BRASÍLIA - A Associação Proarmas, a mais representativa da classe de colecionadores de armas, atiradores esportivos e caçadores (CACs), tem feito sorteios de pistolas e fuzis para atrair novos membros. Sortear armas de fogo e munições é expressamente proibido por um decreto governamental de 1972 e por uma portaria do Ministério da Economia, de 2020. Como revelou o Estadão, a entidade atua para eleger no Congresso a “bancada dos CACs”, maior grupo armado do País, e criar um partido politico que milite pela bandeira de armar a população.
O grupo de CACSs já têm pelo menos 34 pré-candidaturas a deputado federal, senador e governador, todas de nomes ligados ao Proarmas. Também pretende eleger deputados estaduais. Outros 23 candidatos apoiados pela associação já anunciaram que vão concorrer nas eleições deste ano. Essa é a primeira vez que os CACs, um grupo que ganhou força e se expandiu no governo do presidente Jair Bolsonaro, se organiza nacionalmente para ocupar vagas no Legislativo.
Os CACs já representam um contingente maior do que o número de policiais militares no Brasil. Por conta do estímulo do governo à política armamentista, existem hoje 673 mil CACs registrados. Em 2018, eram 117 mil. Somando todos os Estados, estão em atividade 406 mil policiais militares. Nas Forças Armadas, o contingente é de 360 mil homens.
O Proarmas é presidido pelo advogado Marcos Pollon (PL-MS). Aliado de Eduardo Bolsonaro (PL-SP), ele anunciou sua pré-candidatura a deputado federal após ser recebido pelo presidente Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto. Pollon é o principal articulador da “bancada de CACs” em Brasília. Após a publicação da reportagem do Estadão sobre a articulação de uma nova bancada no Congresso, Pollon divulgou o texto em suas redes sociais.
A reportagem enviou um e-mail para o endereço oficial da Proarmas em busca de detalhes sobre um dos “pacotes de serviços” e perguntou se os sorteios mensais prometidos eram de pistolas. A assinatura de R$ 150 por mês dá direito a uma série de benefícios como auxílio jurídico em caso de abordagem policial a CACs e em processos para compra e registro de armas.
“Os objetos sorteados variam de acordo com a disponibilidade (marca, modelo, etc.). Em suas lives, o Dr. Pollon costuma divulgar quais são”, respondeu uma funcionária. Em seguida, o Estadão perguntou se eram sempre pistolas ou se poderiam ser também outros objetos. “Pode ser pistola, rifle, fuzil... não temos uma lista fixa, pois dependemos da disponibilidade e viabilidade do objeto”, admitiu a representante da organização.
Para promover os sorteios, a entidade, publicamente, recorre a eufemismos e utiliza termos como “furadeira” e “guarda-chuva” para se referir a pistolas e a fuzis. Nos anúncios em redes sociais, as “furadeiras” são do modelo G17 da Glock. Trata-se de uma pistola produzida pela indústria estrangeira. Site da Proarmas falava em sorteio para afiliados. Após questionada pela reportagem, entidade mudou o texto da página para “concurso cultural”.
A assessoria de Marcos Pollon afirmou ao Estadão que a entidade não faz nenhum tipo de sorteio, somente dá “prêmios para alguns alunos da plataforma de cursos em um concurso cultural com diversos objetos, inclusive armas”. A versão contradiz o que era apresentado no site da organização. “Nesta categoria você participará de um sorteio por mês, terá acesso a cursos online e poderá tirar suas dúvidas através de um contato exclusivo”, dizia a descrição do plano vendido a R$ 100 mensais.
A reportagem mostrou a informação contraditória ao Proarmas em um pedido de esclarecimentos. Dias depois, a página trocou a informação de sorteio para “concurso cultural de objetos”. “Ainda que houvesse sorteios de armas, não à (sic) irregularidade nenhuma desde que seja feito para pessoas habilitadas obtê-las”, informou.
A assessoria da Proarmas também foi questionada sobre a resposta em email oficial confirmando o sorteio de pistolas, rifles e fuzis. Alegou que foi um “erro” da funcionária, que não integra mais a equipe. “O Proarmas não sorteia armas, apenas premiamos alguns alunos da plataforma de cursos em um concurso cultural com diversos objetos, inclusive armas. Qualquer informação diferente disso configura FAKENEWS acarretando a responsabilização judicial nas esferas cível e criminal e demais combinações de estilo!”, diz nota da associação.
A entidade reuniu milhares de pessoas em Brasília, no último dia 9, para um ato em favor do armamento da população. Na ocasião, Marcos Pollon também teria prometido sortear uma arma para aumentar a adesão à manifestação. O caso foi denunciado ao Ministério Público Federal pelo advogado Douglas Belchior.
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