O governo Bolsonaro foi obrigado a se posicionar nesta quinta-feira, 19, sobre as declarações do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que responsabilizou a China pela pandemia do novo coronavírus e provocou uma crise diplomática com o país que é o principal parceiro comercial do Brasil. Planalto e Itamaraty procuraram dissociar o fato do governo, mas a representação chinesa no País manteve o tom crítico ao filho do presidente Jair Bolsonaro. O episódio gerou constrangimento a autoridades políticas do País.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pediu desculpas ao embaixador chinês no Brasil, Yang Wanming, “pelas palavras irrefletidas” do deputado. Em nome do Senado, o vice-presidente da Casa, Antonio Anastasia (PSD-MG), enviou uma carta a Wanming também se desculpando e reforçando “respeito” ao povo chinês. A manifestação foi feita a pedido do presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que está em quarentena após ser diagnosticado com coronavírus.
Wanming reagiu indignado a uma publicação de Eduardo na qual o parlamentar diz que a culpa do alastramento do novo coronavírus é China, que teria controlado informações e não trabalhado desde o início para conter a propagação do vírus. O embaixador chinês repudiou a declaração e afirmou que o deputado “contraiu um vírus mental” em Miami.
Já o ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, publicou no Twitter nota na qual aponta que as posições de Eduardo “não refletem” a do governo. Para o chanceler, a reação de Wanming foi “desproporcional” e feriu “a boa prática diplomática”.
Segundo ele, o governo espera, agora, uma retratação por parte do embaixador da China. Ainda segundo Araújo, o filho do presidente não “ofendeu o chefe de Estado chinês”. Em nota divulgada à noite, a Embaixada da China disse que não aceitou o gesto de Araújo e cobrou desculpas de Eduardo.
O vice-presidente Hamilton Mourão tentou minimizar o impacto da fala de Eduardo. “(A declaração) não é motivo de estresse, pois a opinião de um parlamentar não corresponde à visão do governo. Nenhum membro do governo tocou nesse assunto”, disse Mourão ao Estado. O vice-presidente teve papel decisivo na reaproximação do Brasil com a China, após o país asiático ser alvo de declarações hostis de Bolsonaro ao longo da campanha eleitoral.
O presidente, que tentou emplacar o filho como embaixador em Washington, não se posicionou. Eduardo, por sua vez, recuou da própria postagem. “Jamais ofendi o povo chinês”, disse, em nota. “Compartilhei postagem que critica a atuação do governo chinês na prevenção da pandemia, principalmente no compartilhamento de informações que teriam sido úteis na prevenção em escala mundial.”
Além de culpar a China pela pandemia, Eduardo comparou o coronavírus a Chernobyl e disse que o governo Xi Jinping, chamado por ele de “ditadura”, escondeu a epidemia. “A comparação entre o coronavírus e a tragédia da usina nuclear de Chernobyl não é novidade. Ambos ocorreram em países cuja liberdade de expressão e imprensa eram/são limitados pelo governo.”
Segundo o Ministério da Economia, o fluxo de comércio do Brasil com a China é de cerca de US$ 100 bilhões. Os chineses respondem por 27,8% das exportações e 20% das importações, o primeiro país tanto nas vendas como nas compras. Em outubro do ano passado, ao chegar à China, Bolsonaro afirmou que estava em um país “capitalista” e que a ampliação do comércio entre os dois países era “a prioridade número um”.
Nesta quinta-feira, 19, embaixada da China no Brasil voltou a rebater Eduardo. No Twitter, afirmou que as palavras do deputado são “absurdas”, “preconceituosas” e “irresponsáveis”. “A história nos ensina que quem insiste em atacar e humilhar o povo chinês, acaba sempre dando um tiro no seu próprio pé.”
Aconselhou ainda que o parlamentar busque informações científicas em fontes sérias, como a OMS. “Você afirma que foi eleito pelo povo, mas fica a pergunta: será que está cumprindo os seus deveres como deputado?” / DANIEL WETERMAN, GREGORY PRUDENCIANO, JUSSARA SOARES, MATHEUS LARA e NICHOLAS SHORES
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