Governo Lula erra a mão com memes e recorre a medalhistas para surfar em popularidade olímpica

Perfis oficiais de ao menos três ministérios tiveram de apagar publicações problemáticas referentes aos Jogos de Paris nos últimos dias

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Foto do author Guilherme Caetano
Atualização:

BRASÍLIA - Desde que os Jogos Olímpicos de Paris começaram, em 26 de julho, o governo federal tem tentado aproveitar a avalanche de memes e piadas geradas na internet para capitalizar a popularidade do evento. A afobação, no entanto, rendeu uma série de gafes nos últimos dias — e agora a comunicação oficial recorre aos medalhistas para reverter as críticas.

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Perfis oficiais de ao menos três ministérios tiveram de apagar publicações problemáticas referentes à Olimpíada. Uma delas envolveu a cerimônia de abertura, em que as delegações nacionais navegaram pelo rio Sena, na capital francesa. O Ministério do Esporte publicou a foto de um chimpanzé segurando o volante de um barco com a legenda: “Todo mundo aguardando o nosso barco”. A pasta apagou a publicação em seguida e demitiu o autor.

Nesta terça-feira, o Ministério das Comunicações foi bombardeado de críticas ao trocar a ginasta Rebeca Andrade sendo reverenciada no pódio por um computador. A imagem fazia alusão ao Programa Computadores para Inclusão, que promove a conectividade nas escolas, mas foi apagada às pressas diante da repercussão negativa e substituída por um pedido de desculpas. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi um dos que ajudaram a endossar as críticas.

O presidente Lula e a primeira-dama Jana com a atleta Rebeca Andrade no Palácio do Planalto, em 2023. Foto Wilton Junior/ Estadão Foto: WILTON JUNIOR

“ESSE É O POST. Todos nós do Ministério das Comunicações reverenciamos Rebeca Andrade. Todos os brasileiros e brasileiras se sentiram honrados pela Rebeca, mas, principalmente, cada mulher preta brasileira subiu junto no topo do pódio com ela”, dizia a nova mensagem divulgada pela pasta, horas após o constrangimento. O alcance, no entanto, foi pífio — teve 56 curtidas.

Ministério dos Esportes fez publicação com teor racista em alusão à cerimônia de abertura das Olimpíadas de Paris Foto: @EsporteGovBr via X (antigo Twitter)

Na semana passada, foi a vez de o Ministério de Minas e Energia e o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) cometerem um deslize nas redes sociais. Eles divulgaram montagens com a icônica foto do surfista Gabriel Medina “voando” sobre o mar. Mas tiveram de retificar as publicações após o Estadão questionar sobre o direito de uso da imagem. A pasta apagou a imagem, e Alckmin acrescentou os devidos créditos.

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Para Luciana Moherdaui, pesquisadora da Cátedra Oscar Sala, do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, os erros dos últimos dias refletem uma comunicação analógica encontrada com frequência no governo, ainda muito voltada para os meios tradicionais, segundo ela.

Moherdaui diz que os tropeços simbolizam a postura analógica do próprio presidente Lula, que acaba cometendo durante os seus discursos gafes que são recortadas na internet e enquadradas contra ele. Descontextualizados, os trechos são usados como munição contra o petista em especial por apoiadores de Bolsonaro.

“O governo não tem uma equipe de comunicação articulada que desenvolva ou que desenhe uma estratégia para redes sociais. Ele tenta surfar nessas ondas, como das Olimpíadas, mas é de uma maneira ineficaz”, diz ela.

O pesquisador Pablo Ortellado, professor do curso de Gestão de Políticas Públicas da USP, vê nesses episódios erros naturais quando se tem equipes descentralizadas administrando as contas de redes sociais. Para ele, a comunicação digital precisa ser ágil a fim de aproveitar o momento do humor na internet, a tempo de surfar nos memes, e nem sempre é possível revisar cada publicação.

“Ou você faz algo que engaja, e publicar no timing tem seus riscos inerentes, ou faz campanhas mais convencionais”, afirma Ortellado.

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Enquanto lida com as gafes, o governo Lula vem tentando se defender do bombardeio da oposição, que tem usado a Olimpíada de Paris como munição. Para não repetir os erros dos ministérios, a Secretaria de Comunicação (Secom) aposta em repercutir os medalhistas olímpicos, como Rebeca, para gerar engajamento positivo.

A Secom vem tentando rebater em especial duas versões compartilhadas por bolsonaristas. A primeira se refere ao pagamento do Bolsa Atleta — publicações nas redes sociais dizem que o programa paga apenas R$ 410, mas benefício chega a R$ 16,6 mil —, e a segunda, à taxação dos prêmios de medalhistas olímpicos — ao contrário do que circula, o imposto não foi criado pelo governo Lula.

A preocupação com os rumores negativos levou as contas oficiais de Lula, da primeira-dama Janja, do governo federal e até o PT a focar na imagem dos atletas. Janja publicou uma selfie com Rebeca dias atrás, enquanto os outros perfis passaram a explorar o Bolsa Atleta para tentar conectar o sucesso esportivo a uma medida de governo.

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