O ponto em comum entre o mensalão operado por Marcos Valério, o departamento de propinas da Odebrecht, os rachadões em gabinetes e as emendas de relator é que todos são orçamentos secretos, embora só o último esquema seja conhecido por esse nome.
A condenação de petistas no primeiro escândalo deu esperança aos incautos de que a “verba secreta” – citada por Lima Barreto ao criticar a República, na raiz, como “regime da corrupção” – tinha seus dias contados. Mas ela não só permaneceu em estatais e casas legislativas, como foi institucionalizada no Congresso, no governo Bolsonaro.
Cabe, agora, ao mesmo Supremo Tribunal Federal que deixou impune uma geração de políticos com codinome em orçamento secreto de empreiteira favorecida nos governos Lula e Dilma julgar ação de inconstitucionalidade contra emendas usadas para compra de apoio parlamentar. A punição dos envolvidos já nem sequer é aventada. O que se discute é se um esquema espúrio pode ter legitimação judicial e em quais termos.
Nos últimos dias, o STF seguiu seu padrão de garantidor da impunidade, blindando figuras exemplares da natureza do petismo e do bolsonarismo, com ajuda do primeiro indicado por Bolsonaro, Kassio Nunes Marques. Com Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, ele formou maioria na Segunda Turma para anular a condenação de André Vargas, ex-membro do PT, declarando incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba, sete anos depois da 11.ª fase da Lava Jato, que apurava o direcionamento de contratos de publicidade no Ministério da Saúde e na Caixa em troca de propinas.
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Com André Mendonça, também indicado por Bolsonaro, Nunes Marques fez uma dobradinha de manobras jurídicas que evitaram a prisão por “rachadinha” do deputado bolsonarista Silas Câmara, cuja pena prevista em voto de Luis Roberto Barroso era de cinco anos e três meses, além de perda do mandato e ressarcimento de mais de R$ 1 milhão em valores corrigidos. Ao tirar do plenário virtual o processo lá disponível em 2020, Marques atrasou o julgamento para novembro de 2022 no plenário físico, onde Mendonça, aliado confesso do réu, atrasou o caso mais ainda, com pedido de vista. O deputado então fez acordo com a PGR de Augusto Aras, outro indicado por Bolsonaro, restando a Barroso, na véspera da prescrição, impor somente multa de R$ 242 mil.
No caso das emendas de relator, portanto, o Supremo vai definir na prática se os orçamentos secretos tolerados no Brasil são apenas os não institucionalizados.
Podre a República em que só resta torcer por isso.
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