Grupo que apoiou Lula na prisão em Curitiba compõe núcleo de conselheiros do petista; saiba quem são

Aliados fortaleceram vínculo com o presidente na capital paranaense e agora possuem influência e interlocução direta, com poder para indicar nomeações e decisões de governo

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Os 580 dias de prisão na Operação Lava Jato moldaram um núcleo restrito de auxiliares e conselheiros de Luiz Inácio Lula da Silva. Este seleto e heterogêneo grupo, formado por quem Lula considera que lhe foi mais fiel e não lhe deu as costas durante seu momento mais dramático – quando parte do PT começava a debater quem herdaria seu espólio político –, exerce agora poder e acesso privilegiado ao presidente em seu terceiro mandato.

A integrantes da chamada “República de Curitiba” se atribui a indicação de ministros e papel de interlocutores de Lula, com o poder de influenciar nomeações e decisões de governo.

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Este círculo de confiança não é coeso. Não raro, seus integrantes disputam poder e cargos no Palácio do Planalto. É possível comparar a atuação de nomes mais destacados deste grupo com atribuições que, no passado, exerceram ex-ministros petistas como José Dirceu e Antonio Palocci – ambos atingidos por escândalos de corrupção.

Agora, porém, o grau de influência é considerado menor porque Lula tem se mostrado mais centralizador em suas decisões. Mesmo assim, em diferentes medidas, a “República de Curitiba” participou da formação do primeiro escalão e esboços iniciais da política econômica.

Dona de um gabinete no Palácio do Planalto, a primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, fez parte da vigília que acampou ao lado da Superintendência da PF em Curitiba. O namoro foi revelado pelo ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, em suas redes sociais, após uma visita a Lula na prisão, em maio de 2019. Lula e a socióloga se casaram três anos depois, em maio do ano passado. Desde a campanha eleitoral, Janja chamou a atenção e gerou ciúmes pela participação ativa, interferindo na organização de eventos e até na estratégia de comunicação.

No governo, seu poder ficou mais evidente. Foi organizadora da cerimônia de posse e porta-voz da divulgação de seu cronograma. Sua palavra teve peso na escolha da ministra da Cultura, Margareth Menezes. É presença constante em reuniões do alto escalão e eventos públicos de Lula.

Desde 2017 na presidência do PT com apoio de Lula, Gleisi Hoffmann recebeu procuração da defesa do petista na Lava Jato para ter o direito de visitá-lo na condição de advogada pessoal. Encampou duras críticas aos principais agentes da operação durante o período de mais alta popularidade das investigações, e pagou preço eleitoral nos últimos anos. Deixou de ser senadora e passou a se candidatar como deputada federal – foi reeleita em 2022.

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Gleisi não tem cargo no Planalto. Mas é ouvida por Lula em decisões importantes. Para a Secretaria-Geral da Presidência, emplacou a nomeação do ex-deputado Márcio Macêdo (PT), que foi tesoureiro do partido. A Secretaria-Geral era cobiçada por amigos próximos de Lula, como o coordenador do Grupo Prerrogativas, Marco Aurélio Carvalho, e o deputado estadual Emídio de Souza (PT). Partiu de Gleisi, por exemplo, o alerta para o presidente sobre o anúncio de seus primeiros quatro ministérios sem a presença de mulheres, no começo de dezembro.

Nas redes sociais e em declarações públicas, ela costuma fazer dobradinha com Lula, como quando torpedeou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Também se notabiliza por vocalizar o fogo amigo petista no governo. Entrou, por exemplo, em rota de colisão com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao se manifestar abertamente contra a reoneração dos combustíveis. Inicialmente, havia expectativa de aumento em até R$ 0,69 no preço da gasolina. Após a intervenção de Gleisi, e a mediação de Lula, o incremento ficou em R$ 0,34. À sua maneira, o ministro se vê vitorioso por ter evitado que a reoneração fosse totalmente descartada.

Os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Fernando Haddad (Fazenda) formam o núcleo duro do terceiro mandato do presidente Lula Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO - 10/03/2023

Haddad é outro remanescente da fase Lula preso. O ministro da Fazenda reabilitou sua carteira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para poder visitar o então ex-presidente na prisão, em 2018, quando também se sujeitou a uma difícil campanha eleitoral contra Bolsonaro no auge da crise do PT durante a Lava Jato. Em 2022, entrou nas eleições consciente da difícil tarefa de disputar o governo de São Paulo, Estado historicamente resistente ao partido.

Considerado em todas as apostas o favorito para substituir Ricardo Lewandowski no Supremo Tribunal Federal (STF), Cristiano Zanin conheceu Lula por meio de seu sogro, Roberto Teixeira, antigo compadre do petista – para quem emprestou até casa nos anos 1980. Hoje, o advogado está rompido com o sogro, mas em alta com Lula. Defendeu o petista na Lava Jato, e obteve a anulação de seus processos.

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O presidente sempre quis usar a defesa para desmoralizar as acusações, e foi por meio da declaração de parcialidade do ex-juiz (atual senador) Sérgio Moro que encerrou suas pendências com a Justiça. Zanin detém este crédito com Lula. Deixou de ser apenas defensor nos autos para tornar-se conselheiro próximo do presidente para assuntos jurídicos e integrou a equipe de transição do governo.

Neste meio, Lula também mantém contato com alguma frequência com Marco Aurélio de Carvalho, que militou contra sua prisão na Lava Jato. No Prerrogativas, ele antagoniza com os principais agentes das investigações, alguns que agora estão na política.

O cientista político Carlos Melo, do Insper, avalia que a “cozinha do poder” de Lula em 2003 era mais qualificada, com quadros que vinham de uma formação política robusta, como os ex-ministros Luiz Gushiken e Márcio Thomaz Bastos – muito influentes no primeiro mandato. Segundo ele, a postura mais centralizadora do petista demonstra cautela diante de um País que não tem os recursos políticos que já teve no passado.

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E o entorno do presidente naquela época era composto por pessoas que o conheciam desde os tempos de líder sindical. “Isso dava uma proximidade, uma facilidade para ser crítico. Hoje não é a mesma coisa. Essa ‘República de Curitiba’ são pessoas que têm com Lula uma relação de deferência, que o conheceram como presidente ou ex-presidente, ou seja, depois do poder.”

Zanin foi advogado de Lula durante a Lava Jato, virou conselheiro do petista para assuntos jurídicos e está cotado para o STF Foto: FELIPE RAU/ESTADÃO - 05/04/2018

Assessores próximos durante prisão ganham cargos no governo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não tem celular. Para ligar e receber chamadas, recorre aos aparelhos de seu assessor, Marco Aurélio Santana Ribeiro, conhecido como Marcola, do seu segurança Valmir de Moraes, e da mulher, Janja. Todos acompanharam o petista nos 580 dias de detenção em Curitiba.

Marcola se mudou para o Paraná logo após a prisão, em 2018. Lá, casou-se com a jornalista Nicole Briones, que foi responsável pelas redes sociais de Lula no período e também se mudou às pressas para a capital paranaense. Era por meio de troca de bilhetes intermediada por advogados ligados a Roberto Teixeira que ela recebia de Lula os recados que queria dar à militância nas redes sociais.

Nicole hoje integra os quadros da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Marcola chefia o gabinete presidencial. Ao lado do fotógrafo Ricardo Stuckert, aproximaram-se ainda mais do petista durante a pandemia, quando frequentaram com assiduidade a casa onde ele morou com Janja, em São Bernardo do Campo. Presença frequente na casa, Stuckert é secretário nacional de Audiovisual.

Valmir Moraes, que também empresta o telefone a Lula, é segurança do presidente desde 2005, em seu primeiro mandato. Era dele, aliás, um dos celulares grampeados na Operação Lava Jato quando o petista era investigado. Ele e outros seguranças estiveram com Lula na prisão. Todos foram prestigiados na posse, quando acompanharam o Rolls Royce que levou o presidente e a primeira-dama durante desfile na Esplanada dos Ministérios.

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