O Supremo Tribunal Federal provou mais uma vez, agora com uma explosão de cólera mal-educada, sem cabimento e com sintomas de histeria, que não aceita a existência de Três Poderes na República brasileira. Diz, o tempo todo, que é o único responsável pela manutenção do “estado democrático de direito”, pela defesa das “instituições” e até por “salvar vidas” durante a Covid. Mas abandona-se às mais indignadas crises de nervos assim que o Poder Legislativo tenta exercer as funções que a Constituição lhe deu. É o que está acontecendo. O Senado aprovou uma modificação constitucional que limita as decisões individuais dos ministros na anulação de leis aprovadas pelo Congresso. Tem o direito indiscutível de fazer o que fez. Mas o STF e o seu sistema de apoio entraram em transe – e declararam guerra ao Senado.
Os senadores foram chamados de “pigmeus morais” pelos ministros. Foram acusados de “ameaçar” o STF. Foram descritos como um “tacão autoritário”. Nada disso faz qualquer nexo no plano das ideias. Acusou-se a medida de ser “inócua” – e ao mesmo tempo “inadmissível”. Um ministro achou necessário dizer que “essa Casa não é composta de covardes”. E alguém disse que é? Falou-se em “ameaças”. Quais? O presidente do STF queixou-se de que as instituições não podem resistir “se cada setor que se sentir contrariado por decisões do tribunal” quiser mudar a sua estrutura e o seu funcionamento. “Contrariado”? Quantas vezes o Senado aprovou alguma lei porque estava chateado com decisões do STF? Também não dá para entender a lógica do ministro. E o próprio STF? Não está neuroticamente contrariado, neste exato momento, com uma decisão do Senado? Vamos ter esse escândalo todo, então, a cada vez que o Congresso aprovar alguma coisa que desagrade os ministros?
O fato é que as “instituições” e a “democracia” não têm nada a ver com isso – o que realmente perturbou o STF foi a percepção de que o Senado, pelo menos, está tentando contestar o poder sem limites dos ministros, e os seus interesses políticos e pessoais. O STF se meteu numa aventura complicada nesses últimos anos: governar o Brasil sem a necessidade de obter um único voto, sem prestar contras a ninguém, nunca, e sem a obrigação de cumprir a lei. Não quer, agora, abrir mão de nada disso – muito menos num dos piores momentos de sua história, quando tenta ocultar suas responsabilidades pela morte de um preso que estava sob sua custódia exclusiva. Vai ter de brigar, e não só com os senadores “bolsonaristas”. Está vendo, inclusive, o presidente Lula dar o seu apoio efetivo à emenda do Senado. Precisam se entender com ele – e com muita gente mais.
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