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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

A aurora brasileira da política climática

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Por REDAÇÃO

Sahasranshu Dash, Pesquisador Associado do South Asia Institute of Research and Development em Kathmandu, Nepal

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Arefin Mizan, Consultor de pesquisa na organização de pesquisa jurídica ELCOP -- Empowerment through Law of Common People, com sede em Dhaka, Bangladesh

Alan Uchoa Pellejero, Doutorando na Fucape Business School em São Paulo

O Brasil voltou a ser notícia. Em contraponto à comoção generalizada pela perda do eterno rei do futebol Pelé, a posse de Luiz Inácio Lula da Silva, em 1° de janeiro, tem sido motivo de comemoração para muitos cientistas, ativistas, antropólogos, vigilantes da democracia e representantes de órgãos intergovernamentais de direitos humanos, por exemplo, que estão experimentando seus passos de samba em homenagem ao retorno de Lula à Brasília.

As comemorações têm um bom motivo: a perspectiva da extinção da floresta amazônica - que produz de 6 a 9% do oxigênio mundial e atua como um importante sumidouro de carbono -- constitui um dos nove pontos catastróficos do clima global, segundo o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). Juntamente com o derretimento da camada de gelo da Groenlândia, o degelo do permafrost e o colapso da Circulação Meridional do Atlântico, por exemplo, o desmatamento nas florestas tropicais pode aumentar a temperatura global em até 1°C. Para piorar ainda mais esse preocupante quadro, entre 1º de agosto de 2019 e 31 de julho de 2021, as políticas de extrema-direita de Jair Bolsonaro resultaram no desaparecimento de mais de 34 mil quilômetros quadrados da Amazônia - uma área maior que a Bélgica -, provocando um aumento de mais de 52% no desmatamento desde que o agora ex-presidente tomou posse.

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A primeira grande salva da política climática brasileira do século XXI veio há dois meses, quando a eleição foi decidida por uma diferença de apenas 1,8% dos votos válidos, o que acirrou ainda mais os ânimos dos apoiadores de Bolsonaro, que passaram a disseminar alegações infundadas de fraude eleitoral e ameaças de golpe. A despeito de tais atos antidemocráticos, a vontade dos eleitores prevaleceu e a ruína climática foi evitada.

Em uma onda anticorrupção e atraindo eleitores evangélicos por meio de apelos muitas vezes racistas, misóginos e homofóbicos, Jair Bolsonaro chegou ao poder em 2019. Durante o exercício do cargo, Bolsonaro cortou o financiamento e retirou a autonomia de entidades científicas, culturais e sociais, promoveu medidas que afrouxaram a fiscalização ambiental, demitiu especialistas ambientais e pressionou pela retirada de direitos dos povos indígenas e quilombolas. Em 22 de abril de 2015, declarou ao jornal Campo Grande News: "Não há territórios indígenas onde não há minerais. Ouro, estanho e magnésio estão nessas terras, especialmente na Amazônia, o lugar mais rico da Terra. Não estou entrando nessa bobagem de defender a terra para os indígenas." Como resultado de sua política anti-indígena, cerca de 17% da floresta amazônica já foi eliminada. Isso está perigosamente perto dos 20 - 25% que causariam danos irreversíveis à biodiversidade e transformariam a floresta tropical de sumidouro de carbono em fonte de emissões de carbono. De fato, esse já pode ser o caso do sudeste da Amazônia, onde Bolsonaro deu carta branca aos produtores de madeira, carne e soja para limpar a cobertura florestal que era até então protegida. O político pró-madeireira, Ricardo Salles, inclusive, foi nomeado ministro do meio ambiente entre 2019 e 2021!

Grande parte do discurso conservacionista mudou, com os povos indígenas agora vistos como agentes ativos da conservação ambiental -- e não apenas como vítimas das mudanças climáticas. Em 2021, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação divulgou, pela primeira vez, um relatório intitulado "Governança florestal por povos indígenas e tribais: uma oportunidade para ação climática na América Latina e no Caribe". Os povos não só resistiram à ocupação e ao desmatamento das terras em que viveram durante séculos, como também permanecem sendo os melhores guardiões da cobertura florestal. O relatório também estabeleceu que os territórios de propriedade coletiva dos povos indígenas evitaram emissões de 59,7 milhões de toneladas métricas de dióxido de carbono na Bolívia, Brasil e Colômbia.

Essas informações colocam o ataque de Bolsonaro aos direitos indígenas sob os holofotes, pois embora o desmatamento em terras indígenas tenha aumentado 137% em 2020 -- em relação a 2018 --, a demarcação de 241 territórios indígenas foi paralisada no Brasil. Em 2019, Maxciel Pereira dos Santos, agente da FUNAI, foi executado em Tabatinga, no Amazonas. Em junho de 2022, Bruno Pereira, ex-diretor da FUNAI, e o jornalista britânico Dom Phillips, foram assassinados por opositores devido às suas campanhas contra a pesca ilegal e o garimpo de ouro no Vale do Javari. Essa é uma questão latino-americana mais ampla: 200 defensores ambientais foram assassinados nas Américas em 2021, segundo a Global Witness, sendo 26 deles apenas no Brasil. Quase 80% dos mortos no Brasil, Peru e Venezuela estavam na região amazônica. No Peru, após a crise política iniciada em 7 de dezembro de 2022, legisladores de extrema direita, inspirados por Bolsonaro, apresentaram um projeto de lei, PL n.° 3.518, que retiraria a proteção dos indígenas isolados da região de Loreto, na Amazônia peruana, e desmantelaria as sete reservas existentes.

Isso levou a uma resposta poderosa e incomum de grupos indígenas. Em 2021, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil e os caciques Raoni Metuktire e Almir Narayamoga Surui entraram com ações contra Jair Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional pelo crime de "ecocídio". que reconhece os crimes internacionais estabelecidos de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e crime de agressão. No momento, a única referência explícita à destruição ambiental no Estatuto de Roma é encontrada no Artigo 8(2)(b)(iv), na seção de crimes de guerra. No entanto, a classificação como "crime de guerra" exclui essencialmente a investigação ou o julgamento de crimes ecológicos cometidos em tempos de paz. Além disso, os promotores exigiriam evidências de um ato causal (actus reus) e de uma intenção específica (mens rea), ambos extremamente difíceis de provar para a destruição antropogênica do meio ambiente. No entanto, essas ações fornecem um grande impulso ao ativismo legal e abrem debates produtivos acerca do tema no direito internacional.

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Enquadramentos jurídicos tais como o "Acordo Regional de Escazú" -- do qual o Brasil e o Peru são signatários, sem terem ratificado o tratado -- podem estar em melhor posição para realizar a fiscalização de tais ações. Além disso, as acusações de Metuktire e Surui relativas a mortes, extermínio, migração forçada, escravização e perseguição impostas aos povos indígenas são muito mais diretas e passíveis de ação legal.

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Nesse cenário de desafios políticos, econômicos e sociais, a Amazônia brasileira, mais do que ações judiciais, exige uma ação corretiva, rápida e em grande escala. Felizmente, Lula retornou ao poder, prometendo acabar com o garimpo ilegal e diminuir o desmatamento. Chegou a nomear a célebre ambientalista Marina Silva e a ativista de origem indígena Sônia Guajajara como ministras de seu novo governo. Assim, ele espera repetir o sucesso de seus dois primeiros mandatos, durante os quais o desmatamento na Amazônia caiu drasticamente. Tasso Azevedo, do MapBiomas, calcula que durante o primeiro mandato de Lula (2003-2006), o desmatamento foi reduzido em 43,7 por cento, seguido por 52,3 por cento durante seu segundo mandato, que durou até 2010. Nesse quesito, o Brasil também pode se inspirar no esforço conjunto realizado pela Costa Rica em prol do ecoturismo, como alternativa econômica à proibição geral, em 1996, ao desmatamento não autorizado e sua política de oferecer pagamentos por serviços ambientais financiados por um imposto sobre o consumo de combustível fóssil. Essas políticas ajudaram a nação centro-americana a voltar a ter 60% de suas terras sob uma cobertura florestal exuberante.

No contexto amazônico, acrescenta-se ainda o fato de que o desmatamento pode comprometer uma das maiores riquezas da região, que é o solo extremamente fértil denominado "Terra Preta de Índio (TPI)". Segun do artigo A new hypothesis for the originof Amazonian Dark Earths, publicado na Nature Communications, os pesquisadores demonstram que tais solos datam de um período anterior à presença do homem no bioma. No médio e longo prazo, o avanço do desmatamento contribuiria sobremaneira para o desparecimento de tal tipo de solo, o que seria particularmente catastrófico dado que o solo amazônico não tem, naturalmente, um elevado índice de fertilidade.

Isso ocorre porque o solo é formado a partir do intemperismo das rochas, que na Amazônia tem origem em chuvas torrenciais que literalmente lavam a região. Devido ao caráter ácido das chuvas (baixo pH), a reação com o CO2 presente na atmosfera forma ácido carbônico, que é capaz de decompor as rochas. Esse processo, aliado à presença de fungos, algas e líquens, por exemplo, atuam conjuntamente de forma a potencializar os efeitos do intemperismo. A repetição desse processo faz com que os minerais não fiquem retidos no solo, de modo que, a cada chuva, cálcio, magnésio e potássio, por exemplo, sejam levados do solo ao invés de serem absorvidos, conferindo um caráter arenoso ao solo amazônico que, sem a exuberante floresta, tornar-se-ia em poucas décadas um solo desértico.

Como nos lembra o sociólogo Michael Löwy, é essencial passar de uma concepção puramente quantitativa das forças produtivas para a transformação qualitativa do desenvolvimento sustentável. Lula terá, portanto, que encontrar uma maneira de financiar seus ambiciosos programas sociais sem depender inteiramente de fontes extrativistas ou de receita de importação, oriunda principalmente da pecuária, mineração e extração de madeira. Nesse contexto, a implementação da moratória de 2006 sobre o plantio de soja em terras desmatadas trouxe consequências particularmente cruciais à economia do agronegócio, setor econômico onde o ex-presidente possui grande parte de sua base de apoiadores. Para agradar esse contingente, à maneira orwelliana, Bolsonaro declarou que os pesticidas não seriam mais denominados "agrotóxicos" -- o que conferia um caráter negativo --, mas sim "defensivos agrícolas", buscando suavizar a pesada conotação de nocividade causada à saúde e à natureza. Lula também terá que reverter tais perversões nomenclaturais e proibir a comercialização de pesticidas proibidos.

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Por fim, devemos reconhecer que as lutas globais por justiça climática, democracia e direitos humanos estão agora interligadas e o Brasil é novamente um país que certamente trará em sua agenda a sempre presente preocupação com tais temas. Nas palavras do grande Angenor de Oliveira (Cartola), em sua canção "O Mundo é um Moinho", quem sabe agora o Brasil possa contribuir de verdade para tirar nosso planeta do "abismo que cavamos com nossos próprios pés". Que a aurora da política climática brasileira nos traga luz e esperança para 2023 e além.

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