BRASÍLIA – Um impasse em torno das indicações de nomes para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) mantém a influência do senador bolsonarista Ciro Nogueira (PP-PI) sobre o órgão, que é responsável pelo controle de qualidade de alimentos e medicamentos vendidos no País. Crítico do governo Lula (PT), Ciro é próximo de um diretor da agência, Daniel Pereira – a mulher dele, Julia Pesse, é assessora de Nogueira. Enquanto as indicações do governo petista não são votadas no Senado, Daniel acumula duas diretorias da Anvisa e garante a influência do senador no órgão.

No dia 17 de dezembro passado, o governo mandou ao Senado as indicações de 17 nomes para várias agências reguladoras. Para a Anvisa, foram propostos os nomes de Leandro Pinheiro Safatle, como diretor-presidente; e de Daniela Marreco Cerqueira e Diogo Penha Soares, como diretores – a definição sobre quem ocupará cada uma das diretorias é feita posteriormente, depois que os nomes são confirmados nos cargos.
As indicações do governo serão discutidas na manhã desta quinta-feira (20), numa reunião marcada para as 11h no Palácio do Planalto. O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro da Saúde, Alexandre Padilha (PT) tratarão do tema com representantes da Farmabrasil, uma organização que representa a indústria farmacêutica.
Uma possibilidade é que um dos indicados pelo governo seja substituído por Danitza Passamai Rojas Buvinich, servidora de carreira da agência e que, atualmente, ocupa interinamente a Terceira Diretoria da Anvisa. Ela é próxima a Daniel Pereira.
A Anvisa é dividida em cinco áreas: o gabinete do presidente e mais quatro diretorias. Sem a aprovação dos nomes indicados pelo governo, Daniel Pereira está chefiando temporariamente duas delas (a Segunda e a Quinta Diretorias). A Segunda Diretoria é a mais relevante da agência, por controlar a área relativa a medicamentos. Advogado de formação, Pereira também supervisiona temas como qualidade de alimentos, produtos biológicos, e o monitoramento da entrada de substâncias no país por meio de portos e aeroportos.
Além de Ciro Nogueira, Daniel Pereira também é próximo do ex-ministro da Saúde do governo de Jair Bolsonaro (PL), o médico cardiologista Marcelo Queiroga. Ele foi o nº 2 de Queiroga na passagem do médico pelo Ministério da Saúde. Na Anvisa, Pereira tem mandato até 24 de julho de 2027, já depois do fim do primeiro mandato de Lula.
Para chegarem aos cargos, os indicados precisam ser sabatinados por comissões temáticas no Senado. No caso da Anvisa, as sabatinas são na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), atualmente presidida pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI). Além de conterrâneo de Ciro Nogueira, Castro mantém boa relação com o presidente nacional do PP. Pelo lado do Palácio do Planalto, o responsável pelas negociações com Castro é o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).

A reportagem do Estadão procurou Daniel Pereira e os senadores Ciro Nogueira e Marcelo Castro para comentários, mas eles não quiseram se pronunciar.
Se os três indicados pelo governo forem aprovados pelo Senado, o Planalto passa a ter maioria na diretoria da agência. Atualmente, a Anvisa só tem dois diretores: Daniel Pereira e Rômison Rodrigues Mota, que hoje atua como diretor-presidente e que também comanda a Quarta Diretoria. Rômison é ligado ao ex-presidente da Anvisa indicado por Bolsonaro, Antônio Barra Torres. Dentre os indicados pelo governo, a única aprovação dada como certa é a de Leandro Safatle. Ele é servidor concursado desde 2011, e atualmente ocupa o cargo de secretário-adjunto na Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação do Ministério da Saúde. É também irmão do filósofo marxista Vladimir Safatle, professor da Universidade de São Paulo (USP).
Os outros dois nomes apontados pelo governo do presidente Lula são os de Daniela Marreco Cerqueira, atual secretária-executiva da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos; e Diogo Penha Soares, que atualmente trabalha na secretaria chefiada por Safatle no Ministério da Saúde. Ambos são servidores de carreira da Anvisa. Diogo Penha Soares é politicamente próximo do governo petista, enquanto Daniela Marreco Cerqueira foi indicada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). A indicação de um dos dois pode acabar caindo – já a de Safatle é dada como certa.
No fim de janeiro deste ano, o Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Nacionais de Regulação (Sinagências) formulou uma representação ao procurador-geral da República, Paulo Gonet, contra a acumulação dos cargos por parte de Daniel Pereira e Rômison Rodrigues. O sindicato, que representa os servidores da Anvisa e das outras agências reguladoras, defende que os cargos vagos sejam ocupados por servidores de carreira, até que o indicados sejam sabatinados.