Na política, como na vida, é preciso sapiência, mas também um pouco de sorte. E Tarcísio de Freitas, ao que parece, tem tido os dois. Em sua primeira campanha, levou o maior estado do país. Poucos meses depois, quando mal havia esquentado a cadeira de governador, passou a ser o nome mais citado como herdeiro do bolsonarismo.
Com a saída forçosa de Jair da disputa, tornou-se irresistível conjecturar sobre quem irá rivalizar com Lula em 2026. O exercício é pouco eficiente para antecipar quem de fato estará na briga. No tempo da política, três anos é o suficiente tanto para enterrar como para reabilitar alguém. Há um extraordinário número de eventos que podem se suceder daqui até lá. É por isso que se tornar um “presidenciável” com tanta antecedência representa ao mesmo tempo um ativo e um risco.
Tarcísio sabe disso. O primeiro erro que parece decidido a não cometer é o de reconhecer que ambiciona o posto. A quem lhe pergunta — ou a quem interessar possa, como o próprio Jair — tem dito que seu foco é o governo de São Paulo. Com isso, tenta reduzir o risco de se tornar alvo de ataques incessantes por longos três anos.
Resistir ao “canto da sereia” é tarefa árdua e necessária, me disse um dos principais auxiliares de Tarcísio. É que, além de se esquivar dos rivais, o governador de São Paulo precisa mostrar serviço. Tem três anos para fisgar o eleitor de São Paulo. Com a antipatia do maior colégio eleitoral do país, não dá para acalentar voos mais altos - João Doria que o diga.
A largada deu sinais promissores. Tarcísio vem forjando a imagem de um governador atuante enquanto projeta nacionalmente a figura de um líder pragmático. Foi assim na tragédia de São Sebastião, em fevereiro, quando chuvas torrenciais deixaram dezenas de mortos no litoral. Era o momento de mostrar a que veio, de causar a primeira impressão, segundo um de seus principais conselheiros. E ele transmitiu ali a ideia de “que não é um político de gabinete”, me disse esse auxiliar.
Mais recentemente, Tarcísio testou sua capacidade de articulação nas negociações da reforma tributária. Em vez de abraçar os apelos do bolsonarismo, ouviu o empresariado paulista e foi a Brasília defender os seus. Deu tão certo que foi elogiado até pelo governo. Saiu, sem dúvida, maior do que entrou.
A destreza no episódio o fez despontar ainda mais nas apostas para 2026. E os olhos do centrão brilharam. Bolsonaro é um inegável sucesso eleitoral, mas um aliado irascível. O jogo de Tarcísio é diferente. Ciro Nogueira, por exemplo, passou a ventilar um cenário no qual ele seria o vice de Tarcísio, unindo São Paulo ao Nordeste numa chapa presidencial endossada pelo seu partido, o PP, pelo Republicanos e pelo PL.
Esse plano inclui combinar com Bolsonaro — ou considerar que o capital político do ex-presidente irá se reduzir a ponto de o bloco prescindir de suas bênçãos. Mas, ainda que Tarcísio se torne um sucesso como governador e o bolsonarismo não se rebele contra ele até lá, será preciso uma ajuda e tanto de Lula. Mesmo quem torce para uma campanha presidencial de Tarcísio reconhece que, se o governo estiver muito bem às vésperas de 2026, será pouco inteligente tentar o Planalto.
Hoje, é impossível saber como o petista chegará ao fim do mandato. Se estiver mal, pode chamar Tarcísio para a briga. Tem chão até lá. O governador de São Paulo deu mostras até o momento de que sabe exercitar a sabedoria. Resta descobrir se seguirá um político de sorte.
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