. E a culpa não é apenas dos famigerados algoritmos, mas de qualquer pessoa ou profissional que está no processo. Sem a demanda não haveria a oferta. O candidato que navega melhor nesse meio passou a se sobressair em determinado momento – não só em São Paulo, mas em diversos municípios do Brasil.

Nesse sentido, de ter se tornado um entretenimento virtual a ser observado por meio dos celulares, que a cadeirada do ex-apresentador de TV, agora tucano, José Luiz Datena, no autodenominado ex-coach e agora chief visionary officcer (CVF), Pablo Marçal, passou a ser um desdobramento quase natural de uma situação que já estava se revelando despropositada em relação aos interesses reais de uma cidade: o entretenimento pelo entretenimento. As cenas são fantásticas, irão rodar o mundo, nós brasileiros agora alcançamos o estado de excelência da política como divertimento – mesmo com alguma tintura dramática.

Política que sempre foi espaço de jogos, de festas, de celebração. Em milhares de cidades brasileiras se acompanha a contenda entre os candidatos como se fosse uma novela, porém que cada um tem o direito de participar no voto. Torna-se paixão, com bandeiradas, carreatas, caminhadas, militantes pagos e espontâneos, suspeitas de compra de voto. Há também as acusações, as defesas, os debates, os choros em público. Disputa-se uma máquina governamental que gera empregos, benefícios, privilégios, poder, status local.

Logo, política sempre terá algo de performance, intrinsecamente. O episódio que ocorreu em São Paulo, entretanto, é como se a disputa tivesse se tornado apenas espetáculo. Como se zombar um dos outros fosse o grande interesse da maior cidade do continente. Nesse ambiente, por consequência, se destacou, pelo menos por um momento, a encenação executada por Pablo Marçal. O “chief visionary oficcer”, com suas promessas mirabolantes, muitas vezes parece ser um holograma incapaz de ter uma vida fora das câmeras e dos cortes. Ele existe mesmo de carne e osso, sem o filtro de uma tela de celular?

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Até mesmo a agressão que sofreu, após uma sequência de provocações, Marçal tenta transformar em um episódio de Big Brother. Agora tentará capitalizar o papel de herói e vítima. Se vai dar certo, ainda iremos saber (e se der, podem esperar que episódios semelhantes podem ocorrer pelo Brasil afora nos próximos anos). Mas muitas vezes tudo aparenta ser apenas uma farsa, uma ficção distópica, sem qualquer base real. Alguém pode averiguar se são atores num palco que seguiram um script? Ou perderam o controle e em Datena aflorou uma pessoal real em fúria?

Mas qual seria o próximo passo dessa escalada da busca por holofotes? Um tiro? Um assassinato, pancadaria generalizada? O que precisa ocorrer para que os memes, vídeos, sticks e tantos outros produtos cibernéticos que de fato garantem a nossa diversão genuína possam continuar a espalhar dopamina por nosso corpo?

A questão é que existe um dia seguinte para cuidar além da necessidade de se fazer campanha com a lógica inescapável das redes sociais. Os engarrafamentos, as filas nas unidades básicas de saúde, os buracos nas ruas, a necessidade de formação das crianças, tudo continua. A exigência de trabalho para conseguir lidar com essas questões é monumental. São desafios que ainda não sabemos como resolver apenas por danças de TikTok ou cortes na internet.

Opinião por Fabiano Lana

Fabiano Lana é formado em Comunicação Social pela UFMG e em Filosofia pela UnB, onde também tem mestrado na área. Foi repórter do Jornal do Brasil, entre outros veículos. Atua como consultor de comunicação. É autor do livro “Riobaldo agarra sua morte”, em que discute interseções entre jornalismo, política e ética.

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