Após dez anos, o Foro de São Paulo, a organização que congrega partidos políticos da esquerda latino-americana e do Caribe, volta a se reunir no Brasil. No 26.º encontro do grupo – o primeiro presencial após a pandemia de covid-19 –, os dirigentes partidários pretendem tratar do que chamam de epidemia de fake news, da preservação da Amazônia, além da “integração dos povos da região”. Mas devem silenciar sobre a situação da democracia em países como a Nicarágua e a Venezuela.
Nesta semana, em reunião com o papa Franscico, em Roma, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva – que deve estar presente na abertura da reunião do Foro, no próximo dia 29 – comprometeu-se a tratar com o governo da Nicarágua da libertação do bispo de Matagalpa, dom Rolando José Álvarez Lagos. Dom Alovarez foi condenado a 26 anos de prisão e encarcerado por se opor ao ditador esquerdista Daniel Ortega, que dirige o país da América Central.
Questionada sobre se o debate da democracia, tratada como valor universal, devia estar presente no fórum, em razão do caso nicaraguense, a secretária executiva do Foro, a dirigente petista Mônica Valente, afirmou: “Todos os países da região têm eleições, ainda que nem sempre sejam eleições e sistemas políticos com os quais todos se identifiquem. A gente respeita as escolhas dos povos e temos cuidado com a não ingerência nas questões internas dos países. Buscamos um esforço de construção de unidade dentro das divergências”.
A entidade, portanto, não deve condenar as ações de Ortega, como fizeram recentemente os governos dos presidentes colombiano, Gustavo Petro, e chileno, Gabriel Boric, ambos sustentados por partidos que estarão presentes no encontro, no Conselho de Direitos Humanos, da ONU. Peritos das Nações Unidas, em uma investigação sobre a situação da Nicarágua, concluíram que crimes contra a humanidade foram cometidos por Ortega por razões políticas contra a oposição e contra quem discorda do regime nicaraguense.
A 26.ª reunião da entidade – entidade eleita pelo ideólogo da direita Olavo de Carvalho como um de seus alvos prioritários – deve eleger o combate à fake news como um de seus pontos centrais. Ao menos é o que garante Jorge Derkos, do Partido Frente Transversal (da coalizão que elegeu Alberto Fernández na Argentina) e coordenador de comunicação e redes sociais do Foro. “Vamos analisar as fake news e a maneira como essas notícias afetam e condicionam a vida democrática, condenando sem provas dirigentes populares inocentes.”
Ou seja, o Foro pretende afirmar que Lula e outros dirigentes da esquerda latino-americana, como o ditador venezuelano Nicolás Maduro – alvo de processo nos EUA –, foram e são vítimas de notícias falsas. O caso do brasileiro foi citado pelo argentino como “paradigmático”. Deve participar desse debate Tania Diaz, reitora da Universidade Internacional de Comunicações (Uicom), da Venezuela. A escola foi idealizada em um encontro do Foro, em 2018, e fundada naquele país com o objetivo de formar “comunicadores populares” para “resistir” ao que seus apoiadores chamam de “onda de mentiras” à respeito da ditadura de Maduro.
Reação
A reunião da entidade está provocando a reação de políticos bolsonaristas, como a deputada federal Bia Kicis (PL-DF). Em discurso na Câmara dos Deputados, no último dia 14, ela chamou a 26ª reunião do Foro de “palco para ditadores”, ao mesmo tempo em que atacou a imprensa, afirmando que “a midía sempre negou” a existência do foro. “A polarização existe independentemente de qualquer radicalização do Foro. Ela vem sendo alimentada pelo crescimento da extrema direita”, afirmou o professor Pietro Alarcon, do Partido União Patriótica (coalisão Pacto Histórico, que elegeu Gustavo Petro, na Colômbia).
Para ele, a reunião do foro deve servir para o debate de ideias, considerado por Alarcon como “o melhor remédio contra a polarização”. “Com certeza, a realização do foro será explorada. Isso é positivo, pois mostra a relevância do foro. A direita tem motivos de preocupação, pois o momento político é favorável á esquerda”. Para ele, as mudanças climáticas, a Amazônia e a sua preservação devem estar no centro das preocupações da reunião. “Devemos construir uma cultura global ambiental e isso causa desconforto na direita”, afirmou.
O evento, que se estenderá dos dias 29 de junho a 2 de julho em um hotel em Brasília, deve contar com representantes de cerca de 150 partidos políticos da região e convidados, como integrantes do Democratas Socialistas da América (DSA), grupo ligado ao Partido Democrata americano ao qual pertencem o senador Bernie Sanders e a deputada Alexia Ocasio-Cortez, e o Partido da Esquerda Europeia, grupo do Parlamento Europeu ao qual estão filiados partidos como os comunistas francês e espanhol, o Bloco de Esquerda português e o Syryza grego. Além disso, são esperados representantes de 300 organizações sociais.
A reunião do Foro:
- Dia 29
Seminário A integração regional latinoamericana e caribenha, e os desafios dos governos de esquerda e progressistas”
Reunião de Parlamentares Câmara Federal
Inauguração do XXVI Encontro - Homenagem a Marco Aurélio Garcia, fundador do Foro de São Paulo
- Dia 30
Encontro de Mulheres - Diálogo entre o Foro de São Paulo e as redes/plataformas de luta de movimento social e popular
Encontro de Jovens - Diálogo entre o Foro de São Paulo e as redes/plataformas de luta de movimento social e popular (continuação)
Colóquio sobre a situação brasileira e as políticas de governo
- Dia 1.º
Reunião de Escolas e Fundações
Seminário FSP-Partido da Esquerda Europeia: “Visões compartilhadas”
Painel FSP e Socialistas Democráticos da América (DSA): panorama político estadunidense e campanhas de solidaridade nos EUA
Ato: Bicentenário da Doutrina Monroe e a luta pela Paz na América Latina e Caribe
Reunião do Grupo de Trabalho: Declaração Final - Resoluções.
Festa de Confraternização do PT
- Dia 2
Plenária final
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