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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Políticas Públicas no Brasil Recente: Um Retrato do Retrocesso e os Desafios para a Reconstrução

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Por Redação
 Foto: arquivo pessoal.

Alexandre Gomide, Diretor de Altos Estudos da Enap

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Michelle Morais de Sá e Silva, Professora de Estudos Internacionais e Co-Diretora do Centro de Estudos sobre o Brasil da Universidade de Oklahoma

Maria Antonieta Leopoldi, Professora do Departamento de Ciência Política da UFF e Pesquisadora do INCT/Politicas Publicas, Estratégias e Desenvolvimento

Nos últimos anos, o Brasil testemunhou o desmonte de várias políticas e organizações públicas. Conforme o atual vice-presidente Geraldo Alckmin, durante a entrega do relatório do governo de transição em 22 de dezembro de 2022: "Tivemos retrocesso em muitas áreas. Governo federal andou para trás. O estado que Lula recebe é muito mais difícil e triste do que anteriormente.... Infelizmente, houve um desmonte do Estado brasileiro".[1]

Para compreender e analisar esses eventos, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) publicou um livro que apresenta os resultados de um projeto de pesquisa realizado em parceria com o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia do Programa de Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento (INCT/PPED). O livro contribui teórica e empiricamente para o estudo das políticas públicas. No contexto da pesquisa, o desmonte é entendido como uma forma específica de mudança nas políticas públicas, caracterizada pela redução, diminuição ou remoção dos objetivos, instrumentos ou capacidades administrativas necessárias para sua implementação.

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Enquanto mudanças e transformações em programas e ações governamentais têm sido objetos de estudo em políticas públicas há muito tempo, as pesquisas existentes não abordam adequadamente essas mudanças em condições de retrocesso democrático e populismo reacionário, tais como vivenciamos no Brasil no período de 2016 a 2022. O livro preenche essa lacuna.

A pesquisa revelou que os processos de desmonte de políticas iniciaram-se em 2016, após o impeachment presidencial, em um contexto de austeridade fiscal e mudança na orientação programática do governo. Os impactos do impeachment não se limitaram aos aspectos administrativos e fiscais, mas também resultaram em uma queda na qualidade da democracia no Brasil, conforme indicadores do projeto Variedades da Democracia (V-Dem). A intensificação do desmonte e do retrocesso democrático ocorreu a partir de 2018, com a eleição do presidente Jair Bolsonaro, considerado um líder populista reacionário.

O populismo reacionário busca desconstruir políticas inclusivas e progressistas, relacionadas à proteção ambiental, direitos das minorias, igualdade social e de gênero, entre outras, como parte de uma lógica antissistema. Esse processo ocorre em um contexto em que as instituições democráticas e o funcionamento do Estado estão sob estresse. Os populistas reacionários exploram os limites dos procedimentos, leis e instituições, chegando, por vezes, à ilegalidade. Esse padrão de comportamento foi observado nas políticas públicas federais no Brasil. As motivações por trás dos processos de desmonte combinam vários elementos, incluindo considerações ideológicas e materiais, a "guerra cultural" e a austeridade fiscal.

A pesquisa constatou que muitos processos de desmonte ocorreram de forma ativa e explícita, demonstrando a intenção do governo de ser reconhecido por suas ações nesse sentido. Além disso, foram adotadas estratégias para desestabilizar as capacidades administrativas existentes, através do assédio à burocracia pública. Essas ações tiveram (e continuam tendo) impactos significativos nas políticas públicas e na sociedade em geral.

Os resultados da pesquisa mostram que as políticas sociais foram afetadas pelo desmonte, com cortes significativos nos orçamentos de áreas como saúde, educação e assistência social. A política ambiental também sofreu impactos negativos no marco de uma clara e intencional lógica de desmantelamento.

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Um exemplo citado na pesquisa é o desmonte do Cadastro Único, no qual suas capacidades analíticas foram desmobilizadas. Esse desmonte foi acompanhado pela reconfiguração do Programa Bolsa Família como Auxílio Brasil, introduzindo novos objetivos que contradizem a política original. Essas mudanças comprometeram a efetiva implementação das políticas sociais, dificultando a conquista dos resultados desejados.

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Outro impacto observado foi a perda de capacidade administrativa, a desarticulação de redes de colaboração e a erosão da confiança nas instituições estatais. Isso não apenas prejudicou a implementação das políticas públicas no presente, mas também dificultará sua reconstrução e recuperação no futuro. Os efeitos do desmonte de políticas públicas a longo prazo são preocupantes e requerem atenção especial por parte da sociedade civil, dos gestores públicos e dos formuladores de políticas. O livro também destaca as estratégias de resistência adotadas pela burocracia pública, ou seja, pelos servidores federais, em face das iniciativas de desmonte de políticas.

Diante dessas constatações, torna-se imperativo examinar mais de perto a potencial resiliência das políticas futuras e em vigor. A ausência de coalizões de apoio com poder de veto, a incapacidade dos beneficiários de se mobilizarem ou reagirem coletivamente, e os baixos custos "irrecuperáveis" na capacidade administrativa são fatores que contribuem para a falta de resiliência das políticas desmanteladas. É igualmente importante fortalecer as capacidades institucionais e técnicas dos órgãos responsáveis pela formulação, implementação e monitoramento das políticas públicas.

O estudo ressalta que a mobilização ativa de coalizões de atores com poder de veto pode ser uma estratégia eficaz para resistir ao desmonte. Além disso, fatores como a mobilização da sociedade, dos atores políticos e a resistência interna dentro das instituições também podem influenciar a resiliência das políticas públicas.

Portanto, o livro oferece uma melhor compreensão da trajetória por que passaram políticas federais no período de 2016 a 2022, fornecendo meios analíticos para se evitarem desmontes futuros e para se construírem políticas públicas mais resilientes. São 570 páginas de registro e análise de um período conturbado política e administrativamente, do qual o Estado brasileiro ainda custa para se recuperar. A compreensão desses eventos é fundamental para evitar desmontes futuros e promover a reconstrução do Estado brasileiro para a promoção do desenvolvimento inclusivo e sustentável.[2]

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Notas

[1] https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2022/12/22/governo-federal-andou-para-tras-diz-alckmin.htm

[2] O livro está disponível para download gratuito pelo link: https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/11939/1/Desmonte_e_Reconfiguracao.pdf

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