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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Os acontecimentos do último domingo e o financiamento do terrorismo

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Por REDAÇÃO

Bernardo Viana, Advogado, sócio do escritório Almeida Advogados. Professor e Presidente da Comissão de Estudos sobre Prevenção à Lavagem de Dinheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP)

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Fala-se tanto em lavagem de dinheiro que, por vezes, esquece-se que a regulação atinge não somente o produto de atividade criminosa, mas também bens destinados ao financiamento do terrorismo [1]. Não à toa, a sigla completa e correta para o tema é "PLD-FTP" (Brasil) ou "AML/CFT/WMD [2]" (conforme FinCen americano e outras instituições), não apenas "PLD" ou "AML", referência reduzida ao assunto.

Assim como as principais sanções internacionais, especialmente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, a preocupação era originalmente em relação à formação de células de grupos terroristas internacionais. Com a crescente polarização política, e a facilidade de organização com os meios de comunicação instantâneos de hoje, os olhos das autoridades também se voltam sobre grupos alegadamente terroristas em âmbito doméstico.

Os acontecimentos do último fim de semana não são isolados quando observamos a última década no Brasil e no mundo. Aqui no Brasil, inclusive, tivemos discussões jurídicas (e não tão jurídicas) sobre o financiamento de "protestos" considerados como atos terroristas. Ou seja, muito longe da acepção mais comum de terrorismo originada com ataques internacionais como a queda das Torres Gêmeas, hoje a principal discussão em todo o mundo sobre o assunto trata de protestos internos contra medidas de governo.

De maneira geral, a Constituição e a Lei Antiterrorismo consideram os mandantes, executores e todos aqueles que participaram de atos preparatórios e de financiamento ao terrorismo como puníveis criminalmente. A discussão sobre a interpretação criminal, muito importante, não exaure o tema.

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Sabemos que instituições financeiras, corretoras de seguros, corretoras de imóveis, toda empresa que comercializa bens acima de R$ 10 mil [3], e tantos outros, estão sujeitos às regulações de PLD-FTP no Brasil. Essas normas compreendem rotinas de prevenção ao financiamento do terrorismo que incluem tanto informações sobre os clientes quanto sobre as operações continuamente realizadas.

A regulação aplicável (Coaf, Bacen, CVM, Susep, e outras sopas de letrinhas) não faz distinção expressa sobre qual a "extensão" e "acepção" de terrorismo deve ser considerada para cumprimento das normas de PLD-FTP.

É apenas o indivíduo condenado criminalmente por atos de terrorismo, com trânsito em julgado, que deve ser monitorado? Ou toda informação pública relacionada a uma investigação vigente, participação em atos suspeitos, oferecimento de denúncia criminal, entre outras, deve ser considerada? E se a própria instituição financeira, sem informação adicional de cunho criminal, identificar operações suspeitas de um determinado cliente?

Tivemos recentemente amplas e bem-vindas atualizações na regulação: um importante reforço sobre a importância de classificar o risco associado a todo cliente e a toda operação, e monitorá-los continuamente. Toda e qualquer informação relevante é essencial para cada avaliação.

Devo monitorar informações públicas sobre indivíduos e pessoas jurídicas investigados por eventual participação em atos de terrorismo? O dado obtido é um fator que aumenta meu risco de associação com este cliente? Como posso seguir com a operação, mas reduzindo o risco identificado? Devo registrar ou reportar algo? Caso um cliente seja identificado em informação pública, devo auditar as operações contemporâneas aos possíveis atos terroristas e reforçar o monitoramento para as transações futuras?

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São perguntas sadias - merecedoras do óbvio "sim" - que executivos que atuam em setores regulados por PLD-FTP, especialmente instituições financeiras, devem constantemente se fazer. Cada caso merece sua análise de risco e recomendação específica, e não há solução one size fits all.

Não são apenas autoridades criminais que devem se preocupar com quem financia o terrorismo. Todas as entidades que estão sujeitas às normas de PLD-FTP, incluindo instituições financeiras, quem comercializa bens de alto valor (acima de R$ 10 mil), e toda a gama de atividades empresariais regulada pela Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro, devem monitorar informações sobre potenciais financiadores de atos de terrorismo.

Atenção especial a eventuais novidades regulatórias e jurisprudenciais sobre financiamento ao terrorismo "doméstico'. Surpresas podem aparecer.

Notas

[1] Mais recentemente, a regulação no Brasil e no mundo incluiu também a destinação de bens ao financiamento da proliferação de armas de destruição em massa.

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[2] O Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI/FATF) também utiliza a sigla AML/CFT/CPF para os mesmos conceitos.

[3] Bens de alto valor e de luxo, conforme Lei Federal nº 9.613/1998 (Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro) e Resolução COAF nº 25/2013.

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