Após ser alvo de críticas pelo silêncio e não adesão à declaração conjunta de 55 países que condena crimes cometidos pelo regime de Daniel Ortega, na Nicarágua, o Brasil deve se pronunciar nesta terça-feira, 7, no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra. A linha do governo Luiz Inácio Lula da Silva, segundo diplomatas envolvidos no caso, será a de demonstrar preocupação com as violações de direitos humanos, mas ainda defender uma “posição construtiva” do Brasil no trato com o regime.
Na sexta-feira passada, o Brasil não aderiu à declaração que denunciou crimes contra opositores de Ortega apurados por especialistas independentes. Há governos de esquerda latino-americanos que estão entre os signatários do documento, como o chileno e colombiano. O silêncio do Brasil gerou incômodo na comunidade internacional e nesta segunda-feira, 6, repercutiu no País.
Ao longo da semana passada, houve um esforço por parte do Brasil para que o texto e as discussões contemplassem a perspectiva de uma tentativa de saída negociada para a crise na Nicarágua. A diplomacia brasileira diz se incomodar com a indicação de aumento de pressão máxima internacional – quando os países começam a adotar sanções, por exemplo, ou outras medidas unilaterais – sem previsão de mediação. Integrantes do governo Lula afirmam que a medida adotada contra o regime de Nicolás Maduro, na Venezuela, em 2020, não surtiu efeito.
A opção dentro do Itamaraty tem sido a de colocar Lula como um potencial negociador com esses regimes. Críticas e condenações a ditadores e autoritários de esquerda na América Latina inflamam a militância do PT. Durante a campanha eleitoral, Lula evitou condenar o regime Ortega e chegou a dizer que seu adversário, o ex-presidente Jair Bolsonaro, era “infinitamente pior”.
Desde domingo, 5, o membro do Diretório Nacional do PT Alberto Cantalice vem sofrendo críticas de petistas por ter publicado no Twitter que Cuba, Venezuela e Nicarágua são ditaduras. Nesta segunda-feira, Cantalice voltou a tratar dos regimes, também na rede social. “Para fazer frente ao fascismo autoritário e excludente precisamos recalibrar o pensamento de certa ‘esquerda’. Não dá para criticar o autoritarismo da extrema direita e ignorar os autoritarismos ditos de “esquerda”. É incoerente. A esquerda tem de ser democrática integralmente!”, afirmou.
A repercussão negativa dentro e fora do País pelo silêncio do governo Lula foi debatida em Brasília e Genebra nesta segunda-feira. O País deve afirmar que decidiu se posicionar de maneira individual.
Uma possível resolução a respeito da situação na Nicarágua ainda pode ser levada a votação nesta semana, a partir de quinta-feira. Diplomatas brasileiros apostam que ainda há margem para debater os termos da resolução.
Um grupo de especialistas divulgou, no âmbito do Conselho de Direitos Humanos da ONU, na semana passada, relatório no qual pede a imposição de sanções internacionais contra Ortega. Divulgado em Genebra, o documento menciona execuções extrajudiciais, detenções arbitrárias, estupros, tortura e privação arbitrária da nacionalidade e do direito de permanecer no próprio país. “A população nicaraguense vive com o temor das ações que o próprio governo pode tomar contra ela”, afirmou o especialista independente Jan Simon.
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