Governo poupa MST de críticas após invasão e se coloca como mediador de negociação com o agronegócio

Ministro Paulo Teixeira, do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, pretende reunir movimento e a empresa Suzano na próxima quarta-feira

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BRASÍLIA E SOROCABA – O ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, evitou nesta quinta-feira, 2, fazer críticas às recentes invasões do Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST) a fazendas no sul da Bahia e afirmou que pretende mediar as negociações entre o grupo e a empresa Suzano, proprietária das áreas.

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Na segunda-feira, 27, integrantes do MST invadiram três fazendas de cultivo de eucalipto da Suzano, no sul da Bahia. Uma das áreas, em Mucuri, teve liminar de reintegração de posse concedida pela Justiça, mas a desocupação ainda não foi executada pela Polícia Militar. Outras duas fazendas, em Caravelas e Teixeira de Freitas, aguardam a decisão judicial. O MST invadiu também uma fazenda de outro proprietário em Jacobina, outra região do Estado.

O silêncio do governo até as primeiras declarações públicas de Paulo Teixeira nesta quinta-feira foi mal recebido no setor do agronegócio. Há um clima de desconfiança do setor sobre a garantia de segurança jurídica no campo. As invasões, com dois meses de governo, contrariam o discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na campanha. O petista chegou a dizer que o MST não ocupava propriedades produtivas, como são as áreas da Suzano.

Nesta quinta-feira, Teixeira evitou fazer críticas diretas à ação do MST. Conforme o ministro, a diretoria da Suzano pediu ajuda a ele. “Eu, imediatamente, liguei para o MST sugerindo a eles que possam negociar as questões relacionadas a esse terreno e, portanto, nós vamos a partir de hoje (dia 2) levantar toda situação do conflito. Há um conflito ali de 10 anos”, disse o ministro a jornalistas durante evento no Palácio do Planalto.

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Justiça da Bahia determinou a desocupação de uma das fazendas da Suzano, invadida nesta segunda-feira, 27, por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Foto: MST

O ministro afirmou que essa ocupação tem como objetivo não a área em questão, mas a retomada de uma negociação que foi feita há mais de 10 anos e, segundo a versão do MST, a Suzano não teria cumprido sua parte – a empresa nega o descumprimento. Teixeira afirmou que quer resolver o conflito pelo “diálogo”, dentro da Constituição e da lei. Ele pretende reunir as partes na próxima quarta-feira, 8.

”Vamos recuperar junto com a Suzano e o MST esse acordo feito há dez anos e teremos reuniões para fazer a negociação. Faltou governo para implementar e é assim que vamos resolver, de forma tranquila. Vamos tratar os conflitos buscando que sejam resolvidos mediante diálogo e dentro da Constituição”, disse.

Os ânimos entre o MST e o governo acirraram desde a última semana, quando lideranças do movimento reclamaram publicamente da demora do governo na nomeação da diretoria do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que é responsável pelas políticas de distribuição e titulação de terras. Na última semana, João Paulo Rodrigues coordenador do MST disse que o “sinal amarelo” acendeu com a demora da nomeação.

Na segunda-feira (27), somente após a insatisfação pública do MST, o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar anunciou que César Aldrigui, até então interino, assumirá a presidência do instituto.

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Teixeira negou a ligação das invasões com o atraso na nomeação da diretoria do Incra. “Não tem nenhuma conotação dessa natureza. Primeiro lugar que cargos do Incra já foram todos resolvidos. Claro, tem um procedimento para nomear os cargos, a pessoa passa por um estudo pela vida pregressa. Mas, os nomes já foram todos encaminhados, então não é disso que se trata. Direção do Incra está definida. Se trata de um conflito na Bahia que agora vou me debruçar sobre isso.”

O ministro disse ainda que a pasta irá trabalhar para tentar antecipar os novos conflitos rurais e que não há nenhum problema com o setor do agronegócio.

Evanildo Costa, da direção nacional do MST na Bahia, disse que o ministro entrou em contato com lideranças do movimento propondo a desocupação das áreas para uma retomada do acordo com a Suzano. “Ainda não decidimos, estamos esperando que haja confirmação da empresa de que vai à reunião. Se houver, vamos acampar no limite da área até que haja um acordo. O que vamos interromper é o avanço da ocupação, como a entrada de mais famílias e a formação de roça no terreno”, afirmou.

A Suzano confirmou que houve a reunião de seu diretor com o ministro Paulo Teixeira, mas que foi colocada como condição precedente para a negociação que o MST saia das áreas, pois considera que é indiscutível o direito à propriedade privada, como previsto na Constituição, ainda mais se tratando de propriedade produtiva. A empresa disse que não descumpriu o contrato firmado em 2011 e que está à disposição para negociar e construir soluções.

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Conflito desde a década de 1970

O conflito entre as empresas de celulose e pequenos agricultores começou no final da década de 1970, quando o norte do Espírito Santo e o sul da Bahia passaram a receber projetos voltados para a produção de celulose. Na década de 1990, com os movimentos de luta pela terra mais organizados, houve um acirramento nas disputas.

Em 2007, duas mil famílias do MST ocuparam a Fazenda Céu Azul, da Suzano, em Teixeira de Freitas, e derrubaram cerca de 30 mil pés de eucaliptos, desmatando uma área de 20 hectares. A mesma fazenda tinha sido ocupada pelos sem-terra em 2006.

Em 2010, segundo dados do Incra na época, havia 33 propriedades das empresas ocupadas na região – três da Suzano, cinco da Fibria e 22 da Veracel.

Partiu do então governador baiano Jacques Wagner (PT) a proposta de um acordo para a solução negociada dos conflitos – em 2009, ele havia decretado moratória nos despejos na região. Ficou acertado que o Incra compraria uma parte das terras para assentar as famílias e as empresas cederiam outra parte. O primeiro assentamento fruto desse acordo foi instalado em 2015, no município de Prado.

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Ainda na gestão da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), o Incra deixou de dar a sua contrapartida para a aquisição de novas áreas para assentamentos. De acordo com o MST, apenas do movimento, 450 famílias ficaram sem receber o lote de 10 hectares. Nos quatro anos do governo de Jair Bolsonaro (PL), os assentamentos pararam de vez.

A acordo entre a Suzano e o MST aconteceu no governo de Dilma Rousseff (PT). A reportagem apurou que o acordo previa que a Suzano cedesse uma área para assentar 250 famílias. De acordo com o MST, essa parte foi cumprida. Já a contrapartida do Incra para assentar outras 400 famílias não aconteceu. O Incra informou que está fazendo o levantamento das atas de conciliação agrária para apurar as responsabilidades por eventual descumprimento do acordo.

Processo de inventário

A Fazenda Limoeiro, em Jacobina, também invadida pelo MST, pertence à família Pires e está em processo de inventário. Segundo Felipe Pires, neto dos proprietários, a área é da família há mais de 60 anos e trabalha com pecuária. “Somos uma família do trabalho, temos gado lá dentro, nossa família vive trabalhando incansavelmente desde o tempo do meu avô e nunca invadimos o que é dos outros”, disse.

A família entrou com ação de reintegração de posse e aguarda a decisão judicial. “Tentamos resolver com conversa, mas eles (MST) estão irredutíveis”, disse. O Sindicato Rural de Calmon Miguel, cidade da região, convocou os produtores para prestar solidariedade à família. A Federação de Agricultura e Pecuária da Bahia (Faeb) enviou ofício ao secretário de Segurança Pública, Marcelo Werner, pedindo providências com relação ao ocorrido.

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