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Disputas de poder e o debate político-cultural brasileiro

Opinião | Que tal prendermos todos os operadores do mercado? Confira se seu nome está na lista

Tem sido difícil para um petista padrão entender que a desconfiança do chamado mercado e a subida a cotação do dólar tem mais a ver com a desconfiança em relação a um grupo ora no poder que parece não dar devido valor às contas equilibradas

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Alguns dos chamados filósofos do liberalismo, numa extensa lista que reúne gente do porte de Adam Smith a Friedrich Hayek, pedem humildade em relação ao funcionamento da economia. No sentido de que são tantos fenômenos inter-relacionados, por gente que não se conhece, em países diferentes, que ninguém na verdade saberia determinar a priori qual o preço de um simples pãozinho.

Nesse sentido que prescrevem o mínimo de intervenções e controles no mercado. Afinal a gente nunca saberia as consequências de nossas ações como um todo. A crítica que se faz ao marxismo, inclusive, é no sentido de questionar a soberba de uma teoria que promete domar os ventos, os fogos e as marés econômicas - pretensão fracassada, como sabemos.

O presidente Lula e a presidente do PT Gleisi Hoffmann. Foto André Dusek/Estadão Foto: Estadão

Por algum motivo, mesmo após a queda do muro de Berlim em 1989, e a debacle do socialismo real, integrantes estrelados do Partido dos Trabalhadores seguem acreditando nessa doutrina falha. Pior: ainda a veneram como um dogma. Mais grave: proclamam uma espécie de marxismo infantilizado que transforma o mercado numa espécie de pessoa má. Num diabo aqui na Terra. Reduzem a economia a uma questão moral (e ainda se colocam do lado do bem).

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Muitas vezes as coisas têm causas, e não culpas. Mas tem sido difícil para um petista padrão entender que a desconfiança do chamado mercado e a subida a cotação do dólar tem mais a ver com a desconfiança em relação a um grupo ora no poder que parece não dar devido valor às contas equilibradas.

Um país que optou por déficits será mais dependente do mercado, que irá emprestar o dinheiro para fechar suas contas. E num ambiente de ajustes frouxos e ambíguos faz algum sentido exigirem juros mais altos. Quem quer emprestar sem contrapartidas para quem pensa que gasto é vida?

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Mas, nesse ambiente turbulento, o PT dobra aposta na visão infantil e equivocada do processo (e não são apenas os posts da presidente do partido, excelentes para uma assembleia estudantil). Agora querem criminalizar os operadores do mercado - a tal “Faria Lima”, numa referência imprecisa à avenida de São Paulo que abriga as sedes de alguns bancos brasileiros. A gente fica a pensar se é negacionismo, ingenuidade, incapacidade de compreensão ou má-fé.

Além de todos investidores do B3 parece que os petistas querem colocar na cadeia os responsáveis pelas corretoras, as pessoas físicas que sugerem investimentos e qualquer um envolvido no processo. É preciso prender, por exemplo, um hipotético operador uruguaio, com residência em Londres, que após ler as declarações de Lula optou por colocar o dinheiro de seus clientes na Austrália e não no Brasil. Porque é preciso colocar na lista também os investidores estrangeiros que preferem colocar recursos em países que pagam retornos bem mais baixos do que os brasileiros, em alguns casos até negativos - para correr menos riscos.

Mas esses operadores de mercado são apenas intermediários. Trabalham para gente que os demitirá se perder dinheiro. É preciso prender seus patrões, lógico! Pode ser uma diretoria de grande empresa com sede no Canadá. Pode ser uma senhora que tem um consultor financeiro. Pode ser alguém que iria vender seus poucos dólares hoje, mas prefere esperar mais um pouco. Se pensarmos bem, dada a complexidade ininteligível do mercado (fora para os marxistas que sabem tudo), é preciso prender todo mundo.

Opinião por Fabiano Lana

Fabiano Lana é formado em Comunicação Social pela UFMG e em Filosofia pela UnB, onde também tem mestrado na área. Foi repórter do Jornal do Brasil, entre outros veículos. Atua como consultor de comunicação. É autor do livro “Riobaldo agarra sua morte”, em que discute interseções entre jornalismo, política e ética.

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