Há dois movimentos que jogam nos lados opostos da luta política brasileira que queriam o atual ministro da Justiça Flávio Dino longe de uma cadeira do Supremo Tribunal Federal (STF). Um deles são os bolsonaristas. Provocativo e irônico, Dino, principalmente após os atos do vandalismo de 8 de janeiro, tornou-se um inimigo figadal dos radicais da direita brasileira. Por outro lado, por ser homem, inegavelmente de uma elite e rico, Dino destrói as ilusões alimentadas na campanha de que teríamos um governo inclusivo do ponto de vista de gênero, raça e outras questões fundamentais para certos grupos de ativistas.
No delírio bolsonarista mais pleno, o Ministério da Justiça de Dino seria teria até mesmo participação cúmplice nos atos de janeiro. A Pasta teria conseguido a informação de que o movimento ocorreria e ficou parada, à espreita, para que a destruição ocorresse e o bolsonarismo ficasse de vez desmoralizado. Dino seria um ser ignóbil, maquiavélico, a tramar contra senhoras inocentes que, desesperadas, entraram nas sedes dos Poderes e nada fizeram além de ver infiltrados queimando os plenários. Hoje é um dia ruim para ser bolsonarista no Brasil. O inimigo venceu.
Do outro lado, temos a luta centenária por mais direitos das mulheres, dos pretos, da causa LGBTQIA+, que para muito militante de Lula 2022 era um ideal que justificava não só a chegada do atual presidente, mas a expulsão definitiva do “genocida” Bolsonaro do poder.
A luta identitária, muitas vezes, não convive bem com muitos tons pardos ou tons de cinza. Ou se está com eles, ou se apoia causas colonialistas, machistas, homofóbicas. São ativistas que não aceitam mais que alguém seja apenas não-racista, é preciso lutar contra o racismo. Ou é cúmplice. Dino não é negro, não é mulher, não é da causa.
Nesse sentido, o governo Lula já tem uma coleção de decepções a entregar nas demissões da ex-ministra do Esporte, Ana Moser, e da ex-presidente da Caixa Econômica Federal, Rita Serrano, para deixar os cargos a homens brancos, ricos e do centrão.
O presidente Lula, no entanto, tem outros critérios para nomear Dino. Um deles, claro, é formar uma tropa de choque no STF para defendê-lo no que for necessário, inclusive em causas pessoais. Ex-juiz, Dino parece ter conhecimento jurídico sólido, mas esse não tem sido o critério para nomear ninguém ao Supremo desde há alguns anos. O que se quer é fidelidade. Se possível, canina.
Como bolsonaristas e ativistas de esquerda têm como prática política ir às ruas para defender pautas e protestar contra o que for errado, que no dia da posse de Dino coloquem uma grade entre eles para evitar novas hostilizações – entre si e contra o futuro ministro.
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