BRASÍLIA - Responsável por contratos com o governo federal que somam mais de R$ 1 bilhão, a R7 Facilities, que atua dentro de presídios federais do País, afirma em balanços fazer negócios com empresas com indícios de serem fantasmas. A companhia, registrada em nome de um laranja, diz ter sido contratada para serviços que somam R$ 40 milhões por duas firmas que não funcionam nos endereços que informam à Receita Federal.
A R7 Facilities é responsável por obras de manutenção no presídio federal de Mossoró (RN), de onde duas pessoas ligadas ao Comando Vermelho fugiram no último dia 14. Conforme revelou o Estadão, a empresa tem um faturamento milionário, mas está registrada em nome de um técnico em contabilidade que recebeu 12 parcelas do auxílio emergencial durante a pandemia da covid-19. Gildenilson Braz Torres mora em uma casa simples na periferia do Distrito Federal e tinha apenas R$ 523,64 em suas contas bancárias, segundo ação de execução fiscal de fevereiro de 2022.
Em nota, a R7 Facilities informou que tem um “histórico inquestionável de excelência na prestação de seus serviços”, mas não explicou supostos serviços com empresas que não existem. A empresa ressaltou que “se reserva o direito de não fazer comentários sobre o setor privado, nem sobre seus contratos nem sobre empresas parcerias”.
Em uma relação de contratos com órgãos públicas e privados entregue ao governo federal, obtida pelo Estadão, a R7 Facilities informou prestar serviços para duas empresas com indícios de serem de fachada: a G&G Empreendimentos Imobiliários e a Falcon Facilities.
A suspeita de especialistas em serviços de terceirização já levada a técnicos do governo é a de que os contratos podem ter sido simulados para inflar balanços e ajudar a R7 a usar o benefício da desoneração da folha de pagamento para oferecer preços mais vantajosos em processos licitatórios. A Controladoria-Geral da União (CGU) investiga a atuação das empresas.
A G&G Empreendimentos Imobiliários tem como endereço um escritório num prédio comercial na área central de Brasília. No local funciona uma outra firma, a Siello Tecnologia, que pertence ao advogado Alair Ferraz, ligado ao ex-deputado distrital Carlos Tabanez, apontado como o verdadeiro dono da R7 Facilities. Uma funcionária que trabalha no escritório da Siello disse à reportagem desconhecer a G&G.
No papel, a G&G pertence a Eliseuma Costa Alves, a Elis. Ela é dona de uma clínica de estética e não soube dar informações sobre a companhia. Em seu Linkedin, ela conta ter sido funcionária da B2B, uma outra empresa do mesmo grupo apontado em reportagem do Estadão e que entrou na mira da Controladoria-Geral da União (CGU) por suspeitas de conluio e de fraude em licitações.
A reportagem encontrou Elis em sua recém-inaugurada clínica, num prédio em Taguatinga, região administrativa do DF. Ela deu informações equivocadas sobre a operação da G&G Empreendimentos Imobiliários e sequer sabia da existência da R7 Facilities, com quem teria um contrato de R$ 26,8 milhões.
A empresa que eu tenho no meu nome é essa, a Livraderme. A G&G... sobre terceirização, né, que a gente presta serviço... Mas aí é o caso que eu tenho que estar com meu advogado próximo, né. Como eu vou ficar assim informando sobre [a empresa]?”
Eliseuma Alves, no papel, dona da G&G
Segundo dados da Receita, a G&G não presta serviços de terceirização. Na verdade, ela atua com incorporação de empreendimentos imobiliários, cultivo de grãos e criação de animais.
Por fim, Eliseuma indicou o advogado Amom Figueiredo para comentar sobre o assunto como representante da G&G. Amom é aliado de Tabanez e diretor operacional da R7 Facilities. O vínculo de Amom com a G&G e, ao mesmo tempo, com a R7 reforça indícios de atuação conjunta do grupo. Procurados, eles não quiseram comentar.
Já a Falcon Facilities, outra empresa que teria contratado a R7 Facilities por R$ 13,8 milhões, está registrada em um prédio na região do Núcleo Bandeirantes. No local funcionam outras duas empresas, a B2B e a AC Segurança. Dois colaboradores negaram à reportagem a existência da Falcon no local.
A Falcon tem como advogado em processos na Justiça Alair Ferraz. Na Receita Federal, o administrador é Nathan Almeida, o Nanau. Ele fez campanha em suas redes sociais para Tabanez nas eleições de 2022. O ex-policial conseguiu 14,5 mil votos, insuficientes para assumir uma cadeira na Câmara Legislativa do Distrito Federal. Procurado na residência onde mora e por meio de um aplicativo de mensagens, Nanau não se manifestou e bloqueou a reportagem.
Falcon, G&G, R7 Facilities, B2B, AC Segurança e outras seis empresas são suspeitas de integrarem um esquema bilionário de terceirização envolvendo o uso de laranjas, empresas de fachadas e fraudes em licitações. O desenho do grupo aponta sempre para os mesmos articuladores: o ex-policial civil Carlos Tabanez e o empresário Edison Júnior, o Edinho.
Players do mercado afirmam que os contratos feitos pela R7 Facilities com empresas do mesmo grupo, incluindo firmas de fachada, desrespeitam os princípios da legalidade, isonomia e da moralidade que regem os processos licitatórios.
Um dos benefícios conquistados com esses contratos fictícios seria a desoneração da folha de pagamento. “Concomitantemente, verificou-se que a empresa R7, apesar de afirmar se beneficiar da desoneração tributária, não preenche os requisitos legais e regulamentares necessários para tal benefício, o qual, vem sendo utilizado para vencer licitações sem poder, de forma indevida, ilegal e arbitrária”, informou um concorrente no âmbito de um recurso apresentado ao Ministério da Gestão.
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Além da G&G Empreendimentos Imobiliários e da Falcon, a R7 Facilities tem contratos de R$ 32,2 milhões com a Qualifoco e de R$ 37 milhões com a B2B, todos nas áreas de “manutenção e reforma” e “manutenção predial”. A Qualifoco já pertenceu a Wesley Fernandes Camilo, um brigadista morador da periferia de Brasília que foi o primeiro laranja para o qual a R7 foi transferida, em 2021.
Procurada, a Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República informou que a Controladoria-Geral da União (CGU) abriu uma investigação sobre as seis empresas do grupo que têm contratos com o governo federal. A R7 Facilities já é investigada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), após o Estadão revelar que a firma está registrada em nome de um laranja. O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) informou ter acionado os órgãos federais competentes para apurar o caso.
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