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Disputas de poder e o debate político-cultural brasileiro

Opinião|A única saída para Lula recuperar a popularidade é reconquistar o centro

Em um momento histórico de posicionamentos políticos cristalizados em todo o Brasil, só resta ao governo buscar seduzir novamente os eleitores moderados.

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Foto do author Fabiano Lana
Atualização:

Saiu mais uma pesquisa de opinião com resultados não tão favoráveis ao governo. Segundo os números divulgados pela Quaest, chega a 55% o percentual de eleitores que não considera o presidente Luiz Inácio Lula da Silva merecedor de um novo mandato nas eleições de 2026. De acordo com o levantamento, se as eleições fossem hoje Lula ainda venceria qualquer oponente, porém todos com grau de conhecimento mais baixo, o que é um risco em potencial para o candidato da máquina. Com números da economia, do desemprego, dos investimentos, até que não tão ruins, essas sondagens de opinião têm surpreendido os petistas que sonhavam com melhores índices. Ficam desapontados. Em breve serão eles que passarão a condenar as pesquisas como fraudulentas, a conferir.

Houve até uma certa ilusão de que as ações de Lula frente à tragédia no Rio Grande do Sul seriam o suficiente para “unir o país” e deixar os opositores, principalmente os mais da extrema-direita, na berlinda. Não foi o que ocorreu. A oposição ao petismo segue com força para tornar qualquer candidato do “sou contra tudo isso que está aí”, em 2026, minimamente competitivo.

Pesquisa Quaest mostrou que a maioria dos brasileiros, hoje, acha que Lula não merece um novo mandato em 2026 Foto: WILTON JUNIOR/ ESTADÃO

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Ocorre que parece existir no Brasil tal cristalização de posicionamentos que um grande contingente de eleitores se insufla contra Lula independentemente de eventuais êxitos de seu governo. Sim, a economia ainda é um fator de avaliação fortíssimo, mas a disputa agora inclui guerras culturais e por valores de maneira cada vez mais determinante – assim como nos EUA e Europa. Para muita gente, Lula e o PT são inimigos não importa mais o que façam. Assim como ocorre com quem rejeita o bolsonarismo, associado a todo mal na Terra. Nesse contexto dado, até mesmo os instrumentos tradicionais de comunicação possuem pouca força. Não se acredita mais no que é transmitido ou dito nas redes de televisão. Quando não se concorda só se vê torcida ou mesmo opinião comprada.

O caso das chuvas do Rio Grande do Sul é um exemplo. Óbvio, há fake news para todos os lados, alguma ignóbeis. Mas há algo muito mais profundo. Uma mensagem contra o Estado como um todo por parte do antipetismo militante. No sentido de que o esforço que ocorreu para minimizar as consequências das enchente partisse dos cidadãos, não dos entes públicos. O governo só teria atrapalhado. Houve até mesmo, divulgados nas redes sociais, vídeos contra qualquer tipo de ajuda financeira seja ao governo federal, seja ao governo estadual. “Já pagamos impostos o suficiente”, clamam.

Os chamados bolsonaristas estão bastante empenhados em minimizar e mesmo desprezar qualquer esforço dos governos nesta crise. E não é pouca gente nesse trabalho ideológico que tenta reduzir a vida econômica das pessoas da seguinte maneira: seus sucessos são méritos seus e os fracassos são culpa do governo (detalhe de que o Exército tem sido bastante atacado por essa turma. Será que é devido ao fato de os seus principais generais não terem sido parceiros na tentativa de golpe de Estado? Mas isso é apenas uma especulação vã).

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Para quem ainda acredita nas pesquisas, o governo Lula conta hoje com simpatizantes principalmente nas classes com renda em até dois salários mínimos e, principalmente, na região Nordeste – os que mais precisam do Estado. Entre quem recebe entre mais de cinco salários mínimos a taxa dos que consideram que Lula não deve ser reeleito chega a 66%, segundo a Quaest. Há um corte regional e de classes bastante consolidado e o calcanhar de Aquiles do governo hoje é na classe C, com seus enormes contingentes que não vislumbram qualquer entrega do Estado nas áreas que mais o afetam, como segurança ou mobilidade urbana.

Indo além de classes, o atual governo conta com o apoio de sempre de movimentos sociais, nas universidades (os cursos de humanas estão sempre ali para formar os militantes de esquerda num sessentismo tardio com direito a chegar à escola ou frequentar caríssimos festivais de música pop com carro do ano e boné do MST) e dentro dos meios de comunicação. Do outro lado do muro estão o pessoal do agro, os evangélicos, as forças policiais, os nostálgicos da ditadura. É lógico que a questão não é tão preto no branco, mas a tendência não foge tanto desse panorama geral.

Então, com tais enraizamentos políticos, sobra muito pouca margem para o governo. O mundo mudou, o país mudou e provavelmente nunca mais Lula terá índices de popularidade próximos aos do fim de 2010, quando alcançava índices superiores a 80% de popularidade.

Resta pouca gente a trabalhar. Resta aquela minoria de centro desprezada por ambos os lados do espectro ideológico no grau inverso da distância temporal das eleições. Gente que se arrepia com as declarações de Lula favoráveis à Rússia ou à Venezuela e se horroriza com as frases estudantis da presidente do Partido dos Trabalhadores no “X”. Que dá valor para algo quase metafísico para a maioria como “equilíbrio das contas públicas”, mas ao mesmo tempo considera que sim, que o Estado possui um papel social e deve gastar parte substancial do orçamento com quem mais precisa. É gente que, cansada, está fora do burburinho das redes sociais. Fogem da histeria, do populismo à direita ou à esquerda, e dos discursos que preferem apontar inimigos a propor soluções. Mas, se não tiverem candidato viável, farão a diferença novamente em 2026, assim como fizeram em 2018 ou 2022. O grupo político que menos exasperar esses poucos centristas irá vencer as eleições.

Opinião por Fabiano Lana

Fabiano Lana é formado em Comunicação Social pela UFMG e em Filosofia pela UnB, onde também tem mestrado na área. Foi repórter do Jornal do Brasil, entre outros veículos. Atua como consultor de comunicação. É autor do livro “Riobaldo agarra sua morte”, em que discute interseções entre jornalismo, política e ética.

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