BRASÍLIA — Ao retornar ao Brasil, o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, demonstrou a aliados que não tem como justificar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva o uso do avião da Força Aérea Brasileira (FAB) e o recebimento de diárias para ir a eventos de cavalo em São Paulo alegando tratar-se de uma agenda “urgente”. Diante disso, o grupo do ministro no União Brasil iniciou uma operação neste final de semana para tentar segurar Juscelino no cargo ou assegurar que a vaga fique com a sigla caso a substituição seja consumada. A operação tenta dar uma conotação política para o episódio dizendo que o partido está sob “fogo amigo” do PT.
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A boia de salvação para o ministro começou a ser atirada na quinta-feira, 2, quando ele rompeu o silêncio sobre o tema e, em nota oficial, admitiu ter recebido diárias para agendas privadas nos eventos de cavalos e anunciou a devolução do dinheiro aos cofres públicos. A decisão ocorreu três dias depois de o Estadão revelar o caso e no mesmo dia em que Lula afirmou em entrevista à Band que irá demiti-lo caso não se explique sobre o assunto em reunião na segunda-feira, 6.
O segundo movimento da operação para salvar a vaga foi feito neste sábado quando o ministro usou o Twitter para dizer que “está comprometido em esclarecer as denúncias infundadas” sobre ter pedido ao governo jatinho e diárias para ir a compromissos privados em São Paulo. Foi bombardeado com comentários de “pede pra sair”.
Neste domingo, o grupo político do ministro no União Brasil divulgou uma nota com críticas à presidente do PT, Gleisi Hoffmann, por ter defendido que o ministro tome a iniciativa de deixar o governo e evite constrangimentos a Lula de ter que tomar a iniciativa. Na nota, o União Brasil disse que “o ministro sempre teve uma atuação respeitada no parlamento”, não comentou o episódio dos cavalos, e acusou a deputada de incoerência ao relembrar o envolvimento de petistas em episódios de corrupção.
“Quando atitudes dos seus aliados são contestadas — e não faltaram acusações a membros do PT na história recente do País — a parlamentar prega o direito de defesa. Quando a situação se inverte, prefere fazer pré-julgamentos”, destacou a nota assinada pelo deputado Elmar Nascimento (BA) e pelo senador Efraim Filho (PB), líderes do União Brasil na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, respectivamente, e padrinhos da indicação de Juscelino. Na última semana, o Estadão mostrou que o ministro não tem o apoio total do partido. Segundo o deputado Carlos Henrique Gaguim (União-TO), ele não reuniria o apoio de 30 parlamentares da legenda.
Questionada em entrevista do site Metrópoles sobre o episódio envolvendo o ministro das Comunicações na sexta-feira, 3, Gleisi afirmou: “Olha, em situações como essa, eu acho que o ministro devia pedir um afastamento para poder explicar, justificar, se for justificável o que ele fez. Isso impede o constrangimento de parte a parte.”
“Será que a presidente Gleisi fará a mesma declaração caso um integrante do seu partido seja alvo de ataques?”, afirmaram os líderes do União Brasil no Congresso.
Parlamentar do baixo clero, quando deputado Juscelino dedicou seu mandato aos cavalos. O único projeto de lei apresentado por ele 2022, por exemplo, foi a criação do dia nacional do cavalo. Próximo de caciques como o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), Juscelino foi um dos deputados que mais receberam orçamento secreto no Maranhão. O esquema pelo qual o ex-presidente Jair Bolsonaro comprou votos no Congresso foi chamado de “corrupção” por Lula na campanha e interrompido por decisão do Supremo. Como mostrou o Estadão, Juscelino mandou dinheiro para asfaltar a estrada que leva à sua fazenda em Vitorino Freire (MA). Enquanto isso, 1/3 dos moradores da cidade seguem vivendo em ruas de terra.
O Estadão mostrou também que ele escondeu da Justiça Eleitoral ter patrimônio de R$ 2 milhões em cavalos de raça que ficam num haras na mesma cidade da fazenda. O ministro nunca justificou a razão de ter escondido os bens na Justiça.
Esvaziada
Para contemplar o União Brasil, o governo Lula esvaziou o Ministério das Comunicações. O ministro não participa, por exemplo, da principal discussão da sua área, a regulação das big techs. A secretaria de política digital, que sempre foi vinculada ao ministério, foi transferida para a Secretaria de Comunicação Social (Secom). Mesmo assim, Secom e Casa Civil fazem reuniões e tratam do assunto com vários ministérios, menos com a presença da pasta de Juscelino.
O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, tentou contornar o escanteamento do colega, mas os demais ministros da área política conseguiram convencer o presidente Lula de excluir a pasta de Juscelino desse debate. Sem apoio no seu partido e sem conhecimento na área, Juscelino aceitou ser um ministro esvaziado e tocar temas mais paroquiais ligados à radiodifusão e Telecom, onde sobrou pouca novidade uma vez que o leilão do 5G já fora executado no governo Bolsonaro.
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