BRASÍLIA - Em crise desde o começo da gestão do presidente Jair Bolsonaro (PL), a Fundação Nacional do Índio (Funai) vive uma dança das cadeiras. Nas últimas duas semanas, ao menos três dirigentes deixaram seus postos. O último a sair foi o delegado da Polícia Federal César Augusto Martinez, até então diretor de Proteção Territorial da Funai.
Segundo servidores, o abandono contínuo dos cargos de chefia é resultado do estilo pessoal do presidente da Funai, o delegado da Polícia Federal Marcelo Xavier, que seria incapaz de formar e manter equipes.
Martinez tinha sob sua alçada a Coordenação de Indígenas Isolados e de Recente Contato, setor no qual trabalhou o indigenista Bruno Pereira, desaparecido desde domingo no Vale do Javari (AM). Martinez deixou o cargo nesta quarta-feira, 8, mas sua saída já estava prevista e não tem relação com o desaparecimento de Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, que viajava com ele.
Como mostrou o Estadão, Pereira pediu licença não remunerada da Funai em janeiro de 2020, depois de ser removido da coordenação de Indígenas Isolados em outubro de 2019. Sua exoneração foi assinada pelo secretário-executivo do Ministério da Justiça, à época em que o ex-juiz Sérgio Moro era o titular, Luiz Pontel de Souza.
Desde então, o indigenista atuava na União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja). Para servidores da Funai, o desaparecimento de Pereira poderia ter sido evitado se ele estivesse trabalhando com o auxílio do aparato de Estado.
Além de Martinez, também deixaram os cargos, recentemente, o coordenador de Gestão Estratégica da Funai, João Francisco Goulart dos Santos, e o coordenador-geral de Promoção dos Direitos Sociais, Oscar Homero de Lima Marsico. Para uma indigenista, que opinou na condição de anonimato, os episódios demonstram que Xavier não consegue montar equipe.
Para o lugar de Martinez, a Funai designou uma servidora que já havia trabalhado como assessora de Marcelo Xavier. Em entrevista à Voz do Brasil, no começo da noite desta quarta-feira, 8, Xavier destacou que a exoneração de Martinez já estava prevista há mais de 30 dias, e não tem relação com o desaparecimento de Pereira.
Servidores que eram subordinados a Martinez contaram que ele estava rompido com o presidente da Funai. O estopim para a saída teria sido o atrito com o chefe. Os dois se desentenderam depois que uma operação da Polícia Federal, no fim de março, prendeu um coordenador da Funai em Ribeirão Cascalheira (MT), o militar da reserva da Marinha Jussielson Gonçalves Silva.
Jussielson foi acusado de envolvimento com milícias e de intermediar o arrendamento de terras indígenas para pecuaristas na região. Martinez culpou Xavier pela nomeação de um militar supostamente corrupto e por não ter checado a ficha dele antes de indicá-lo. Procurado, Jussielson não foi encontrado até a publicação desta reportagem.
No dia 25 de maio, saiu publicada no Diário Oficial da União a exoneração, a pedido, de Goulart dos Santos. Policial militar aposentado do Rio Grande do Sul, Santos integrou a Força Nacional e trabalhou com gestão estratégica no Ministério da Justiça. Era considerado um dos mais preparados na Funai. Deixou o posto de coordenador de Gestão Estratégica sem explicar os motivos nem mesmo aos subordinados diretos. O Estadão conversou com um indigenista que trabalhava com ele. A saída de Santos foi descrita como “abrupta”.
Seis dias depois, quem entregou o cargo foi Lima Marsico. Tenente do Exército, Marsico é paraquedista, como Jair Bolsonaro. Atuou na missão de paz das Nações Unidas no Haiti (Minustah) e, na Funai, era o responsável por montar a operação para a entrega de cestas básicas aos indígenas. Pediu para deixar a cadeira de coordenador-geral de Promoção dos Direitos Sociais alegando razões de cunho pessoal. Procurada pelo Estadão, a Funai não respondeu.
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