Além de Bolsonaro, quem são e o que fizeram os outros 7 que serão julgados pelo STF após denúncia

STF vai decidir no próximo dia 25 se denunciados por tentativa de golpe de Estado se tornarão réus; defesas negam participação dos acusados nos crimes. Veja vídeo

Foto do author Rayanderson Guerra
Atualização:

RIO – A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para terça-feira, 25, a análise da denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra oito acusados de tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022, entre eles o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Além do ex-presidente, os ministros vão decidir se tornam réus o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), o almirante e ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos, o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, o general da reserva e ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional Augusto Heleno, o tenente-coronel e ex-ajudante de ordens da Presidência da República Mauro Cid, o general e ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira e o general da reserva e ex-ministro da Casa Civil Walter Braga Netto.

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A PGR denunciou os oito pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, envolvimento em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.

A lista de crimes citados na denúncia do procurador-geral, Paulo Gonet, prevê as seguintes punições:

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  • Organização criminosa: com pena de 3 a 8 anos que que pode ser aumentada para 17 anos com agravantes citados na denúncia;
  • Abolição violenta do Estado Democrático de Direito: pena de 4 a 8 anos;
  • Golpe de Estado: pena de 4 a 12 anos;
  • Dano qualificado com uso de violência e grave ameaça: pena de 6 meses a 3 anos;
  • Deterioração de patrimônio tombado: pena de 1 a 3 anos.

As defesas dos acusados negam a participação deles em uma tentativa de golpe de Estado.

Veja quem foi denunciado

Jair Bolsonaro

Segundo a PF, a investigação mostrou que o ex-presidente Jair Bolsonaro “planejou, atuou e teve o domínio de forma direta e efetiva dos atos executórios realizados pela organização criminosa que objetivava a concretização de um golpe de Estado e da abolição do Estado Democrático de Direito, fato que não se consumou em razão de circunstâncias alheias à sua vontade”.

Os investigadores sustentam que Bolsonaro tinha participação ativa nos planos de golpe de Estado.

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O ex-presidente da República Jair Bolsonaro  Foto: Wilton Junior/Estadão

Em nota, a defesa de Jair Bolsonaro rebateu a denúncia da PGR chamando-a de “inepta”, “precária” e “incoerente”. Os advogados do ex-presidente também alegam que a denúncia é baseada em um acordo de colaboração “fantasioso” do tenente-coronel Mauro Cid, seu ex-ajudante de ordens.

O posicionamento de Bolsonaro também afirma que, “a despeito dos quase dois anos de investigações, (...) nenhum elemento que conectasse minimamente o (ex-) presidente à narrativa construída na denúncia foi encontrado”.

Alexandre Ramagem

De acordo com a Polícia Federal, o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) atuou como um dos principais conselheiros do ex-presidente. Conversas e documentos obtidos pela Polícia Federal na investigação, a partir da quebra do sigilo de mensagem do deputado, mostram que, ao longo do governo, ele articulou ataques ao Supremo Tribunal Federal e incentivou Bolsonaro a enfrentar os ministros.

Deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

A defesa de Ramagem usou a eleição dele como argumento para rebater a denúncia. A defesa afirma que não faria sentido acreditar que “uma pessoa que acabara de ser eleita deputado federal, após tanto esforço e dispêndio de recursos materiais e pessoais em acirrada disputa eleitoral, fosse capaz de atentar contra os ‘poderes constitucionais’, visando abolir o Estado Democrático de Direito”. Os advogados também alegaram que, quando Bolsonaro radicalizou o discurso, Ramagem já havia deixado o governo.

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Ainda de acordo com os advogados, o ex-chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) apenas apresentou “opiniões que convergiam com o pensamento que, segundo a acusação, já era publicizado pelo então presidente”. “Trata-se de mera reiteração daquilo que, segundo a própria denúncia, o então Presidente da República já vinha afirmando publicamente.”

Anderson Torres

A PF encontrou na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres o rascunho de um decreto para anular o resultado das eleições e instaurar estado de defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral.

Anderson Torres afirmou que está sendo denunciado “apenas e tão somente pelo fato de ter integrado o governo do ex-presidente”. “Esse fato, contudo, não configura, por óbvio, qualquer ilícito penal. De igual forma, eventual espírito de corpo ou mesmo o desejo do denunciado de que o ex-presidente Bolsonaro permanecesse no poder não possui enquadramento penal.”

O ex-ministro da Justiça Anderson Torres  Foto: Wilton Junior/Estadão

A defesa negou que ele tenha escrito a minuta golpista apreendida na sua casa. O documento previa a anulação do resultado das eleições de 2022 e uma intervenção no Tribunal Superior Eleitoral. Os advogados disseram que o documento é apócrifo e “absolutamente inverossímil”.

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“A simples leitura do teor da minuta já indica o absurdo quanto ao local, quanto ao meio, quanto à forma, quanto ao objeto e quanto aos pressupostos constitucionais do Estado de Defesa. Absolutamente nada faz sentido!”, afirmou a defesa.

Augusto Heleno

O ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional Augusto Heleno fazia parte de um núcleo de militares que “agiram para influenciar e incitar apoio” ao plano golpista, segundo a PF.

Uma agenda apreendida na casa dele levantou suspeitas sobre o uso da Abin para a espionagem de petistas e a disseminação de notícias falsas sobre as urnas eletrônicas.

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O general da reserva Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI)  Foto: Wilton Junior/Estadão

A defesa afirma que a PGR usou “anotações as mais variadas, como se fossem um apanhado de ideias”, para “casar-se com a conclusão a que pretendia chegar”. “Um verdadeiro terraplanismo argumentativo.”

Os advogados argumentaram a incompetência absoluta do Supremo Tribunal Federal para apreciar o caso, afirmando que a “Justiça Federal é competente para processar e julgar a demanda” e pediu a suspeição do ministro relator, Alexandre de Moraes, alegando que se aponta na denúncia um suposto plano de homicídio contra ele, o que compromete a imparcialidade do julgador.

Mauro Cid

Segundo a PF, além de participar da redação da minuta golpista, o tenente-coronel Mauro Cid entrou em contato com outros militares para debater sobre o documento.

Ainda de acordo com a PF, Mauro Cid teria participado do plano dos “kids pretos” para executar Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Geraldo Alckmin (PSB), então presidente e vice eleitos. Uma reunião do grupo teria acontecido na casa do general Walter Braga Netto, ex-ministro de Jair Bolsonaro e candidato a vice na chapa do PL na eleição presidencial de 2022.

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Tenente-coronel Mauro Cid Foto: Reprodução

O encontro para planejar as execuções foi confirmado pelo tenente-coronel em delação. O planejamento para executar a chapa eleita em 2022, que também mirava Moraes, foi identificado a partir de mensagens apagadas do celular de Mauro Cid. Os arquivos foram recuperados pela investigação e motivaram a Operação Contragolpe, que apura os responsáveis por um plano conhecido como “Punhal Verde e Amarelo”.

Segundo a denúncia da PGR, Mauro Cid, “embora com menor autonomia decisória, também fazia parte desse núcleo, atuando como porta-voz de Jair Messias Bolsonaro, e transmitindo orientações aos demais membros do grupo”.

A defesa do tenente-coronel alegou ao Supremo que o militar apenas cumpria seu “dever legal” e não tinha poder de decisão nos fatos denunciados pela PGR. Na manifestação, os advogados pedem que a denúncia contra Cid seja rejeitada e, caso isso não aconteça, ele seja absolvido dos crimes de organização criminosa e tentativa de golpe de Estado.

“Quem integra uma organização criminosa, integra, decerto, por vontade própria, jamais por representação de alguém”, argumentou a defesa.

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Os advogados disseram que a PGR estava ciente de que Mauro Cid apenas desempenhava sua função na ajudância de ordens da Presidência da República, “cumprindo, portanto, seu dever legal”.

Almir Garnier Santos

Almirante-de-esquadra da Marinha, foi o comandante da Marinha no governo de Jair Bolsonaro, e, segundo a PF, concordou com o golpe de Estado, “colocando as tropas à disposição do então Presidente da República”.

O almirante Garnier Santos, comandante da Marinha sob Bolsonaro Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

“Os comandantes do Exército e da Aeronáutica se posicionaram contrários a aderir a qualquer plano que impedisse a posse do governo legitimamente eleito. Já o comandante da Marinha, Almirante Garnier, colocou-se à disposição para cumprimento das ordens”, diz o relatório.

Em manifestação apresentada ao STF, a defesa de Garnier diz que as provas apresentadas pela PGR na denúncia derivam de “relatos indiretos, mensagens de terceiros e outros fragmentos”. Os advogados do ex-comandante da Marinha negam as acusações e afirmam que o militar é inocente

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“A Procuradoria-Geral da República não apresentou provas mínimas de sua participação ativa ou direta nos supostos atos de violência ou na execução de quaisquer medidas contrárias à ordem constitucional”, dizem.

Segundo a defesa de Garnier, a denúncia diz que o militar se colocou à disposição de Bolsonaro para a trama em reunião de 7 de dezembro, no entanto, “a necessidade de ajustes no texto do decreto e a invocação de uma nova reunião no dia 14 de dezembro revelam que o ato atribuído ao Defendente não teve relevância dentro do quadro histórico traçado na denúncia”.

“Além disso, evidencia a sua não adesão ao grupo o fato de que, embora tido como peça fundamental, o seu nome não estava previsto na minuta que instituiria o Gabinete de Crise institucional, fato que contrasta a denúncia, haja vista a presença do nome dos principais acusados no referido documento”, afirmam.

Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira

Segundo a PF, o ministro da Defesa de Jair Bolsonaro, pressionou comandantes das Forças Armadas a aderirem ao plano golpista e organizou reunião com oficiais de alta patente das três Forças em que o ex-presidente cobrou adesão ao golpe. Os comandantes do Exército e da Aeronáutica rechaçaram o plano.

Em dezembro, Paulo Sérgio Nogueira incumbiu o general Estevam Theóphilo das ações que ficariam a cargo da tropa terrestre caso Bolsonaro assinasse o decreto.

Jair Bolsonaro conversa com o então ministro da Defesa Paulo Sergio Nogueira  Foto: Eraldo Peres/AP

Em manifestação ao STF, a defesa de Nogueira negou ter atuado para efetivar um golpe de Estado. De acordo com os advogados, Paulo Sérgio Nogueira não integrou uma organização criminosa e não atuou para “dar golpe de Estado ou abolir violentamente o Estado democrático de Direito”.

“Afirmar que o general Paulo Sérgio integrava organização criminosa e atuou para dar um golpe de Estado e abolir violentamente o Estado Democrático de Direito é um absurdo e está manifestamente contra a prova dos autos”, disse a defesa.

Walter Braga Netto

O general da reserva Walter Braga Netto organizou em sua casa uma reunião com o núcleo de militares com formação em forças especiais do Exército, os chamados “FE”. No encontro, apresentaram o planejamento das ações para consumar o golpe, segundo as investigações.

Braga Netto e Augusto Heleno integrariam um gabinete de crise para gerir a crise posterior à ruptura institucional e o assassinato de Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes.

O general da reserva Walter Braga Netto e o ex-presidente Jair Bolsonaro Foto: Wilton Junior/Estadão

Ao STF, a defesa de Braga Netto disse que a denúncia é “ilógica e fantasiosa”. Os advogados de Braga Netto afirmaram ainda que a peça parece “um filme ruim e sem sentido”.

“Tal qual um filme ruim e sem sentido, a denúncia apresenta furos em seu roteiro que desafiam qualquer lógica plausível. De forma surrealista, sustenta absurdos como o plano de prisão de uma pessoa morta. Se não há compromisso com a lógica, certamente que não há nenhum comprometimento com a prova”, disse a defesa.

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